Escritos

Pesquisar
Pesquisa avançada – clique aqui para melhorar a pesquisa
N° Escrito
Destinatário
Sinal (*)
Remetente
Data
621
Faustina Stampais
0
El Obeid
4. 9.1875
N.o 621 (590) - A FAUSTINA STAMPAIS

ACR, A, 15/151 n.1



J. M. J.



El-Obeid, 4 de Setembro de 1875



Minha caríssima Faustina,



[3899]
Acedendo ao desejo expresso na última carta, consinto que vás com Filomena ao Cairo, para que, com essa companhia, que me parece boa, tenhas a provável garantia de que te corra bem. Gostaria que me esperasses, mas como insistes no desejo de partir, vai em nome de Deus. Porém, ordeno-te que te portes bem e que, como mulher ajuizada e prudente me escrevas de todas as estações onde parares, começando por Berber, e isto até ao fim da viagem. Todos os padres e irmãs, assim como as jovens, te retribuem as saudações. E tem lembranças minhas, bem como orações para



Teu af.mo P.e Daniel Comboni

Pró-vig. apostólico






622
Card. Alexandre Franchi
0
Delen
14. 9.1875
N.o 622 (592) - AO CARD. ALEXANDRE FRANCHI

AP SC Afr. C., v. ff, 451-452



J. M. J.



Delen (Gebel Nuba), 14 de Setembro de 1875



Em.o Príncipe,



[3900]
O acolhimento que me dispensou esta população Nuba foi extraordinário. O grande chefe mandou que o homem mais influente deste país me fosse buscar, e ele mesmo, em companhia de mais de cinquenta pessoas, acorreu a encontrar-se comigo na véspera numa extensa selva, onde passámos a tarde e a noite a céu aberto. Pela manhã acompanhou-nos a Delen e aí esteve em festa toda a população, com disparos de fuzis e claras amostras de sincera alegria. Se julgo pelo aspecto desta gente e pela primeira impressão que me causou, bem como pelo seu carácter e bom senso, devo conceber grandes esperanças de os ganhar para a fé com a graça do Sacratíssimo Coração de Jesus; porém, temos que vencer muitas superstições e induzi-los a vestir-se. Quanto ao mais, reservo a minha opinião até poder dar um juízo mais seguro, depois de os ter estudado no seu ambiente e depois de ter estudado outros montes. Noutra ordem de coisas, posso dizer que já está estabelecida a missão em Delen. Trouxe comigo duas irmãs, muito experimentadas e de segura moralidade, e encontrei arranjadas as casas para elas, que, tais como as nossas, foram preparadas pelo superior P.e Luís Bonomi, a quem mandei aqui há mais de meio ano e que, além de ter outras boas qualidades para presidir a esta população negra, tem também a de ser ele mesmo algo moreno.


[3901]
Aqui o ar é mais saudável ainda que no Cordofão. Este povo é, sem dúvida, o mais inteligente de todas as etnias e tribos que visitei em dezoito longos anos na África Central. Porém, o missionário vai precisar de muita virtude e abnegação para aguentar neste lugar, onde todos são pobres e não existem as coisas que um europeu requer; a maior parte do necessário é preciso trazê-lo de Cartum ou do Cairo. Espero, não obstante, que esta missão seja dentro de pouco a mais florescente do vicariato. Agora estou ocupadíssimo em aprender a língua nuba e compor um catecismo, para o que me serve muito a experiência que adquiri doutras línguas no Nilo Branco. Desejaria uma bênção do Santo Padre para esta nova missão.


[3902]
Na minha última carta assinalei a V. Em.a a minha ideia de ceder às Irmãs de S. José, sob certas condições, o Instituto das Pias Madres da Nigrícia, que fundei em Verona à custa de grandes despesas e com a aprovação de mons. Canossa; mas nunca chegarei a uma decisão determinante sem submeter antes o projecto à alta sabedoria e juízo de Vossa Em.a Rev.ma (examinado e concertado tudo previamente com o veneradíssimo bispo de Verona), tendo fortes razões e motivos tanto para o sim como para o não.

Beijo-lhe a sagrada púrpura e declaro-me nos Sagrados Corações de J. e de M. com todo o respeito e absoluta submissão e obediência



De V. Em.a Rev.ma

Hum., indig.mo, devot.mo filho

P.e Daniel Comboni

Pró-vigário apostólico da África Central






623
Card. Alexandre Franchi
0
Delen
8.10.1875
N.o 623 (593) - AO CARD. ALEXANDRE FRANCHI

AP SC Afr. C. v. 8, ff. 363-376



Relatório Anual à S. Congr. da Propaganda Fide

sobre o Vicariato da África Central

1 8 7 5



Delen (Gebel Nuba), 8 de Outubro de 1875

Em.o e Rev.mo Príncipe,



[3903]
Ainda que desde a época em que tive a honra de apresentar a V. Em.a a última relação oficial (1 de Julho de 1874) sobre o Vicariato da África Central até este dia não faltaram sérios e graves obstáculos suscitados pelo inimigo da eterna salvação das almas, que vê, nestas remotíssimas e tórridas regiões, ameaçado o seu reino pela força irresistível da cruz de Jesus Cristo, tenho a satisfação de poder mostrar a V. Em.o mediante a presente sucinta relação anual como o Senhor se dignou abençoar esta sua obra e estender e dilatar a sua influência nesta incomensurável parte da sua vinha, abandonada desde há tantos séculos. Os dulcíssimos Corações de Jesus e Maria, o glorioso patriarca S. José, os anjos e santos protectores do vicariato sustentaram-nos poderosamente na nossa fraqueza e assim, o nosso grito de guerra continua a ser o mesmo que no momento em que empreendemos a árdua e laboriosíssima empresa apostólica:

«Nigrícia ou morte».


[3904]
Além de este ano ter consolidado grandemente as duas Missões fundamentais e centrais de Cartum e do Cordofão, abrimos e erguemos canonicamente a casa da missão de Berber e instituímos a nova missão de Gebel Nuba. Além disso, parece que não tardaremos a proceder à reabertura da casa de Schellal, na Núbia Inferior, pois parece que esse lugar está destinado a tornar-se importante para os cristãos europeus e orientais, aos quais atrai a construção da via férrea do Sudão, da qual está pronto o troço de Assuão a Schellal e começado o grande trecho entre Wady-Halfa e Mothhamma (frente a Shendy) que deve prolongar-se até Cartum. Finalmente empreendeu-se a construção de dois importantes estabelecimentos no Cairo para aclimatar neles os missionários e as irmãs da Europa, sobre o terreno graciosamente doado à nossa missão por Sua Alteza o quedive do Egipto.


[3905]
Como se disse outras vezes, o Vicariato da África Central é maior que toda a Europa e, segundo a opinião do meu doutíssimo antecessor P.e Inácio Knoblecher, tem uma população de 90 000 000 (noventa milhões) de habitantes; porém, na minha humilde opinião, ampliando os cálculos ao conjunto das últimas estatísticas de Washington para 1874, conta com mais de 100 000 000 (cem milhões) de infiéis. Abrange vários impérios, reinos e inumeráveis tribos dentro do espaço assinalado por mim no mapa que apresentei à S. C. em 1872, na qual estão traçados todos os limites das missões apostólicas de África, com base nos documentos correspondentes à sua erecção que me foram mostrados.


[3906]
Quanto às notícias gerais do vicariato e às especiais das duas principais missões, a de Cartum e de El-Obeid, capital do Cordofão, não me parece necessário repetir aqui o que expus no meu último relatório do ano passado, com as excepções do novo e magnífico estabelecimento levantado em Cartum para as irmãs; do pequeno hospital aberto na nossa ampla casa para os europeus doentes, que este ano acolheu não poucos, que devolveu sãos de corpo e alma; e da ampliação do estabelecimento das Irmãs no Cordofão, que permitiu fazer verdadeiro bem pelas almas. Penso, por isso, ser suficiente limitar-me a falar-lhe algo sobre as missões abertas este ano, ou seja, a de Berber e a de Gebel Nuba, para a seguir dizer umas palavras sobre o futuro geral do Vicariato.



Missão de Berber




[3907]
A cidade de Berber tem pouco mais de 30 000 habitantes, todos muçulmanos, à excepção de uns poucos de coptas e gregos cismáticos, pouquíssimos católicos e grande número de escravos. Sede do Governo da extensa província do mesmo nome, está situada a 17o 45’ de lat. norte e dista aproximadamente doze dias de navegação pelo Nilo desde Cartum e mais de cinquenta dias de viagem do Cairo pela rota ordinária do Nilo. É importantíssima e muito cómoda para o Vicariato, porque lá vão parar, para descansar da comprida e cansativa viagem, as nossas caravanas que vêm do Cairo, quer pela rota do Nilo e do deserto de Korosko, quer pela do mar vermelho e do deserto de Suakin, Além do mais, o seu clima é geralmente saudável.


[3908]
A missão de Berber foi aberta por mim em 1874 e é constituída por uma formosa e ampla casa, com capela, jardim, locais para aulas, enfermaria e residência situada junto às margens do Nilo, numa localização amena e deleitosa. Segundo o acordo estipulado entre o rev.mo P.e geral dos Ministros dos Doentes e mim e aprovado pela S. C., foi confiada aos padres camilianos, que tomaram posse formal dela no dia 2 do passado mês de Março. Erigi canonicamente a casa da missão de Berber com decreto de 1 de Abril do corrente ano. A qualquer indicação do pró-vigário, os religiosos devem prestar-se, sob certas condições, a colaborar com os missionários do Instituto das Missões para a Nigrícia de Verona, em qualquer missão interior do Vicariato, sob a dependência do superior local da mesma. Além disso, os religiosos camilianos estão encarregados pelo pró-vigário apostólico de evangelizar e atender espiritualmente os cristãos da província de Berber, da de Taka, que se estende até aos confins da Abissínia, da de Suakin, no mar Vermelho e ad tempus, da do antigo reino de Dôngola.


[3909]
Os religiosos em Berber observam a clausura regular e levam uma vida em comum segundo as regras do seu Instituto. O pároco da nova missão camiliana é eleito pelo pró-vigário apostólico, depois de se ter posto de acordo para essa escolha com o rev.mo P.e geral da ordem. O pároco actual é o rev.do P.e João Baptista Carcereri, que tomou regularmente posse do cargo com os nossos decretos a 19 de Agosto de passado. É um religioso consciencioso, de íntegros costumes, versado nas ciências sagradas, e de 46 anos de idade. O superior ou prefeito da casa camiliana é o R. P.e Estanislau Carcereri, que durante dois anos foi meu vigário-geral e que, agora, pelo seu novo cargo, reside em Berber. Actualmente os religiosos (menos dois que estão comigo em Gebel Nuba) ocupam-se do estudo da língua árabe, razão pela qual ainda não começaram a visitar as províncias a eles confiadas. Segundo o mencionado acordo, a S. C. muniu-os da patente de missionários apostólicos e nenhum membro da sua ordem será admitido ao apostolado africano sem ter já feito os quatro votos da mesma.


[3910]
Cumprindo as obrigações que contraí pelo dito acordo, tenho completamente pago desde o último mês de Junho à casa camiliana de Berber a contribuição anual de 5000 francos, isto é, desde 1 de Março de 1875 até ao fim de Fevereiro de 1876, de que me foi passado o correspondente recibo.



Missão dos Nuba




[3911]
Logo que recebi em Outubro do ano passado as veneradas ordens dessa S. C. de instituir uma missão entre os povos Nuba, mandei partir uma caravana, que desde havia tempo tinha preparada, provida do necessário para preparar duas casas destinadas ao estabelecimento dos missionários e das irmãs no país de Delen, que é a primeira etapa e o primeiro monte dos Nuba. Depois, em Fevereiro, nomeei superior da missão o rev.mo P.e Luís Bonomi, do meu instituto de Verona, que junto com outros companheiros chegou a Gebel Nuba em Março. Trabalhando com grande zelo e actividade e vencendo não poucos obstáculos, construiu ao pé do monte de Delen, junto à residência do chefe, um grupo de sólidas cabanas, segundo o uso da região, rodeado de uma zariba ou sebe de árvores e paus que encerra: 1.o, no centro uma capela, com uma esplanada à frente; 2.o, a um lado, locais para dormitórios, sala de estudo, refeitório e oficinas de artes e ofícios, destinados aos missionários, irmãos artesãos e criados; 3.o, no lado oposto, locais para as irmãs e para as negras, com cozinha e lavandaria.


[3912]
Estas instalações são suficientes por uns anos, até que o país se estude bem, se aprenda a língua e se determine o lugar definitivo e central de dois amplos estabelecimentos mais sólidos, feitos de madeira dura ou de ladrilhos cozidos ou de pedra, a partir dos quais se domine toda a extensa planura rodeada de mais de vinte colinas, que forma um ameno e esplêndido semicírculo.


[3913]
Esta primeira parte da tribo dos Nuba, que tem uns 40 000 habitantes, abrange pouco mais de um grau de latitude e dois de longitude, encontra-se precisamente entre os graus 11 e 12 de lat. norte, e entre os graus de 26 e 28 de long. este do meridiano de Paris, e é habitada por infiéis que detestam o Islamismo e parecem saudar com alegria o estabelecimento da missão católica, sobretudo pelo favor que lhe dispensa o cojur Kakum, chefe de Delen, o qual exerce uma grande influência sobre este povo; esta primeira porção dos Nuba será absolutamente o ponto de apoio e de partida, o centro de comunicação e a primeira etapa da nossa acção apostólica entre os idólatras do centro do Vicariato.


[3914]
De Delen vai-se num único dia até ao ponto mais remoto do referido semicírculo; e os lugares mais habitados, como Nhuma, Golfan, Sobein e Carco, distam de três a oito horas de caminho. Assegurado bem este ponto de apoio, onde o clima parece bastante saudável, e cujo terreno cultivado a tempo e só com as chuvas ordinárias, pode dar a todo o pessoal o sustento necessário, a Missão, lançando firmes raízes em todos os lugares mais importantes destes montes, estará, sem dúvida, em condições de penetrar pouco a pouco nas outras partes da tribo dos Nuba e, a partir dela, nas outras tribos feiticistas do centro deste vicariato.


[3915]
Pelo que é minha opinião que este ponto de apoio, esta primeira parte do território Nuba, rodeada de montes e povoada por uns 40 000 infiéis que detestam o Islamismo – incapaz de lhes fazer abraçar o Alcorão, apesar das suas repetidas tentativas –, e que se nos mostram favoráveis, ainda que seja por interesse material e por esperarem protecção contra as incursões dos nómadas muçulmanos Bagara; esta parte dos Nuba, que habita em terreno muito fértil, melhorável mediante a mão experiente do agricultor, deve converter-se no primeiro campo das nossas fadigas apostólicas entre os idólatras e convém, portanto, que se estabeleça aqui a Missão de Gebel Nuba.


[3916]
Por esta ser uma obra de Deus, deverá encontrar as suas dificuldades e, certamente, no princípio teremos conflitos, especialmente por parte do fanatismo muçulmano, que não deixará de recorrer às sua insídias, armadilhas e às suas tretas diplomáticas, mesmo mediante as formas mais corteses através de alguns do Cordofão, os quais não vêem com bons olhos que a missão católica se estabeleça em Gebel Nuba antes do Governo egípcio, e também por meio dos Bagara. Mas a Igreja Católica está acostumada a estas provas e a graça de Deus far-nos-á suportar a pé firme todas as dificuldades. Trata-se só de adversidades momentâneas, das quais triunfaremos com o Senhor e com a prudência necessária. A Missão de Gebel Nuba florescerá enormemente sob a égide do Sagrado Coração de Jesus, uma vez percorrido esse carreiro de espinhos por onde devem passar as obras de Deus.


[3917]
Prescindindo da vantagem da sua proximidade da Missão de El-Obeid, da qual se encontra só a quatro ou cinco jornadas, o argumento mais relevante em favor do estabelecimento desta missão é a índole, o carácter, as qualidades dos indígenas, que são de muito melhores condições que os habitantes das antigas missões de St.a Cruz e Gondokoro, no Nilo Branco, e que todos os das outras tribos que conheci na África Central.


[3918]
Em primeiro lugar, estas gentes não são nómadas, tendo, sim, residência fixa nestes montes; e, embora sejam pouco trabalhadores, contentando-se só em cultivar o pedaço de terreno que lhes dá a comida exacta para todo o ano e não se ocupem de mais nada, trabalham ao fim e ao cabo, enquanto as outras tribos que eu conheço não fazem nem isso. Em segundo lugar, trata-se de pessoas muito sensatas, que mostram critério e reflexão e muita sagacidade. Numa palavra, têm cabeça, vêem as coisas como são e não se deixam enganar tão facilmente pelos seus inimigos. Além disso, entre os habitantes de cada monte, existe uma solidariedade admirável: todos se dão as mãos para afastar os perigos comuns e também para se ajudarem reciprocamente nas doenças e na pobreza. Quase nunca se levantam contendas entre eles e pode-se dizer que reina uma vida patriarcal.


[3919]
Finalmente, aqui há melhores costumes; e, ainda que as solteiras e todas as mulheres, em geral, andem nuas, e seja raríssimo alguma que tenha um trapo para se cobrir, mesmo dos nossos missionários, que desde há meses se encontram aqui para com a máxima atenção estudarem o país, nunca se ouviu falar acerca do menor inconveniente surgido sobre a moralidade, o que é raro até na Europa. Também as nossas duas Irmãs de S. José se admiraram disso. É de assinalar, além disso, a submissão e obediência que professam ao cojur Kakum, chefe absoluto temporal e espiritual dos seus destinos. Os habitantes de Delen parecem uma só e pacífica família, coisa admirável que a todos surpreendeu. O mandato de Kakum não é hereditário e este chefe não tem organização policial, nem sequer guardas, nem tribunais penais; tão-pouco dispõe de força, nem de nenhum código ou lei, nem de castigos. Contudo, a todos governa pacificamente, mantém com todos a ordem e todos recorrem a ele e ficam tranquilos depois da sua sentença e juízo. E não empreende nada, ainda que seja de pouca importância, sem reunir o conselho do anciãos, os quais tratam e discutem com tanta maturidade de juízo cada um dos seus pequenos assuntos que se fica estupefacto.


[3920]
Talvez dentro de uns anos, se Deus quiser, não seja improvável que ao evangelizar se aplique aqui o acertado sistema das famosas Reduções do Paraguai, ideado pela insigne piedade e sabedoria dos reverendos padres jesuítas, os quais criaram entre aqueles americanos a mais florescente e mais bem dirigida missão do mundo, que com inaudita barbárie e perfídia foi destruída pela ímpia política do seguidor de Bismark, o ministro português Pombal, ou melhor, pela seita maçónica do século passado.


[3921]
Estas são as principais razões (depois da principal, ou seja, a venerada decisão da S. C., que me ordenou a fundação em Gebel Nuba), pelas quais me parece prudentemente oportuno instituir aqui a primeira missão entre os Nuba.


[3922]
E não me desanimam os seguintes obstáculos:

1.o A quase absoluta nudez destes habitantes, especialmente das mulheres de qualquer idade. De aproximadamente cem homens, apenas um ou dois terão um trapo. Porém, entre as mulheres, apenas há uma ou duas entre trezentas que tenha as partes pudendas cobertas. Daqui a imensa utilidade das irmãs. E daqui a necessidade também de introduzir o cultivo do algodão, que pode crescer vigorosamente nestas terras.


[3923]
2.o As curiosíssimas superstições de todo o género e a fé no Ucuru, o espírito que, em certos momentos determinados se apodera dos cojur (coisa vista com os meus olhos) e que, realmente, adivinha algumas coisas futuras, como a chuva, etc., embora muitas outras não as adivinhe, pelo que os mesmos cojur podem dizer em ocasiões, como o nosso nos disse aos missionários e a mim: «O espírito mentiu, desta vez enganou-nos.»

3.o A maneira de ser destas gentes é não nos fazerem nada sem recompensa. Além disso, não cumprem sempre as suas promessas, embora tenham a consciência de se envergonharem quando alguém lho atira à cara.


[3924]
4.o As frequentes ameaças dos árabes Bagara Homur e de outros nómadas muçulmanos e às vezes dos habitantes de alguns destes montes, que levam gente de ambos os sexos e de noite atacam as sementeiras. Mas a nossa missão inspira sem dúvida muito medo a estes inimigos, ao pensarem que conta com o apoio não só do Governo do Cordofão mas também com forças próprias e que dispomos de fuzis e munições. Portanto, penso que, também por este lado, a missão beneficiará os Nuba. De facto, desde que foi estabelecida a missão em Delen, os Bagara não tocaram nem num menino, nem numa sementeira, salvo um único caso em que num campo afastado feriram um agricultor que nós tratámos.


[3925]
Apesar de todos estes obstáculos, tenho firme confiança de que a missão lançará sólidas raízes, tanto mais que estamos certos de que os Nuba vão mandar à escola os seus filhos e filhas, como fizeram até agora o grande chefe e muitos outros.


[3926]
Mas para abrir escolas regulares é necessário que os missionários e as irmãs conheçam a língua nuba e este é o trabalho mais importante ao qual agora todos estamos dedicados. Já aprendemos um bom número de vocábulos, sobretudo com a colaboração do chefe, que sabe bastante do árabe dos jilabas e é muito inteligente.


[3927]
Assim, pois, o que a missão tem que fazer nestes momentos é: aprender bem a língua nuba para abrir regularmente as escolas e pregar o catecismo e o Evangelho; arranjar as coisas para que, pouco a pouco, os indígenas, especialmente as mulheres, possam vestir algo; conservar a população fiel e favorável com o bom exemplo dos missionários e das irmãs, e com a prática da caridade; preparar todos os elementos materiais e formais oportunos para o exercício do santo ministério apostólico entre estes infiéis. Espero que o Senhor seja generoso para connosco nas suas divinas ajudas, que certamente nunca nos faltarão.


[3928]
Aqui devia dizer duas palavras sobre a história dos Nuba, que interessa verdadeiramente à religião. Mas deixo-o para outra oportunidade. Só assinalarei que este povo, que era muito numeroso, acabou por ser dizimado pelas incursões de agentes mandados pelos governadores egípcios do Cordofão, sobretudo desde a época da conquista do Sudão que levaram a cabo as tropas de Mehmet Ali em 1822, sob a direcção do cruel Defterdar e do paxá Ismail, filho do vice-rei, que morreu em Shendi. Estes massacraram grande parte deles e outros, também muito numerosos, foram levados como escravos para o Cordofão e para o Egipto. Foram dizimados também de 1834 a 1844 pelos governadores do Cordofão Rustan Bey, Muhammad Bey, Mustafá Bey e o paxá Musa. E dizimados foram igualmente pelas incursões contínuas dos jilabas ou traficantes de escravos, que todos os anos, até 1870, levavam para a escravidão milhares e milhares para o Cordofão, Núbia e Egipto. Apercebi-me de que esta é a principal razão pela qual os Nuba detestam o Islamismo, de modo que, por muitos ulemas, muftis e faquis que lhes tenham sido enviados (como é contínua prática do Governo egípcio no Sudão) para abraçarem a religião do falso profeta, sempre a rejeitaram com desprezo, preferindo sofrer não poucos a própria morte.


[3929]
Os Nuba pretendem ser cristãos descendentes dos cristãos da Núbia (que se estende desde o Trópico até Cartum, e desde o Oeste do reino de Dôngola até ao mar Vermelho e aos confins da Abissínia). Daí a origem do nome Nuba que se dão a si mesmos e ao seu país. Porém, por terem estado privados de sacerdotes e do ministério sacerdotal durante tantos séculos e de se terem misturado ao longo de mais de quatro séculos com os indígenas feiticistas negros, cheios de superstições, perderam toda a ideia cristã e agora só conservam uma sombra longínqua do Cristianismo, crendo sempre num espírito que os governa e que se chama Ucuru e num Deus criador, omnisciente e Senhor de tudo, chamado por eles Belewto.


[3930]
Essa opinião de que descendem dos antigos cristãos da Núbia corrompidos pelos erros de Dióscoro Alexandrino, que até 1300 conservaram ainda alguns bispados, como o de Dôngola Velha, o de Meroe, o de Soba, etc., etc., não me parece infundada, pois tenho a respeito dela sólidas provas históricas e linguísticas desde 1873, quando concebi a ideia de mandar a Gebel Nuba os primeiros exploradores guiados pelo P.e Carcereri, como demonstrarei e exporei em pormenor numa pequena obra que pensei escrever pouco a pouco sobre a história do Cristianismo na Núbia e países adjacentes e que enviarei a V. Eminência.


[3931]
Os católicos do Vicariato são actualmente cerca de quinhentos, a maior parte indígenas, com bastantes orientais de todos os ritos, e vários europeus. O maior número deles encontra-se em Cartum e no Cordofão. Os adultos baptizados deste ano chegam a 56. Devo fazer notar a V. Em.a que o nosso principal empenho nestes primeiros tempos é preparar os materiais e os estabelecimentos necessários para consolidar bem a missão. Mediante expresso decreto, adoptei desde 1873 como texto em todo o Vicariato, até nova ordem, o catecismo árabe de mons. Valerga, patriarca falecido de Jerusalém, texto que me parece o melhor de quantos examinei.


[3932]
Os proventos do Vicariato desde o dia 1 de Junho de 1874 até hoje, procedentes das sociedades benfeitoras europeias, dos meus benfeitores privados e dos bens imóveis ascenderam à soma de 109 473 francos líquidos, com os quais se fizeram várias expedições custosíssimas e mantiveram-se todos os estabelecimentos do Vicariato e os pequenos institutos do Cairo. Apesar das graves perdas que sofreu a expedição dirigida pelo P.e Carcereri, o Vicariato não tem nenhum débito, nem na Europa, nem no Egipto, nem no Sudão, à excepção de 986 francos devidos ao meu procurador do Cordofão.



PESSOAL DO CLERO

Sacerdotes missionários europeus

membros do Insto. das Missões para a Nigrícia de Verona



Missão principal de Cartum




[3933]
1.o P.e Daniel Comboni, Pró-vigário apostólico, nascido em Limone (diocese de Bréscia) a 15 de Março de 1831 e vindo para a África Central em 1857.

2.o P.e Pascoal Fiore, ex-cónego de Corato (diocese de Trani), superior e pároco de Cartum e, em minha ausência, meu representante. De 35 anos e na missão de 1870.

3.o P.e Salvador Mauro, da diocese de Trani, de 40 anos e na missão desde 1872.

4.o P.e Paulo Rossi, de Verona, de 26 anos, chanceler e meu secretário. Na missão desde 1874. Há, além disso, um excelente jovem maronita de 24 anos, que me serve de escrivão para as cartas em árabe.




[3934]
Missão do Cordofão



5.o P.e João Losi, da diocese de Placência, de 37 anos, superior e pároco de El-Obeid. Na missão desde 1872.

6.o P.e Estêvão Vanni, da diocese de Trani, de 39 anos. Na missão desde 1872.



Há aqui três extraordinários clérigos estudantes de teologia, a saber:

1. Aníbal Perbellini, do 3.o ano de teologia e na missão desde o ano de

1873.

2. Carmelo Loreto e

3. Vicente Marzano, ambos do 1.o ano




[3935]
Missão de Gebel Nuba



7.o P.e Luís Bonomi, da diocese de Verona, de 34 anos, superior.

8.o P.e Gennaro Martini, de Turim, de 32 anos, vigário paroquial. Ambos estão na missão desde 1874

Há, além disso, outros dois sacerdotes ambos camilianos.



Missão de Berber

Sacerdotes Regulares Ministros dos Doentes

chamados camilianos



9.o P.e Estanislau Carcereri, de Verona, superior, de 35 anos. Na missão desde 1867.

10.o P.e José Franceschini, de 29 anos, de Treviso. Na missão desde 1867, agora em Gebel Nuba.

11.o P.e João Baptista Carcereri, veronês, pároco, de 46 anos. Na missão desde 1874.

12.o P.e Afonso Chiarelli, de Ceneda, de 33 anos. Na missão de 1874.

13.o P.e Camilo Bresciani, de Verona, de 25 anos, na missão desde 1874. Também está o ir. José Bergamaschi, de 40 anos, que tomou o hábito no Cairo por obra do P.e Carcereri.



Estabelecimento do Cairo

Membros do Insto. das Missões para a Nigrícia de Verona



14.o P.e Bartolomeu Rolleri, da diocese de Placência, superior dos institutos de negros do Egipto, de 35 anos. Na missão desde 1869.

15.o P.e Domingos Noia, da diocese de Trani, de 37 anos. Na missão de 1874.


[3936]
Além disso, em cada estação, há vários irmãos coadjutores, leigos valiosos, versados em diversas artes e ofícios. Dentre eles destaca-se o valiosíssimo veterano da missão Augusto Wisnewsky, de 55 anos, da diocese prussiana de Ermland, vindo em 1856 para o vicariato, de onde não voltou a sair; domina muitas artes e línguas e serve como um missionário.
Há também várias mestras negras educadas no Insto. P.e Mazza, de Verona, que são de grande ajuda na catequização e nos lavores femininos.


[3937]
Finalmente, as Irmãs de S. José da Aparição prestam assistência ao Vicariato, favorecendo-o com a poderosa acção da mulher católica. Conseguiram obter uma madre provincial ou superiora principal do Sudão, residente em Cartum, que tem jurisdição sobre todas as irmãs do Vicariato; trata-se de Sóror Emilienne Naubonnet, que foi trinta anos superiora no Oriente. Com as Irmãs de S. José estipulei um acordo, aprovado pela S. C., que até agora pela minha parte foi cumprido e observado fielmente. Porém, são poucas as Irmãs, em comparação com as necessidades do vicariato, porque:



Há em Cartum 4 irmãs

“ no Cairo 2 “

“ no Cordofão 3 “

“ em Gebel Nuba provisoriamente 2 “




[3938]
As duas últimas trouxe-as para aqui para que preparem bem a casa para um instituto formal feminino, com a intenção de voltar a levá-las comigo ao regressar do Cordofão, porque não é prudente deixar as irmãs sós numa região tão remota. Depois, quando chegarem as novas irmãs prometidas, então instalar-se-ão formalmente também em Gebel Nuba.


[3939]
No Vicariato mantenho muito boas relações com todas as autoridades governativas turcas, que nos prestaram serviços e apoio em todas as circunstâncias. Bem entendido que os turcos e os egípcios e estes paxás não o fazem por simpatia, mas por política, pois se pudessem comiam vivos todos os cristãos. Mas se a eles os move a política, com política actuamos nós também, se bem que com esta diferença: a sua política é a de Bismark, a de Goreschakof, a de Palmeston e a de Napoleão III, e nós respondemos com a política verdadeiramente cristã do Papa, do Cardeal Antonelli e dos núncios apostólicos.


[3940]
A Missão, por outro lado, goza de grande crédito tanto entre os infiéis como entre os católicos e cristãos em geral.

As novas conquistas egípcias do império de Darfur e do equador, nas nascentes do Nilo, podem contribuir para que nos estendamos até àquelas regiões quando contarmos com mais forças, já que estou em óptimas relações com os chefes supremos dessas árduas expedições e com as máximas autoridades aí constituídas, tanto muçulmanas como anglicanas.


[3941]
Isto é quanto lhe posso dizer sobre o estado geral deste imenso Vicariato. Se V. Em.a lançar um olhar retrospectivo ao estado tão miserável em que se encontrava esta missão há três anos, quando a S. Sé teve por bem confiá-la ao meu Insto. de Verona e o comparar com a situação em que se encontra hoje, terá de se convencer que o Senhor derramou nela as suas bênçãos e que os dulcíssimos Corações de Jesus, de Maria, e S. José nos ajudaram na nossa fraqueza. Deus quer salvar a infeliz Nigrícia.


[3942]
Agora temos maiores trabalhos, pericula, hoerumnae e inumeráveis cruzes. Porém... non pervenitur ad victoriam nisi per magnos labores. Cristo ressuscitou depois de ter sofrido a morte da cruz: que Ele nos ajude a morrer por seu amor e pela salvação da desventurada Nigrícia, pela qual também morreu na cruz.


[3943]
Rogando-lhe humildemente que nos obtenha a benção do Santo Padre, que, com a eloquência do seu exemplo nos ensina a padecer pela Igreja e pelas almas, beijo-lhe a sagrada púrpura e declaro-me nos Sagrados Corações de J. e M.

De V. Em.a

Hum., obed.mo e indig.mo filho

P.e Daniel Comboni

Pró-vig. apost. da África Central






624
Card. Alexandre Franchi
0
Delen
10.10.1875
N.o 624 (594) - AO CARD. ALEXANDRE FRANCHI

AP SC Afr. C., v. 8, ff. 377-379

J. M. J

Delen (Gebel Nuba), 10 de Outubro de 1875



Em.o e Rev.mo Príncipe,



[3944]
Tenho a honra de lhe enviar o relatório junto sobre o Vicariato da África Central. Calculando a boa quantidade de provisões que mandei neste primeiro ano para Gebel Nuba e não tendo visto o que produzem os indígenas deste país, pareceu-me que para sustentar a Missão dos Nuba era necessário trazer de El-Obeid ou de Cartum quase tudo o que consumissem os missionários. Isto é um erro que manifestei daqui a V. Em.a na minha última carta, a n.o 9; erro de que me retracto com agrado por amor da verdade. Agora que vi tudo com os meus próprios olhos observando em pormenor, estou persuadido de que nesta terra nuba podemos conseguir com o nosso trabalho e habilidade quase tudo o necessário, excepto a roupa e uma ou outra coisa europeia para manter por completo a missão. Aqui há muito do necessário para a vida, pelo que esta missão pode custar proporcionalmente menos que as outras. Bendito seja o Senhor.


[3945]
Agora peço-lhe uma graça e suplico a V. Em.a que ma conceda se tal for a vontade de Deus. Eu rogaria à sua bondade que se dignasse conceder-me licença para ir ao Cairo e à Europa pelos seguintes prementes motivos que dizem respeito ao bem do Vicariato da África Central:

1.o Como escrevi a V. Em.a noutra ocasião, S. S. o quedive do Egipto concedeu-nos (como aos outros) o terreno para construir dois estabelecimentos no Cairo, para neles se aclimatarem os missionários e as Irmãs do Vicariato; porém, doou-no-lo com a condição (como aos franciscanos) de que em dezoito meses desde a concessão se gastem na construção 50 000 francos. Porém, até este momento só gastámos 16 000 francos e o prazo de 18 meses cumpre-se no próximo Março de 1876. Pois bem, trata-se de obter do vice-rei ou da administração uma prorrogação; conseguir isso seria fácil para mim que estou tão relacionado com personalidades do Egipto e, em contrapartida, seria muito dificultoso para o meu representante P.e Bartolomeu Rolleri, superior dos meus Institutos do Cairo, que não tem os recursos nem os meios que eu possuo.


[3946]
2.o Em Verona, como lhe escrevi, tenho um Instituto de Irmãs que mons. Canossa e eu fundámos para a Nigrícia e há nele desde há tempos muitas que já estão maduras para a África Central. Porém, não me posso decidir a ceder o insto. veronês às Irmãs de S. José ou a trazer para aqui, independente destas, as minhas irmãs de Verona, sem antes tratar a fundo a questão com o bispo de Verona e submeter por último a decisão a V. Em.a Por outro lado, mons. Canossa não pode resolver este assunto sem mim, como tão-pouco eu sem ele. Como se trata de algo de grande transcendência para o Vicariato, vou estar não pouco inquieto até o resolver.


[3947]
3.o Preciso de ir a Viena para fortalecer o Comité da Sociedade de Maria, que se ressentiu da morte do barão de Spens, que era a alma dessa obra. O comité de Viena é da máxima importância para o Vicariato, não tanto pelo dinheiro que dá como porque a sua existência mantém vivo e activo o protectorado sobre o império da África Central, inclusive perante o maçónico Ministério dos Negócios Estrangeiros.


[3948]
4.o Tenho um grande número de assuntos a expor, de conselhos a tomar e de coisas a tratar com V. Em.a e com a S. C.; preciso de conversar com V. Em.a acerca de muitos pontos para poder dirigir bem a minha grande obra, o que dificilmente se pode fazer por escrito. Aqui não tenho os meios para me aconselhar de que se dispõe noutras partes do mundo: o lugar mais perto para tomar um conselho seria o Egipto e está a quatro meses de viagem. Aqui só tenho os meus companheiros. Nós somos os teólogos e tudo.


[3949]
Portanto, sentir-me-ia contente se me concedesse a graça solicitada, que diz respeito ao puro bem do Vicariato. Além disso, servir-me-ia, ao mesmo tempo, para tomar um pouco de descanso para revigorar a minha saúde, porque três anos de África Central fatigam mais que doze de Índias.


[3950]
Entretanto, reservando-me eu sempre os assuntos mais graves, deixaria em Cartum como representante meu no Vicariato o estupendo cónego P.e Pascoal Fiore, homem prudente, sagaz e capaz de me representar segundo o meu desejo.

Submeto-lhe humildemente esta súplica, disposto, não obstante, a fazer sempre a venerada intenção de V. Em.a, que é o intérprete da vontade divina. Entretanto, beijo-lhe a sagrada púrpura e declaro-me com suma veneração



De V. Em.a Rev.ma

Hum., devot.mo e indig.mo filho

P.e Daniel Comboni, pró-vig. ap.






625
Relat. Com. Marienverein
0
Delen
15.10.1875
N.o 625 (595) - RELATÓRIO AO COMITÉ DA MARIENVEREIN

ACR, A, c. 12/13



Delen, 15 de Outubro de 1875



[3951]
Quando a Santa Sé se dignou confiar-me a mim e ao meu Instituto por mim fundado em Verona a direcção do Vicariato Apostólico, a missão católica existia apenas em Cartum, onde dois padres da ordem franciscana e dois leigos se ocupavam dos católicos. Desde o ano de 1872, ou seja, em só três anos desde a consagração de todo o Vicariato ao S. Coração de Jesus, não só se consolidou a Missão em Cartum e se ampliou com um magnífico estabelecimento de irmãs para a instrução feminina e para a atenção aos enfermos, mas Deus quis também estendê-la até Berber, ao Cordofão e às remotas tribos dos negros Nuba. E, embora tenham surgido vários obstáculos enormes, Deus abençoou as fadigas dos missionários apostólicos, cujo grito de guerra é «Nigrícia ou morte»: ou converter a Nigrícia ou morrer.



1. CARTUM




[3952]
O meu primeiro pensamento depois de ser nomeado pró-vigário apostólico por graça de Pio IX foi consolidar as estações principais do Vicariato: Cartum e El-Obeid, no Cordofão.

Cartum é a sede das supremas autoridades egípcias e do cônsul austro-húngaro, o centro natural de todo o tráfego do Sudão, a base de operações e o centro de onde, através do Nilo Branco, se pode levar o Evangelho até ao equador e mais além, como as regiões orientais.


[3953]
Não vou falar da estação missionária de Cartum, nem do estado florescente em que se encontra em todos os aspectos, porque o ano passado apresentei um relatório sobre isso ao comité. Quero só assinalar que a construção do vasto estabelecimento feminino chegou a tal ponto que será terminada com um ulterior desembolso de quatro mil a cinco mil francos, o que está em digna correspondência com a construção do meu predecessor de feliz memória, o dr. Inácio Knoblecher. O quintal ou jardim contíguo não só fornece fruta e hortaliça necessárias aos membros da missão mas até produz um rendimento anual de mil francos com a venda de tâmaras, romãs, limões, bananas, etc. A missão deve a casa e o quintal às generosas ajudas da Sociedade de Maria, de Viena, e à munificência dos fervorosos católicos do Império Austro-Húngaro.



2. O CORDOFÃO




[3954]
Também quero dizer só duas palavras sobre a estação missionária de El-Obeid (capital do Cordofão), dado que já se deram notícias mais extensas na última relação anual.

Até agora, a do Cordofão é a estação mais fecunda do Vicariato, porque, embora tenhamos que nos ter dedicado primeiramente às construções e a outros trabalhos preparatórios, não ficou atrás a promoção espiritual: este ano foram admitidos no seio da Igreja Católica 50 adultos e num só dia (a 21 de Julho de 1875) baptizei e confirmei 17 adultos.


[3955]
Também em El-Obeid existem dois institutos, os quais, separados apenas pela rua principal (Derb el Sultanie), acolhem um os missionários e o outro as Irmãs de S. José. Estes institutos, como também a igreja, estão construídos segundo os costumes do país, com terra batida. Se mais à frente encontrar os meios necessários, refarei a igreja e os dormitórios com ladrilhos cozidos.


[3956]
El-Obeid, com mais de 100 000 habitantes, é uma cidade muito adequada para uma estação missionária, em parte devido ao clima saudável e em parte porque constitui uma etapa favorável para levar também a fé ao vizinho Darfur. Este reino, que as tropas egípcias conquistaram muito recentemente, foi dividido pelo governador-geral do Sudão, o paxá Ismail Ayub, em quatro províncias ou mudiriés. O clima aqui é suave e muito melhor que em Cartum.



3. BERBER




[3957]
A cidade de Berber tem cerca de 30 000 habitantes, na sua maioria muçulmanos; há entre eles também um pequeno número de coptas e gregos cismáticos, apenas alguns católicos e grande número de escravos negros. É capital da extensa província do mesmo nome, situada a umas dez jornadas a norte de Cartum e, por isso, constitui um desejado lugar de descanso para os membros da Missão quando chegam a Berber, após uma fadigosa viagem de cinquenta dias começada no Cairo Velho.

Já tinha sido intenção do benemérito pró-vigário dr. Knoblecher erigir em Berber uma estação missionária e é para mim uma satisfação ter levado a cabo esse santo e acertado projecto. A forma como se realizou encontra-se na relação anual de 1874, página 5.



4. GEBEL NUBA




[3958]
Já há muito tempo, principalmente em Cartum, recebi a informação de que no Sudoeste do Cordofão existia uma tribo negra que, quanto à inteligência e sagacidade, superava as do Nilo Branco. Eu já me tinha interessado por este povo, que se chama «Nuba», no tempo da minha formação no instituto do famoso P.e Nicolau Mazza, em Verona, nos anos de 1849 e 1850, quando tive a ocasião de conhecer bem o excelente negro nuba Bajit Caenda.


[3959]
Pertencente à família do célebre e doutíssimo orientalista conde Miniscalchi, de Verona, esse negro era o modelo perfeito do verdadeiro católico. Falava-me amiúde da sua pátria, Gebel Nuba, e contava-me que lá havia montes e pastos, bom clima e muitos habitantes. Durante mais de 20 anos pensei na terra nuba, dizendo centenas de vezes ao bom Bajit Caenda: «Espero que Deus me conceda a graça de levar a fé católica à tua terra e de ganhar para Jesus Cristo nosso Salvador as tribos dos Nuba.»


[3960]
Quando no ano de 1873 fui para o Cordofão para erigir canonicamente aquela estação missionária, um dos primeiros pensamentos foi o de recolher informação sobre as vizinhas tribos dos Nuba, e Deus indicou-me a maneira de chegar até eles de modo – poderia dizer – quase milagroso. No dia 16 de Julho de 1873, dia dedicado à Sr.a do Carmo, ao sair da nossa igreja de El-Obeid, às oito da manhã, depois da adoração ao Ss.mo (em 1868 introduzi a adoração ao Ss.mo Sacramento «pela conversão dos negros» nos meus institutos do Cairo e mais tarde em todas as estações missionárias), apresentou-se um pequeno grupo de homens nuba guiados por Said-Aga, um dos mais distintos chefes daquelas tribos, que vinham visitar-me. Com eles encontravam-se dois senhores coptas, pelos quais se tinham inteirado de que eu desejava informações muito pormenorizadas sobre os Nuba.


[3961]
Como tinha aprendido de Bajit Caenda diversas expressões na língua nuba e fui capaz de as usar, convenci-me de que eles eram verdadeiramente dessa tribo. Mostrei-lhes logo a nossa igreja, mais a oficina com todo o género de ferramentas artesanais. E após manifestar a Said-Aga a minha firme decisão de fundar entre os Nuba uma estação missionária, pedi-lhe que falasse desse meu projecto com os chefes mais destacados do país e que convencesse um deles a vir a El-Obeid para se fazerem acordos concretos. Said-Aga cumpriu este encargo e a 24 de Setembro apresentou-se o grande chefe de Delen, ou cojur, chamado Kakum, que vinha também para entregar ao paxá do Cordofão o tributo anual. Também esta vez a visita coincidiu com uma festa da Virgem e, de novo, com o momento em que saíamos da igreja, depois da adoração. O cojur Kakum vinha acompanhado de vinte pessoas da sua tribo. Tendo conversado comigo brevemente e visitado todo o estabelecimento com a máxima satisfação, convidou-me a ir ao seu território para aí construir uma igreja e erigir uma missão católica, prometendo para isso o seu total apoio. Então decidi eu mesmo ir ao país Nuba, passadas as semanas das chuvas; ao mesmo tempo comuniquei esta decisão aos meus missionários de Cartum.


[3962]
O P.e Carcereri, que vivia em Cartum, por ser meu vigário-geral, rogou-me insistentemente que o encarregasse dessa missão entre os Nuba antes da sua partida para a Europa, para contar dela, como testemunha ocular, à S. C. da Propaganda de Roma. Acedendo ao seu desejo, ordenei-lhe que fosse logo para El-Obeid, acompanhado do valioso e experiente veterano da missão católica o senhor Augusto Wischnewsky, leigo da diocese de Ermland, o qual pertence à nossa missão desde o ano de 1856.


[3963]
Depois da sua chegada a El-Obeid, decidi enviar a Gebel Nuba o senhor Wischnewsky e o P.e Franceschini, sob a direcção do referido P.e Estanislau Carcereri.

Partiram a 16 de Outubro e alcançaram em breve o primeiro monte dos Nuba, ou seja, Gebel Nuba, ou Uarco, onde falaram com o cojur Kakum e ao cabo de três dias regressaram a El-Obeid. O P.e Carcereri deu uma informação da exploração, que enviei logo à Propaganda, após o que o dito padre foi pessoalmente a Roma e, de viva voz, deu alguns dados mais. O que a Propaganda decidiu a seguir, indicámo-lo no relatório anual do ano passado (página 1). Igualmente já ficou mencionado (página 3) que no dia 31 de Março de 1875 os missionários P.e Luís Bonomi, P.e Gennaro Martini e Domingos Polinari chegaram felizmente a Gebel Nuba, onde foram acolhidos com júbilo pelo chefe Kakum e que também ele me convidou a mim para uma próxima visita.


[3964]
O superior desta estação missionária, P.e Luís Bonomi, membro do instituto missionário de Verona, estabeleceu-se com os seus companheiros junto da residência do grande chefe. Construiu depois, não sem vencer muitas dificuldades, um grupo de cabanas segundo o estilo do país, que, rodeadas no seu conjunto por uma zeriba (sebe), podem acolher primeiro a capela e a estação dos missionários, assim como a escola e, mais tarde, podem receber também as irmãs e a escola feminina. O primeiro que se fez foi estudar o país e a gente e aprender a sua língua.


[3965]
Esta missão tem à volta outros vinte montes, que rodeiam em semicírculo uma extensa planície. O território Nuba encontra-se entre os 11 e os 12 graus de lat. norte e entre os 26 e 28 graus de longitude este (meridiano de Paris). Os habitantes, cujo número está calculado em 40 000, são infiéis que detestam o Islamismo, enquanto pelo contrário se mostram favoráveis à missão católica, especialmente por ser tão favorecida pelo cojur Kakum.


[3966]
O nosso estabelecimento de Delen desagradará a mais do que um governador do Cordofão, pelo que é de esperar-se mais que uma tempestade; mas estas são dificuldades que passam e confiamos que a Missão, sob a Protecção do Divino Coração de Jesus, florescerá e prosperará. Prescindindo da vantagem de esta Missão distar de El-Obeid apenas cinco dias de viagem (a camelo), estão a favor dela a índole e carácter dos Nuba, os quais, neste aspecto, superam de longe os habitantes das antigas estações de Santa Cruz e de Gondokoro e os de outras tribos do Nilo Branco.


[3967]
Em primeiro lugar, os Nuba têm para os missionários a vantagem de não serem nómadas, vivendo, portanto, num sítio fixo. Além disso, ainda que não sejam tão trabalhadores como a gente da Europa, são-no muito mais que as tribos do Nilo Branco e cultivam as suas terras de modo que lhes produzem o necessário para todo o ano. Por outro lado, os Nuba «têm cabeça», isto é, demonstram inteligência e juízo e, amiúde, falando com eles, tem-se a impressão de tratar com europeus cultos; a isto acresce um fino sentido do dever e estima do sacerdócio. Outro mérito é que são muito unidos, ajudam-se mutuamente e, nos perigos comuns, arriscam a própria vida. Quase nunca há entre eles discussões ou zaragatas e pode-se dizer que a sua é uma vida patriarcal.


[3968]
Finalmente, aqui reina uma moralidade superior à de outras tribos. E, embora as jovens andem quase completamente nuas, sendo raríssimas as que têm um trapo para se cobrir, os nossos missionários, que desde há vários meses estão aqui estudando com cem olhos o país, não notaram entre elas nenhuma imoralidade. Acrescento também a isso a submissão e obediência que professam ao seu grande chefe Kakum, que é seu soberano espiritual e civil. Dão, em resumo, a impressão de formarem uma só e pacífica família, coisa que a todos, nós, missionários e irmãs, nos impressionou igualmente.


[3969]
Este chefe não tem organização policial, nem sequer algum polícia; tão-pouco tribunais penais. E sem lei, sem código, sem força física, ele a todos governa pacificamente e todos recorrem a ele nas suas pequenas querelas, submetendo-se ao seu juízo, após o qual os culpados sofrem com paciência a pena que ele dita. Contudo, o chefe jamais empreende coisa de alguma importância sem reunir conselho de anciãos do povo. Estes apresentam-se, tomam lugar debaixo de uma árvore (adansonia), discutem e tratam com tanta maturidade cada um dos seus pequenos assuntos, que é causa de assombro. Eu fui repetidas vezes testemunha ocular de tais reuniões.

São estas as razões principais que nos fazem esperar que esta primeira missão entre os Nuba se desenvolva felizmente. Talvez mais tarde, quando estiver bem arreigada, poder-se-á avançar com o modelo das Reduções do Paraguai.

Há também toda a classe de obstáculos. Os mais importantes são os seguintes:


[3970]
1) A quase completa nudez da população e especialmente da feminina. Há entre os Nuba o estranho preconceito de que as mulheres vestidas não podem ser mães. Entre cem homens não se encontra quase nenhum que se cubra com um trapo ou com um pedaço de pele as partes do corpo que devem andar cobertas. Mas entre a população feminina isso é ainda pior: haverá bem umas duzentas completamente nuas por uma que traz um pedaço de pano no corpo. Por isso se pode ver quão úteis somos e também quão necessárias são as Irmãs para educar as mulheres daqui. Mediante o cultivo do algodão, que certamente cresce nesta zona, pode-se-lhe arranjar vestidos adequados.

2) As superstições crassas, às vezes curiosíssimas. Entre outras coisas, crêem num espírito a que chamam Ocuru, correspondente talvez ao Orco italiano [demónio da morte e dos infernos, identificado com Plutão], o qual se apodera amiúde do grande chefe, como também dos outros chefes e que, como eles dizem, é muito o que adivinha, mas muitas outras vezes «mente».


[3971]
3) A maneira de ser dos Nuba, que não fazem nada por nós sem recompensa, nem sequer depois das maiores promessas de nos ajudarem. Tomam-nos por grandes senhores ou lordes ingleses.

4) As frequentes ameaças dos seus vizinhos árabes, os nómadas Bagara, ou até os habitantes de algum dos montes próximos, que amiúde vêm para roubar e matar. Porém, é um facto que estes inimigos temem muito a Missão, porque crêem que os missionários têm à sua disposição não só o Governo egípcio do Cordofão mas também forças próprias. Verdadeiramente nunca deixamos desarmada a nossa casa, para nos protegermos dos ladrões, dos leões e das hienas. Portanto, também neste aspecto a Missão favorece os Nuba, já que, desde a nossa chegada até hoje, nem nós nem os habitantes de Delen sofremos dano algum por parte dos antes tão molestos Bagara.


[3972]
Apesar destes obstáculos tenho a firme confiança de que, sob a protecção do Divino Coração de Jesus, a Missão lançará raízes e mais, dado estarmos certos de que os Nuba, em geral, confiam em nós e irão mandar os seus filhos às nossas escolas, como fizeram até agora o grande chefe Kakum e outros. Mas para ministrar um ensinamento adequado é necessário que antes os missionários e as Irmãs aprendamos bem a língua nuba. Esta, pelo que até agora pude julgar, é muito mais rica que as línguas dinca e bari. Já aprendemos um bom número de vocábulos, sobretudo com a ajuda de Kakum, que sabe bastante árabe sudanês e, portanto, nos pode explicar as coisas do melhor modo possível.


[3973]
Caberia aqui fazer uma referência à provável história da tribo Nuba, mas, como quero fazê-lo posteriormente mais por extenso, por agora limitar-me-ei a dizer duas palavras sobre o que tenho plena certeza. Os Nuba foram antes um povo muito numeroso, mas foi dizimado pelas contínuas invasões dos muçulmanos mandados pelos governadores do Cordofão, bem como às incursões dos árabes nómadas e dos pérfidos jilabas e dos traficantes turcos. Todos estes assassinos e ladrões se apresentavam todos os anos bem armados, matavam os homens e levavam os rapazes e raparigas, conduzindo-os aos mercados de escravos de El-Obeid, Cartum e Egipto.


[3974]
Com os rapazes formaram mais tarde regimentos inteiros de soldados. Isto, que se vinha a fazer desde há muito tempo, adquiriu maior intensidade a partir de 1822, depois da conquista do Sudão pelas tropas egípcias de Mehmet Ali e faz-se até hoje. Causadores dos maiores estragos foram os governadores Rustan Bey, Mustafá Bey e Muhammad Bey desde 1836 a 1844. O primeiro atrás referido apresentou-se com fuzis e canhões e, após destruir e saquear tudo o que encontrava à sua passagem, matou os chefes, entre eles o pai do cojur Kakum e levou milhares de escravos para o Cordofão. Com os jovens mais fortes formou cinco regimentos Nuba, que mais tarde se mostraram extraordinariamente valorosos. Nessa altura o tráfico de escravos ainda não tinha sido abolido pelas potências europeias. Hoje está abolido, mas só no papel, como letra morta, porque o comércio de escravos continua bem florescente, apesar de todas as leis e decretos do quedive do Egipto, que o proíbem. Estas disposições estavam já vigentes no ano de 1856 sob o vice-rei de então, Said; mas tinham validez unicamente de dia: de noite podiam vender-se os escravos livremente... e por cada um deles ia uma taxa para o erário do vice-rei.


[3975]
Convenci-me de que toda esta violência dos muçulmanos contra os Nuba é a razão principal pela qual estes detestam o Islamismo. Assim, embora os muçulmanos tenham mandado muitos muftis, faquis e ulemas (a modo de missionários, como tem por costume o Governo egípcio nas suas conquistas no Sudão) a pregar-lhes o Islamismo, sempre o rejeitaram com desprezo e às vezes preferiram a morte.


[3976]
Os Nuba afirmam descenderem dos cristãos da Núbia Superior (entre Wady-Halfa e o Cordofão, os desertos ocidentais de Dôngola, Abissínia e o mar Vermelho) a quem os muçulmanos, há séculos, vindos através do Egipto e da Arábia, teriam empurrado para sul; razão pela qual conservaram o nome de «Nuba» e pretendem ser cristãos. Isto não é de todo improvável e há bastantes indícios históricos e linguísticos, sobre os quais mais tarde, quando os missionários e eu tivermos feito investigações mais precisas, não deixarei de dar informações mais pormenorizadas.


[3977]
Quanto ao mais, pelo facto de que estas tribos foram expulsas da sua primeira pátria, misturaram-se com outros negros idólatras e viram-se privados durante séculos do sacerdote cristão; isso faz compreender que tenham perdido toda a ideia do Cristianismo, à excepção da cerimónia que praticam no nascimento de um filho: a da imersão deste na água. Além disso, crêem num único Deus e num mundo de espíritos (os demónios). A Deus chamam-no Beletwo.


[3978]
Bastem por agora estas poucas notícias sobre a nova estação missionária dos Nuba. Espero que Deus bendiga as nossas fadigas e que o ilustre Comité da Marienverein continue a prestar-nos a sua preciosa ajuda, por uma parte mediante contributos produtivos e, por outra, garantindo-nos com a sua influência moral a necessária protecção do Governo real e imperial. Agora flutua a bandeira de Sua Majestade Apostólica I. R., do clementíssimo imperador Francisco José I, triunfante nas estações missionárias de Berber, Cartum, Cordofão e Gebel Nuba; é honrada e temida pelos turcos e pelos negros da África Central; constitui um símbolo da paz, da fé católica e da poderosa protecção de que gozam os missionários em todo o vastíssimmo Vicariato.



5. SCHELLAL




[3979]
Dentro de pouco terei que restaurar também a Missão de Schellal para poder assistir os cristãos que actualmente trabalham aí na construção do caminho de ferro, que deverá chegar até Cartum. Já está construído entre Assuão e Schellal e começou-se com a linha de Wady-Halfa a Dôngola, etc.

A nossa casa em Schellal (construída durante o mandato do pró-vigário mons. Kirchner) está nas melhores condições. Poder-se-á fazer à volta dela um quintal, porque a missão tem aí um terreno de 14 feddan (uns 50 000 metros quadrados) que, bem cultivado, produzirá sem dúvida o suficiente para alimentar o futuro pessoal da missão. Além disso, havendo um maior tráfego de pessoas, graças à linha do comboio, aumentarão também aí os cristãos e os membros da missão poderão desenvolver um bom trabalho.



6. OS INSTITUTOS DE NEGROS PARA

A ÁFRICA CENTRAL DO CAIRO




[3980]
Destes Institutos deu-se notícias nas anteriores informações anuais, pelo que esta vez só quero aduzir uma razão da sua importância. Destes estabelecimentos do Cairo, fundados por mim em 1867, enviei em 1871 como exploradores ao Cordofão dois missionários que neles se tinham aclimatado a partir de 1867, os padres Carcereri e Franceschini, para que procurassem um lugar favorável onde fundar a missão. No ano de 1872 a Santa Sé confiou-me o Vicariato Apostólico da África Central. Desde então até hoje chegaram ao mesmo como missionários catorze sacerdotes europeus e nestes quatro anos não morreu nem um deles; pelo contrário, todos estão fortes e sãos e trabalham cheios de zelo na difícil vinha do centro da África. A razão disso deve-se certamente ao facto de não terem ido directamente da Europa para a África interior, mas terem-se aclimatado primeiro e durante muito tempo no Cairo.


[3981]
Além disso, neste intervalo, os missionários podem estudar a língua árabe, assim como os usos e os costumes tanto dos árabes como dos outros povos, e depois, já preparados do melhor modo possível, empreender a actividade missionária; enquanto antes, com o excelente senhor pró-vigário dr. Knoblecher (1848-1858) e os seus sucessores mons. Kirchner e Reinthaller, a maior parte dos membros da missão morriam pouco tempo depois da sua chegada a Cartum, a Santa Cruz ou a Gondokoro.


[3982]
Desde o ano de 1867 todo o pessoal da Missão do Cairo teve que viver em casas tomadas de arrendamento, pelas quais eu tinha de pagar anualmente cem napoleões de ouro. Para evitar este gravoso gasto, fiz diligências no sentido de obter em doação do vice-rei do Egipto um terreno para construir casas, uma para os missionários e outra para as Irmãs. Para este fim dirigi-me repetidamente com pedidos ao I. R. cônsul-geral, o cavalheiro von Schreiner, para conseguir do quedive esse terreno, mas sempre sem êxito. Porém, quando o cavalheiro Ceschini se tornou cônsul-geral e agente diplomático no Egipto, Deus abençoou as nossas fadigas e o vice-rei doou à missão um magnífico terreno para nele construir, situado no bairro central do Cairo Velho (bairro de Ismailia), o qual mede 3891 metros quadrados, extensão suficiente para construir os dois institutos.


[3983]
Segundo a taxação dos engenheiros egípcios do vice-rei, este terreno tem um valor de 43 000 francos. Muito obrigado, pois, ao magnânimo vice-rei e sobretudo ao generoso senhor cônsul-geral, o cavalheiro Ceschini, que fez tanto esforço para nos conseguir esta preciosa oferta! Já se começaram a levantar as duas casas. Os gastos da construção realizada até agora ascendem a 22 000 francos e estão pagos; mas tenho verdadeira necessidade de grandes ajudas por parte dos amigos da missão, que permitam promover e completar esta obra tão importante para o Vicariato.


[3984]
Nas várias estações missionárias do mesmo vivem actualmente 14 sacerdotes, 9 religiosas (Irmãs de S. José) e 7 leigos europeus como coadjutores, entre eles o mui benemérito veterano da missão senhor Augusto Wischnewsky, que veio para Cartum já no ano de 1856 com os missionários L. Gerbl, I. Lanz, e A. Kaufmann. Para além do pessoal citado, tenho que manter também um número maior de mestras negras com os fundos da missão, as quais foram educadas em Verona e quase cem alunos de ambos os sexos.


[3985]
Mas até agora Deus concedeu-nos manifestamente a sua bênção e não tenho dúvidas: esta vez, só uma caixa vazia. Contudo, o bom Deus para quem trabalhamos, prestar-nos-á a sua ajuda também no futuro, e nos conservará os velhos benfeitores, suscitando ao mesmo tempo outros novos. O meu programa é: «Nigrícia ou morte». Ao menos eu resistirei até ao último alento.


[3986]
Este ano, dois comerciantes hereges abjuraram da sua antiga confissão de fé. Além disso tivemos 69 baptizados de adultos. No dia 21 de Julho de 1875, em El-Obeid, administrei numa só vez o santo baptismo e o sacramento da confirmação a 16 adultos.



O INSTITUTO DAS MISSÕES DA ÁFRICA CENTRAL

DE VERONA




[3987]
Este último existe desde 1867 sob a protecção de Sua Excelência Rev.ma o bispo mons. Luís, marquês de Canossa, e por benevolência de Sua Majestade o imperador Fernando e da imperatriz Ana Pia e foi formado com o objectivo de formar missionários para a África Central.


[3988]
A este instituto confiou a Santa Sé o nosso Vicariato Apostólico. Ao instituto para os futuros apóstolos da África Central acrescentei um segundo: o das Pias Madres da Nigrícia, com o fim de obter mestras para o sector feminino nas missões. Até agora saiu dos referidos institutos muito pessoal para a África Central. Actualmente há neles, segundo dados do rev.do superior, P.e António Squaranti, seis candidatos e quinze irmãs, as quais já estão preparadas para se transferirem para a África como úteis mestras.


[3989]
Isto é um ligeiro esboço da actual actividade missionária em e para a África Central. A Marienverein favoreceu-a imensamente na Áustria-Hungria e suplico ao ilustre Comité e a todos os membros desta associação que nos continuem a assistir também no futuro. Por nossa parte, rogaremos todos os dias por Sua Majestade apostólica real e imperial e por toda a sua augusta casa; fá-lo-emos também pelo rev.mo presidente do ilustre comité e por todos os seus membros, assim como todos os benfeitores vivos da nossa missão; mas rogaremos igualmente pelo descanso eterno dos seus dois maiores benfeitores, Sua Majestade o imperador Fernando e Sua Alteza imperial o sr. duque de Módena e igualmente pelos beneméritos protectores da nossa missão, o conselheiro áulico Frederico von Hurter-Ammann, de feliz memória, e o inolvidável sr. barão de Spens.



P.e Daniel Comboni

Pró-vig. apost.



Original alemão

Tradução do italiano






626
Carta Circular
0
Delen
28.10.1875
N.o 626 (596) - CARTA CIRCULAR

ACR, A, c. 18/9 n.1



Delen, 28 de Outubro de 1875



P.e Daniel Comboni

por graça de Deus e da Santa Sé Romana

Pró-vigário Apostólico da África Central



[3990]
Ao venerável clero secular e regular e aos dilectos fiéis do nosso Vicariato Apostólico. Paz e bem.

É certo que as nossas tribulações são muito grandes e sem número, caríssimos filhos! É certo que por toda a parte nos acompanham os perigos, a sede, as doenças, as aflições, as lutas e as cruzes. Porém, com toda a verdade podemos dizer com o Apóstolo das Gentes que o conforto que nos envia N. S. J. C. superam aquelas. Por isso nós, na humildade do nosso coração, convidamo-vos a louvar e abençoar a bondade e misericórdia do Sacratíssimo Coração de Jesus Cristo. Recordais bem com quanta alegria e exultação de espírito no dia 14 de Setembro de 1873 consagrámos solene e publicamente a nossa pessoa, o nosso imenso Vicariato Apostólico e a vós, filhos dilectíssimos, ao divino Coração de Jesus. Recordais que as esperanças que então concebemos de que se nos depararia uma nova era de graça e de bênçãos e de que para nós e para os mais de cem milhões de infiéis do nosso laborioso vicariato se abririam os tesouros da piedade e misericórdia deste adorabilíssimo Coração.


[3991]
Porém, que criatura humana ou angélica seria capaz de nos facilitar a entrada nesse santuário divino ou fazer com que derramassem sobre nós as suas inesgotáveis riquezas? Ah, chorava o discípulo predilecto ao ver aquele livro misterioso selado com sete selos, ao mesmo tempo que um Anjo com voz sonora exclamava: Quem é digno de abrir o livro e soltar os seus selos? Quis est dignus aperire librum et solvere signacula eius? E ninguém respondeu nem no Céu nem na Terra: et nemo poterat neque in Coelo neque in Terra; et ego flebam multum (Ap 5, 3-4) Quem, então, nos abrirá o livro misterioso do Coração Sacratíssimo de J. C.? Qual será a chave bendita que nos abra a sua porta?... Pois bem, sequemo-nos as lágrimas, caríssimos filhos, enxuguemos o pranto, consolemo-nos...


[3992]
Porque a bela filha do rei David, Maria Virgem Imaculada, tem nas suas mãos essa preciosa chave; e mais, ela é a mística chave do adorável Coração de seu Filho Jesus. Sim, Maria abre esse Coração e nada o pode fechar; fecha-o e ninguém o pode abrir: Clavis David quae aperit et nemo claudit; claudit et nemo aperit. Ela abre esse divino Coração a quem quer, como quer e quando quer. Dispõe dos tesouros infinitos desse divino Coração como lhe apraz e em favor de quem lhe apraz. Mas porque é que Maria pode tanto sobre o adorabilíssimo Coração de Jesus? Porque é a Bem-Aventurada Mãe de Jesus Cristo e, portanto, Rainha e Senhora do Coração de Jesus. Este nome inefável é mel na boca, melodia nos ouvidos, júbilo no coração; mel in ore, melos in aure, in corde jubilum.


[3993]
É um nome que fez brilhar a bondade do Coração de Jesus Cristo nestes tempos calamitosos, para iluminar e consolar a todos, confortar a quantos a Ela recorrem. Porque agrada-lhe ser invocada como Nossa Senhora do Sagrado Coração de Jesus; título com o qual é proclamada despenseira generosa de todos os imensos tesouros e de todas as graças do Sacratíssimo Coração do seu divino Filho Jesus. É proclamada a mãe mais terna e amorosa de todas as mães; a advogada mais eloquente que todos os anjos e todos os santos; a esperança dos pecadores; a consoladora dos aflitos; a luz dos peregrinos; o porto dos que correm perigo; é saudada como a mulher sem mancha, a sede da sabedoria, o prodígio do infinito amor de Deus, o perpétuo panegírico de todos os séculos, o elogio universal de todos os seres, a harmonia pública e geral de todas as criaturas, o milagre da omnipotência divina.


[3994]
Nossa Senhora do S. Coração de Jesus!! Oh, quantas glórias encerra este augusto nome! Quanto valor e grandeza contém em si! Por isso, este bendito nome soa nos lábios de muitos milhões de fiéis (1). Invocam-na de todos os cantos do mundo justos e pecadores, sacerdotes e leigos, príncipes e vassalos, grandes e pequenos: todos...

Sim, todos aqueles a quem chegou este nome dulcíssimo o saúdam, clamam por ele, invocam-no e todos experimentam efeitos salvíficos, obtendo copiosas graças espirituais e temporais desta piedosíssima mãe! Daí que todos os dias de todos os pontos do orbe católico se eleve ao Céu uma melodia celestial de infinitas vozes, as quais bendizem a Senhora do S. Coração de Jesus por tantas graças impetradas por Ela (2)!


[3995]
E o Coração de Jesus como se compraz em ver Aquela a quem tanto ama tão honrada e glorificada aqui na Terra! Por isso, do Céu faz chover cada vez mais as suas bênçãos sobre os seus adoradores e os admiradores de sua Mãe. E a todos diz Jesus: se quereis entrar em Meu coração e participar das graças e das Minhas bênçãos, recorrei a Maria e, por Ela, tereis acesso a Mim. Invocai-a como Nossa Senhora do Sagrado Coração de Jesus, que ela vos consolará. Sim, dilectíssimos filhos, vinde ver as obras do Senhor. Vinde contemplar este prodígio da graça de Deus, N. Sr.a do Sagdo. Coração adorável de seu filho Jesus. Ela pode tanto que por excelência se denomina «a advogada das causas mais difíceis e desesperadas». E St.o Efrém chama-a “a esperança dos desesperados”: spes desperantium. E São Bernardo a “omnipotência suplicante”.


[3996]
Pois bem, não é para o nosso querido Vicariato da África Central um grande sinal de salvação e de graça este novo título, com o qual nestes tempos aparece gloriosa entre nós a grande Mãe de Deus? Se Nossa Senhora é a chave mística do Coração de Jesus, não quererá ela dar acesso aos infinitos tesouros desse Coração adorável a estas almas abandonadas dos descendentes de Cam? Se Maria, assim invocada, não sabe negar graças a ninguém, quererá e poderá ela negar-se a socorrer-nos em nossas grandes tribulações, no nosso laboriosíssimo e difícil apostolado, em todas as nossas necessidades?


[3997]
Não, não, não... Jamais se ouviu de ninguém que, após invocar Nossa Sr.a do Sagdo. Coração de Jesus em suas necessidades, não tenha sido por ela escutada. Reavivemos a fé, filhos dilectíssimos; reavivemos a fé. A divina Mãe profetizou que todas as gentes a chamariam bem-aventurada: ex hoc beatam me dicent omnes generationes (Lc 1,48). E, porventura, a Etiópia, a África Central, não entrarão no concerto das bênçãos à Grande Mulher sem pecado?... Sim, entrarão. E por ela encontrará o seu Deus Salvador e o adorará: coram illo procedent aethiopes, diz outra profecia (Sal 71).


[3998]
Sim, sigamos esta fulgurante estrela de Jacob, Nossa Sr.a do S. Coração e em breve a África Central encontrará o seu salvador Jesus. “Lumen requiramus lumine et inveniemus Jesum.” Por isso recorramos a ela cheios de confiança. É nossa intenção oferecer e consagrar-lhe a nossa própria pessoa e também a vós, filhos devotíssimos, e a toda a gente do nosso imenso Vicariato. D’Ela, a Sr.a do Sagdo. Coração de Jesus, esperamos as ajudas, os meios e as graças necessárias para poder estabelecer e implantar sobre estas abrasadas planuras da África Central o glorioso estandarte da adorada cruz de Jesus Cristo.


[3999]
E quando estas gentes que agora vivem nas deploráveis trevas da idolatria e do feiticismo se tiverem convertido e refugiado no Coração de Jesus C., quando o nome de Jesus ressoar nos lábios dos filhos de Cam, então elevar-se-á um hino de alegria de todos os peitos e exclamarão: louvor, glória e eterna bênção a N. Sr.a do S. Coração de Jesus. Por Ela, temos entrada no Sacratíssimo Coração de Jesus; por Ela conhecemos Jesus Cristo; por Ela participamos da redenção, das graças, dos méritos, da herança de J. C. Nosso Salvador, e por Ela esperamos entrar um dia no reino dos céus que J. C. nos prometeu, o qual está na glória com o Pai e com o Espírito Santo pelos séculos dos séculos.


[4000]
A fim de completar e aperfeiçoar o acto de consagração do Vicariato ao S. Coração de Jesus, que realizámos solenemente em tempos não distantes, e de assegurarmos todos os tesouros de graças e bênçãos deste adorabilíssimo Coração, na humildade do nosso espírito, estabelecemos que na próxima festa da Imaculada Conceição, em todas as paróquias do nosso vicariato, depois da missa solene e após as ladainhas lauretanas, se reze, diante do Santíssimo Sacramento exposto solenemente sobre o altar, o seguinte acto de consagração da África Central a N. Sr.a do S. C. de Jesus, terminando a sagrada função com a bênção do Santíssimo.


[4001]
Para tal fim, com base nas amplíssimas faculdades que nos outorgou a Santidade do Sumo Pontífice Pio IX, concedemos indulgência plenária a todos os fiéis que, arrependidos e confessados, se acerquem da mesa eucarística, assistam à mencionada função e roguem pela vitória da Igreja e pelo triunfo do vigário de J. C.

Dado em Delen (Uarco), nossa residência provisória de Gebel Nuba, na festa dos Santos Apóstolos Simão e Judas, a 28 de Outubro de 1875.



P.e Daniel Comboni

pró-vig. ap. da África Central

O secretário



(1) Os inscritos na Arquiconfraria de N. Sr.a do S. C. ascendem a mais de doze milhões.

(2) Até hoje, no registo central de Issodoun estão recolhidas 120 000.






627
Faustina Stampais
1
El Obeid
25.11.1875
N.o 627 (598) - A FAUSTINA STAMPAIS

ACR, A, c. 15/151 n.2



El-Obeid, 25 de Novembro 1875

Breve bilhete.





628
Acto Consagração Africa C.
0
11.1875
N.o 628 (599) - ACTO DE CONSAGRAÇÃO DA ÁFRICA CENTRAL

A N. SR.a DO SAGDO. CORAÇÃO DE JESUS

ACR, A, c. 18/9 n.2



Novembro de 1875



[4002]
Eis-nos aqui prostrados a vossos santíssimos pés, ó Virgem bendita e Mãe de Deus, Maria; exultantes de júbilo saudamo-vos pela primeira vez nestas áridas terras com o novo e glorioso título de Nossa Senhora do Sagdo. Coração de Jesus. Este nome augusto brilha hoje para nós como um sol nas trevas, como um arco-íris de paz e de reconciliação entre a Terra e o Céu. Ao apareceres hoje no meio dos vossos filhos, reavivais as nossas esperanças e consolais-nos recordando-nos que hoje se nos mostra a bondade e a benignidade de Nosso Salvador J. C.; porque hoje abris a todas estas terras os tesouros de graças e bênçãos encerrados nesse Coração adorável, do que só Vós sois a Rainha e a Senhora.


[4003]
Sim, saudamo-vos, ó Maria, ó Augusta Soberana do Sagdo. Coração de Jesus. Saudamo-vos nesta sagrada solenidade, ó filha predilecta do Eterno Pai, por quem o conhecimento de Deus chegou até aos últimos confins da Terra. Saudamo-vos, ó casa do eterno Filho, que nasceu de Vós vestido de carne humana. Saudamo-Vos, ó Morada inefável do Eterno Divino Espírito, o qual derramou em Vós todos os seus dons e todas as suas graças. Ó Maria, ó rainha amável do Sagdo. Coração de Jesus, que oportuna acudis às nossas necessidades! A Divina Providência reservou-Vos para estes tempos e lugares... Vinde, sim, vinde até nós, ó Virgem Imaculada. Vinde, reinai e sede senhora destas terras desoladas e abandonadas!... Só vós, ó Maria, podeis fecundar com a vossa bênção este solo já árido e espinhoso de 19 séculos. Só Vós podeis iluminar com a vossa luz tantos pobres infiéis, filhos do desditoso Cam, os quais vivem ainda nas sombras da morte! Só Vós podeis dar o seu Deus e Senhor a tantos milhões de desventurados!...


[4004]
Por isso, cheios de confiança na vossa maternal piedade, recorremos a Vós; refugiamo-nos sob a vossa poderosa protecção, certos de que Vós nos consolareis, escutareis as nossas súplicas e enxugareis as lágrimas de tantos filhos vossos! Ficai, pois, a nosso lado, ó Maria, Nossa Senhora do Sagrado Coração de Jesus. Apresentai-vos e vinde em nossa ajuda. Em vós, depois de Jesus, depositamos todas as nossas esperanças. Vós sois o estandarte da fé ortodoxa: estendei-a por estas terras com o vosso poder... Vós sois a mãe bem-aventurada do Nosso Divino Redentor morto por todos na cruz. Fazei que esta se implante em toda a Nigrícia! Vós sois a Rainha dos Anjos: enviai muitos esquadrões angélicos em nossa ajuda para acabarmos com o reinado de Satanás! Vós sois a mãe dos apóstolos: suscitei em muitos obreiros evangélicos o espírito apostólico e conduzi-os a esta parte abandonada da vinha do Senhor! Vós sois... oh! Vós sois tudo para nós, depois de Jesus. Por isso, após ter-nos oferecido e consagrado ao Ss.mo Coração de Jesus, hoje, solenemente, nos dedicamos e consagramos a Vós. Sim, a Vós, Nossa Senhora do Sagrado Coração de Jesus, nós nos oferecemos, nos doamos, nos consagramos.


[4005]
A Vós nos consagramos nós mesmos, as nossas famílias e todo o Vicariato da África Central. Consagramo-vos os nossos pensamentos, as nossas palavras, as nossas acções. A Jesus e a Vós oferecemos e consagramos os nossos sofrimentos, as nossas fadigas, toda a nossa vida. A Vós e a Jesus encomendamos e consagramos todas as almas das regiões da África Central. E Vós Maria, N. Sr.a do Sagdo. Coração de Jesus, cuidai dos nossos pobres filhos, guardai-os como herança e propriedade vossa. Sede nossa guia nas viagens, nossa mestra nas dúvidas, nossa luz nas trevas. Sede nossa saúde e fortaleza nas doenças, nossa advogada, nossa mãe ante o Coração de vosso bendito Filho Jesus em toda a nossa vida. E depois, na hora da morte, protegei-nos, ó Maria, assisti-nos com Jesus. Que digamos como últimas palavras: amado seja em toda a parte o Sagdo. Coração de Jesus; louvada e bendita seja em todas as línguas Nossa Senhora do Sagrado Coração. Ámen.



P.e Daniel Comboni

Pró-vigário Apostólico da África Central






629
P.e Estanislao Carcereri
0
11.1875
N.o 629 (1210) - AO P.e ESTANISLAU CARCERERI

AGCR 1694/106



Novembro de 1875



[4006]
«Gebel Nuba é insalubre um mês, creio, mas o resto do ano é saudável». ........«Acertaremos tudo em Berber, onde, depois de termos discutido um pouco, acabaremos por nos abraçar, porque lhe tenho o mesmo carinho de sempre e continua a ser o meu primogénito.»



Algumas frases de uma carta de Comboni de uma carta do P.e Carcereri.






630
Faustina Stampais
1
Cartum
15.12.1875
N.o 630 (600) - A FAUSTINA STAMPAIS

ACR, A, 15/141 n.3



Cartum, 15 de Dezembro de 1875



Breve bilhete.