Comboni, neste dia

Dalla stazione di S. Croce (1858) scrive a suo padre:
Non dubitate, caro padre, io sono venuto missionario per faticare alla gloria di Dio, e consumare la vita per il bene delle anime.

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N° Escrito
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Remetente
Data
1111
Card. João Simeoni
0
Cartum
29. 08. 1881

N.o 1111; (1065) - AO CARD. JOÃO SIMEONI

AP SC Afr. C., v. 9, ff. 161-166

Num 14

Cartum, 29 de Agosto de 1881

Em.mo e Rev.mo Príncipe,

[6971]

Mando-lhe aqui o mapa exactíssimo de Dar-Nuba, que os meus companheiros e eu traçámos, em seguida à importante expedição que com muita diligência e indizível esforço e sofrimento levámos a cabo por aquelas montanhas em Junho passado, a fim de se tomarem as medidas necessárias para abolir lá o tráfico de escravos, que todos os anos foi dizimando aquelas míseras populações e implantar a nossa santa fé. O respectivo relatório, que será muito interessante, vou fazê-lo e mandá-lo quanto antes, apenas me encontre melhor e tenha realizado outros trabalhos urgentes. Em Delen terminou-se uma igreja que tem um tamanho duas vezes superior às casas dos chefes, cojurs e sultões de Dar-Nuba e que constitui uma maravilha para aquela gente. Na festa do Corpo de Deus celebrei lá o pontifical e administrei solenemente o baptismo a oito ou nove adultos e a confirmação a uns quarenta.


[6972]

Após vivas instâncias do rev.do P.e João Losi, que estava provisoriamente à frente daquela missão e que compôs um dicionário de mais de 3000 palavras na difícil língua nuba, totalmente desconhecida da ciência, e traduziu para a mesma as orações da Igreja e um catecismo, nomeei superior da dita missão P.e Luís Bonomi, a quem em 1879 retirei daí para que me representasse em Cartum durante a minha ausência do Vicariato, porque – dizia-me P.e Losi – P.e Bonomi é o mais capaz de dar impulso àquela missão e de superar todas as dificuldades que se apresentarem; e é verdade. Ao comunicar-lhe a notícia, ele respondeu a P.e Losi: «Basta que o queiras ou monsenhor o deseje e eu aceito com muito gosto, porque só quero fazer a vontade dos meus superiores.»


[6973]

Quanto à abolição do tráfico de escravos entre os Nuba, o Ex.mo Rauf Paxá, governador-geral do Sudão, adoptou literalmente os meus conselhos e, dentro de um ano, mais ou menos, será um facto consumado a total abolição do comércio de escravos entre os Nuba. Não é preciso referir a grande alegria e entusiasmo dos chefes e populações daquela zona, a quem, desde a minha visita, não foi roubado nem um filho nem uma filha, nem uma vaca, nem uma cabra; e reconhecem unanimemente que foi a Igreja Católica quem os libertou, sobretudo quando viram capturar os chefes dos bandidos Bagara, tal como eu lhes tinha prometido de forma categórica. Isto tornará o nosso apostolado entre aquelas gentes menos difícil. Rauf Paxá também adoptou a minha sugestão de separar da jurisdição do Cordofão (onde tanto o governador como os funcionários e os magnates são todos ladrões e assassinos, cúmplices e favorecedores do tráfico de escravos na Nuba, sobre o que falei a Sua Excelência para procurar um remédio, embora seja muito difícil) a zona compreendida entre o Birchet-Koli e o Bahar-el-Ghazal, e formar com ela uma província especial, à parte, a qual terá de se confiar a um europeu que não seja ladrão ou astuto. Também isto será um facto consumado dentro de um ano, porque a estas horas o grande paxá está a procurar no Egipto o homem adequado e porque informou disso Sua Alteza o quedive, que sinceramente quer acabar de uma vez por todas com o tráfico de escravos, que ainda existe na zona confinante com a Abissínia, nos territórios junto ao Darfur e noutros lugares dos vastos domínios egípcios na parte do equador.


[6974]

Dentro das minhas limitadas possibilidades, à força de falar e de escrever, consegui convencer profundamente S. E. o governador (já tinha falado claramente do assunto ao quedive no Cairo, o qual me disse muito boas palavras) da utilidade e necessidade de um caminho de ferro que una o mar Vermelho com o Nilo em Cartum. Além das imensas vantagens materiais para o Egipto e o Sudão, daí adviriam grandes possibilidades para as missões católicas e para pôr fim definitivamente à horrível chaga do comércio de escravos na África Central. O facto é que ontem veio visitar-me o governador-geral, a quem encontrei entusiasmado com a ideia do caminho de ferro a ligar o mar Vermelho com o Nilo em Cartum. Disse-me que tinha escrito sobre isso ao Divã do Cairo (o qual se mostra contrário por questões políticas) e que não o deixará tranquilo até obter a aprovação; e irá obtê-la.


[6975]

A ideia também seduz muito o cônsul francês, que me prometeu tratar o assunto com Paris, para que pressione o Egipto sobre o assunto (se não morrer: desde há bastantes dias que lhe mando as Irmãs para o assistirem, porque está a ser presa das ardentíssimas febres do Sudão). Entretanto Rauf Paxá vai preparando uma importante soma de dinheiro para começar a construir o caminho de ferro.


[6976]

Vossa Eminência verá na parte inferior do meu mapa de Dar-Nuba o Bahar-el-Arab. Pois bem, o Bahar-el-Arab está-me a causar desde Setembro do ano passado (altura em que, estando em Roma, li nas Missions Catholiques que o limite setentrional das missões de mons. Lavigerie, como escreveu esse prelado, é o Bahar-el-Arab) uma grande dor de dentes, que não me passará até à morte ou até que a Sag. Congregação tome outras decisões mais convenientes e necessárias. A sul do Bahar-el-Arab vivem imensas populações, que se estendem até ao Alberto Nyanza e ao equador, as quais falam ou compreendem duas línguas, das quais nós, com grande esforço e estudo, conseguimos compor ao longo de vários anos um dicionário, uma gramática e o catecismo, mais outras obras já publicadas (e o resto que eu publicarei), que formam em conjunto o elemento e o material necessário e suficiente para implantar naquelas regiões a fé, tanto mais que se trata de países incorporados na coroa do Egipto, a qual se mostra tão favorável às missões católicas da África Central. Mas confio no dulcíssimo Coração de Jesus e na sabedoria, caridade e justiça da Santa Sé, que acertarão tudo.


[6977]

Outra dor de dentes chegou-me hoje de Verona, em relação à absoluta discrepância de opinião entre mim e o meu benfeitor, o Em.mo card. de Canossa, sobre uma virgem cristã, isto é, sobre a vocação de uma tal Virgínia Mansur, a quem esse em.mo atira por terra e a quem eu coloco logo abaixo das nuvens. Mas esta dor de dentes começa-me a passar, porque, segundo parece, o card. de Canossa informou disso V. Em.a (o que para mim é um grande alívio, porque em Roma será feita justiça) e o meu caro reitor Sembianti recebeu ordem de V. Em.ª para dizer a Virgínia que, por agora, não vá para a África, ordem prudentíssima e para mim sumamente venerável e justa, que será cumprida pontualmente.


[6978]

Antes, quanto a Virgínia, nada se deve fazer que não seja decidido e ordenado por V. Em.a, verdadeiro intérprete da vontade divina, depois de ter ouvido as duas partes, isto é, Verona e a África Central, e isso para triunfo da justiça, da caridade e da verdade, cujo refúgio bendito é apenas a Roma papal.


[6979]

Estando próxima a saída do correio, não posso começar a escrever-lhe sobre esse assunto; mas fá-lo-ei com o próximo correio de sábado, ou seja, dentro de três dias, se Deus me der força e saúde, porque ainda estou fraco e sem sono e apetite.

Depois dos meus primeiros argumentos que eu lhe irei apresentar, rogaria a sua bondade que, se o considerar certo, escrevesse ao P.e Sembianti a dizer que ordene e comunique a Virgínia que fique no convento em Verona na condição de postulante, que é a ínfima do convento, até novas ordens de V. Em.a rev.ma. O convento e a instituição é minha e, por isso, V. Em.a é dono dela.

Seu indig.mo filho † Daniel Comboni


1112
P.e José Sembianti
0
Cartum
30. 08. 1881

N.o 1112; (1066) - AO P.e JOSÉ SEMBIANTI

ACR, A, c. 15/132

N.o 33

Cartum, 30 de Agosto de 1881

Meu caro padre,

[6980]

Mando-lhe um pedacinho do pequeno relatório sobre a nossa exploração de Gebel Nuba, escrito por P.e Vicente. (Este chegou a Berber e está prestes a partir para Suakin. Com ele mandei também o meu serviçal Domingos Correia, que vai para Roma, porque morreria se continuasse aqui: está acostumado a servir grandes senhores, a andar de carro, a comer bem e beber melhor e aqui não consegue adaptar-se a suportar privações, etc. Para o seu lugar assumi José, um toscano, que me rende dez vezes mais que Domingos: é bom, capaz, diligente, trabalhador e cheio de boa vontade. Todos estão contentes com ele. Este tinha necessidade de trabalho; não fazer nada no Cairo matava-o. Graças a Jesus). Pode publicá-lo no próximo número dos Anais. Mas o grande relatório, com o mapa que já tenho pronto, prepará-lo-ei quando me encontrar melhor e dispuser de tempo, se não morrer antes. O formato, etc. dos Anais é muito melhor que antes, e isso deve-se à sua diligência e interesse: agradeço-lhe muito.


[6981]

Ainda não vejo claro sobre a saúde de P.e Francisco Pimazzoni; P.e Artur, algumas Irmãs e outros dizem que o seu estado não lhes agrada nada. Meu Deus! Será que o irei perder? No Coração de Jesus, confio que não. Ah, quantas cruzes e tribulações sobre mim! Mas Jesus foi o primeiro a carregar a cruz e, depois, têm-na carregado todos os seus servidores. À noite (não durmo quase nunca, mas esta noite dormi três horas e meia) encontro-me satisfeito por ter sofrido e padecido muito as 24 horas precedentes; infinitamente mais contente do que quando em Londres, Paris, Viena ou Sampetersburgo voltava para casa depois de um banquete com aristocratas. Jesus é mais amável com aqueles de quem gosta, quando os visita no meio dos espinhos. As rosas são para o mundo. Estou convencido de que também a pobre Virgínia, que Deus confiou aos meus cuidados, até que Roma decida sobre ela, está perto de Jesus, pelo qual aceita sofrer de boa vontade.


[6982]

Agora compreendo quanta razão tinha em chorar de noite e sofrer. Ela via claro (e eu não) que não a queriam no instituto. Não foi chamada para se juntar com as outras desde Maio e, nem a superiora nem o senhor, meu caro reitor, lhe disseram o motivo. Ela escreveu-me uma carta que é a linguagem da franqueza e da verdade e cuja leitura fez com que a Ir. Vitória dissesse: «Pelos sentimentos que transpiram desta carta, vê-se que a sua autora é uma alma boa, cheia de abnegação e com ânsia de ser religiosa; em suma, por esta carta – dizia-me ontem –, creio que deve ser uma espécie de heroína.» O senhor abanará a cabeça, meu caro reitor, e dirá que é a paixão que fala.


[6983]

Não; jamais se alojou no meu coração paixão alguma, a não ser a África. Se se me acendesse uma centelha de paixão (coisa que se não coaduna com o meu carácter e com a minha profunda, antiga, extraordinária vocação), não teria sido por Virgínia, por uma freira que se confessa, e não a teria mandado para Verona, nem a teria confiado àquelas Irmãs que fundei para as fazer santas, etc. Em resumo, tudo é possível para as limitadas mentes dos camponeses, que querem ir mais além da sua esfera. Vou mandar ao meu em.mo superior, o card. Simeoni, esta carta de Virgínia, logo que me escreva sobre o assunto. Oh, que contente estou de que Deus tenha inspirado o nosso caro em.mo bispo de Verona a informar a Propaganda. Se isso não tivesse sucedido, o em.mo de Canossa, o senhor, meu caro Sembianti e eu teríamos vivido e morrido com a nossa opinião sobre Virgínia, tão oposta uma à outra.


[6984]

Mas agora, com a graça de Deus, ou eu ou o senhor e o em.mo, deveremos mudar de opinião, atendo-nos ao que Roma decidir, essa Roma papal e bendita, que é o oásis providencial onde têm refúgio a verdade e a justiça e que difunde a sua luz no meio das foscas trevas que turvam o universo. O senhor e o em.mo de Verona estão convencidos de que eu ajo movido pela paixão a respeito de Virgínia; e a mim, ao contrário, parece-me indubitável que o em.mo e o senhor, tendo sempre como guia o espírito de Deus e um fim verdadeiramente santo, agem movidos de paixão, mas em sentido contrário. E no meio está Virgínia, a vítima que sofre, sem ninguém que lhe proporcione um verdadeiro conforto, porque a superiora (que não é nada expansiva) a uma pergunta que Virgínia lhe fez relacionada com o que Sua Em.a lhe dissera, que soubera da superiora (ou directamente ou por meio do reitor) o verdadeiro motivo pelo qual saiu da Congregação de S. José, a boa superiora disse que nunca tinha falado disso, nem com o cardeal nem com outros. Mas como o senhor me escreveu que a razão que a levou a deixar a congregação não é razoável, então tem que ser verdade que a superiora falou, pois eu não posso sequer imaginar que o senhor ou o em.mo o tenham inventado.


[6985]

Por outro lado, um ano antes de sair, Virgínia discutiu sobre isso com as Irmãs. No Egipto examinaram-se as três graves razões, e um bispo frade – que ainda vive – disse-me que as mesmas eram válidas, etc., de modo que Virgínia, ao sair, não agiu de forma ligeira, mas sim depois de muito reflectir e se aconselhar. Mas o senhor não me acredita, nem tão-pouco Sua Em.a e pensam que tudo é por paixão; enganam-se. Ela invoca e obtém o único conforto de Deus e de mim que, como mil vezes me rogava a minha santa provincial, sua superiora e madre, escrevo-lhe precisamente para a consolar e para que mantenha inamovível a sua confiança em Deus. Sua Eminência, o senhor e eu iríamos viver e morrer com a nossa opinião.


[6986]

Mas agora que o assunto está em Roma, se Roma decide contra mim (falo da vocação, etc.) eu serei o primeiro a manifestar-lhe a si e a Sua Eminência que sou um grande asno; e creio que o juízo de Roma também será aceite sem pestanejar por si, de quem a primeira coisa que posso dizer é isto: o senhor é um santo, como santa é a sua congregação, e trata os meus assuntos da África com um empenho, um zelo e uma caridade maiores do que eu trataria dos seus; é uma grande bênção que Deus tenha destinado o senhor para cuidar dos interesses capitais da Nigrícia como reitor dos institutos africanos; eu desejo morrer antes de si, para o bem da África.


[6987]

Em qualquer caso, tudo acontece por adorável disposição de Deus; aceitemos, pois, de coração e ponhamos toda a nossa confiança n’Ele. E o senhor tenha coragem e avante, pois um dia cantaremos no Paraíso as glórias de Deus, porque, ainda que indignos, fez-nos instrumentos da salvação dos negros, que são as almas mais abandonadas do universo. A mim não me importam nada os falatórios que talvez já corram por Verona em desdouro e descrédito da minha dignidade, do meu carácter, e não me interessa que se pense ou se diga (contra a verdade) que tenho paixão por uma mulher, etc., como pensam certos vis campónios, etc., etc.: cupio anathema esse pro fratribus; amo pro nihilo reputari, etc. Só me importa (e essa foi a única e verdadeira paixão de toda a minha vida e sê-lo-á até à morte, e não coro por ela), só me importa, dizia, que se converta a Nigrícia e que Deus me conceda e conserve os instrumentos auxiliares que me deu e me há-de dar.


[6988]

Sabe o que me fizeram os jesuítas? Já lhe disse várias vezes que, quanto à santidade verdadeira e recta, delicadeza, desinteresse e puro espírito de Deus, o senhor vale mais que todas as ordens e congregações da Igreja de Deus e mesmo que os jesuítas, dos quais, não obstante, gosto, estimo e idolatro tanto. Veja o que me disse P.e Dichtl na presença de P.e Francisco, que estava na cama, quando lhes contei o desagradável assunto do belga Neefs, vindo do Cairo. Os jesuítas de lá convidaram várias vezes para sua casa P.e Francisco, P.e Dichtl e P.e José Ohrwalder, que agora está no Cordofão e, com palavras claras, propuseram-lhes que abandonassem o pobre D. Comboni, etc., e que se tornassem jesuítas, etc., etc. Mais ainda: quando o P.e Villeneuve veio dar aos nossos os exercícios, ao tocar o tema da escolha de estado, recomendou-lhes que examinassem uma possibilidade e outra, isto é, se deviam ser jesuítas ou missionários da África Central; e ao ponderar ambas as opções, pôs todas as razões do lado dos jesuítas. Então P.e Dichtl e P.e José responderam que a eles já não lhes competia fazer a eleição de estado, porque quando fizeram o juramento e foram ordenados subdiáconos titulo missionis, eles estavam certos da vocação da África e que não a trocariam na vida. E P.e Francisco manifestou que, desde o momento em que tinha pronunciado o seu juramento diante de D. Comboni, somente reconhecia D. Comboni como único intérprete da vontade de Deus sobre ele; que tinha uma ilimitada confiança em D. Comboni; que tinha recusado outros conselhos de homens santos que o queriam separar de D. Comboni e que D. Comboni era dono da sua vida e da sua morte, etc.


[6989]

Maldito mundo! E maldito egoísmo fradesco religioso! Tudo no mundo é engano, mentira e tentação. Não há nada firme e estável, excepto Cristo e a sua cruz.

Abençoo a todos, a P.e Luciano, ao convento feminino. Mil respeitosas saudações ao em.mo, ao rev.mo P.e Vignola (vale por cem jesuítas, aos quais, contudo estimo!) e a Bacilieri. E reze por

Seu indigníssimo

† Daniel bispo e vig. ap.


1113
P.e Zeferino Zitelli-Natali
0
Cartum
?. 08. 1881

N.o 1113; (1067) - A P.e ZEFERINO ZITELLI-NATALLI

AP SC Afr. C., v. 9, f. 157

Agosto ? de 1881

Breve bilhete.

1114
Card. João Simeoni
0
Cartum
03. 09. 1881

N.o 1114; (1068) - AO CARD. JOÃO SIMEONI

AP SC Afr. C., v. 9, ff. 171-191

N.o 15

Cartum, 3 de Setembro de 1881

Em.mo e Rev.mo Príncipe,

[6990]

P.e José Sembianti, reitor dos meus institutos africanos de Verona, comunicou-me recentemente que o senhor mandou que se dissesse a Virgínia Mansur, postulante oriental do meu Instituto das Pias Madres da Nigrícia, que não deve empreender por agora a viagem a África e que lhe mandou fazer de modo que essa ordem de V. Em.a fosse cumprida pontualmente. Embora eu saiba que a minha superiora principal da África Central, a Madre Teresa Grigolini, bem como a superiora de Cartum, Ir. Vitória Paganini, ambas mulheres de eminente virtude e prudência, e que conhecem muito bem as coisas, pediram humildemente ao em.mo de Canossa que permitisse a vinda de Virgínia para a África, da qual elas assumiriam toda a responsabilidade, convencidas que isso reverterá num grande bem para a missão (porque Virgínia vale por três, goza de saúde e está disposta a morrer, se for preciso, nestas letais regiões) e ela realizaria a sua vocação, contudo não sei em absoluto se Virgínia quereria vir este ano; antes, escreveu-me há pouco que, se os superiores responderem favoravelmente à petição da superiora provincial da África, desejaria ir primeiro a Beirute para tentar a conversão do seu irmão Abdala, que é cismático grego, porque a informaram da Síria que está doente há muitos meses e sem esperança de cura.


[6991]

Em qualquer caso, não se preocupe V. Em.a, que se cumprirá pontualmente a sua sábia e venerada ordem, e que se Deus determinar chamar a África essa infeliz mas virtuosíssima jovem, ela não virá senão com o consentimento e disposição de V. Em.a, meu venerado superior e chefe de todas as missões do mundo.


[6992]

Entretanto eu estou contente de que o em.mo de Canossa, como resulta da mencionada ordem que V. Em.a deu ao P.e Sembianti, pusesse o assunto de Virgínia nas suas mãos, porque, por detrás desta importante questão, surgem outras não menos importantes, que dizem respeito ao bem da minha obra e desejo que sejam conhecidas em Roma, nessa arca santa da justiça e da caridade, nesse oásis providencial, onde está refugiada a verdade, que difunde a mais refulgente luz no meio das escuras trevas do universo.


[6993]

Já há tempos que o meu coração sente a necessidade de se abrir a Vossa Eminência sobre certos pontos, para o maior bem da Nigrícia; mas eu sentia uma grande, invencível repugnância, por consideração para com o em.mo de Canossa, que, não obstante tudo, é um grande benfeitor meu, pelo poderoso apoio moral que me concedeu desde o princípio, em 1876, para fundar a obra, e sem o qual eu talvez não conseguisse fazer nada. Mas sendo esta a segunda vez que o mesmo em.mo me abre a brecha para entrar na Propaganda para dar conta de todos os meus actos, que dizem respeito unicamente à redenção da África, não devo coibir-me por respeito humano para com ninguém, porque antes de tudo deve estar Deus e os grandes interesses da sua glória.


[6994]

A primeira vez que soube que o em.mo de Canossa tinha aberto a brecha para a Propaganda, sem eu ter dado conta antes, porque ele nunca me tinha feito a mínima alusão, foi o ano passado, quando V. Em.a se dignou ordenar-me que livrasse a missão duma tal Virgínia que tinha sido despedida pelas Irmãs de S. José. Esse escrito chegou-me em 3 de Agosto a Ischl, onde estava a visitar o imperador da Áustria. E a 15 de Agosto recebia em Viena carta de Verona, na qual se me pedia que me encontrasse aí no dia 22 de Agosto para celebrar o pontifical e fazer a homilia de S. Zeno na sua grande basílica, porque o em.mo se encontrava indisposto. Eu estava muito longe de pensar que a ordem que V. Em.a me tinha dado, de mandar embora Virgínia, tivesse tido a sua origem em Verona e menos ainda no em.mo de Canossa.


[6995]

Fui a Verona e, no dia 22, depois de fazer o pontifical e a homilia que me tinham solicitado, apresentei-me ao em.mo. Falei-lhe da carta e da ordem recebida de V. Em.a e roguei-lhe que apoiasse Virgínia, depois de se informar dela junto da superiora, que conhecia bem a postulante que desejava ingressar no meu instituto, e que, depois, escrevesse a V. Em.a sobre isso. «Está bem – respondeu-me –, eu irei ao convento falar com a superiora e depois tratarei do que se refere ao card. Simeoni. O senhor fique tranquilo e siga em frente.» Então, abraçou-me e deu-me dois beijos dizendo: «Tenho-lhe muito afecto.» Eu fui para casa, onde encontrei uma áspera carta do em.mo de Canossa, escrita umas semanas antes, mas só então chegada às minhas mãos, na qual, entre outras coisas, me dizia que se arrependia de ter gasto seiscentas liras para ir a Roma em Julho de 1877 com o objectivo de conseguir que me fizessem bispo (!!!). Hei-de encontrar a carta e mandá-la-ei a Vossa Eminência.


[6996]

Desolado e choroso, volto a ir ter com o em.mo de Canossa e pergunto-lhe os motivos do seu arrependimento e daquela carta. Ao que ele, todo bondade e gentileza, me respondeu: «Nada, nada, eu irei falar com a superiora e escreverei a Simeoni: o senhor esteja calmo, e avante!» E abraçando-me e dando-me três ou quatro beijos, despediu-se, encarregando-me de algumas coisas para Roma. Só então entrevi que a ordem que me tinha dado V. Em.a a respeito de Virgínia tinha a sua origem em Verona. Oh, mas as cruzes dispostas por Deus são caras e veneráveis!


[6997]

Chegado a Roma e tendo-me apresentado a V. Em.a para falar sobre Virgínia e outras coisas, inteirei-me, por V. Em.a, de que o em.mo de Canossa tinha escrito de modo favorável sobre Virgínia, pelo que a ordem de a mandar embora já não era para executar. Eu calei-me e não pensei mais naquela pobre infeliz, assoberbado como estava com o trabalho que fiz sobre os quatro vicariatos da África Equatorial confiados a mons. Lavigerie e com os preparativos da minha partida para a África.


[6998]

Um dia antes de partir de Verona para a África, um bondoso leigo do meu instituto, que, contudo, foi um dos dois primeiros que se opuseram à vinda dos árabes para Verona, por não se sentir capaz de estudar o árabe (embora bondoso, é bastante fechado e teimoso, mas o meu reitor tem-no em muita estima), disse diante do meu serviçal Domingos Correia, a quem agora mandei regressar a Roma, pois doutro modo morria, e que vai entrar em contacto com o seu antigo amo, o em.mo Sanguigni para encontrar trabalho: «Agora que o bispo se vai para a África, em breve nos livraremos do professor e da professora árabes.» Eu não fiz caso disso, mas tudo se cumpriu.


[6999]

Entro de seguida na questão de Virgínia e, depois, falar-lhe-ei doutros assuntos, pelos quais V. Em.a compreenderá que se em Verona desde 1867, altura em que comecei a obra, tivesse havido até hoje um verdadeiro bispo, sério, firme, realista, sempre coerente consigo mesmo e generoso, como são Verzeri, de Brescia; Carsana, de Como; Scalabrini, de Placência; Zitelli, de Treviso, etc., a minha obra teria dado passos de gigante, as regras dos meus dois institutos fundamentais de Verona já teriam obtido a aprovação da Santa Sé, eu não me teria visto obrigado a afastar-me várias vezes do vicariato para pôr em ordem os meus institutos de Verona, etc., etc., e teria avançado já muito, sob a orientação da Propaganda, para a definitiva conquista para a fé da África Central.


[7000]

É-me muito doloroso pronunciar estas expressões desfavoráveis em relação ao em.mo de Canossa, que, por outro lado, tem tão belas e sublimes virtudes; ficaria feliz de me enganar no meu juízo, que nunca manifestaria a ninguém no mundo, excepto a V. Em.a, meu venerado e adorado superior, que sabe dar às palavras o peso justo e que, por participar em todos os assuntos da Igreja e viver em Roma – onde deve ser conhecido o excelente cardeal de Verona, especialmente no Santo Ofício, nos Ritos, no Concílio, etc. –, pode calcular o verdadeiro valor das minhas palavras e juízos. Não creia V. Em.a que, por me encontrar atrasado na obra, perco o ânimo. Não, eu nunca desanimarei, porque é obra de Deus e porque, embora eu seja um pobre bonifrate, um servus inutilis nas mãos de Deus, estou certo de que, com a graça de Deus, recuperarei o atraso e com a ajuda da Santa Sé levarei a obra tanto para a frente, que, antes de morrer, se a morte não me sobrevier demasiado cedo, a conquista da África Central para a fé chegará a bom porto.


[7001]

Em todos os assuntos, incluído o de Virgínia, prometo a V. Em.a obediência perfeita, mesmo que tivesse de morrer de dor e de perder a vida, porque desde a minha infância até hoje sempre quis e sempre quererei até à morte fazer a vontade de Deus e dos superiores; e eu ficaria mais contente de ser condenado à prisão perpétua e à morte sob o Papa, por parte da Igreja, minha senhora e mãe, do que ser rei e viver glorioso e honrado no mundo. Este maldito mundo está verdadeiramente totus positus in Maligno.


[7002]

Quanto a Virgínia, eis aqui a principal discrepância entre o em.mo de Canossa e mim. Ele diz que Virgínia é uma chaga para a missão, que nunca teve nem tem vocação religiosa, que é enigmática, volúvel e indigna de ser missionária na África, etc. Ao contrário, eu, submissamente, sou de opinião e digo precisamente o contrário; e se é certo que agora não mostra vocação (do que em Verona me não deram nenhum argumento válido, afirmando-o apenas gratuitamente sem o provar), Virgínia tê-la-á perdido pelas vexatórias disposições tomadas contra ela, sem me ouvirem e consultarem como deviam, sem me escutarem em nada (o que eu provarei claramente a V. E. com argumentos fortíssimos). Ao invés, colocada sob outra direcção, sem preconceitos, etc. contra a sua pessoa, Virgínia corrigir-se-á dos defeitos contraídos em dois anos de humilhações e sofrimentos padecidos na Itália, à sombra do meu instituto, e ficará contente e será imensamente útil para a minha obra sob a direcção das minhas admiráveis e santas Irmãs.


[7003]

Tenho que fazer ainda duas declarações que são a pura verdade.

A primeira é esta: não é o em.mo de Canossa que está contra Virgínia e que age nisto como noutras coisas, mas sim, segundo o meu parecer, é apenas o meu caro P.e Sembianti. Nisto como noutros assuntos, o em.mo de Canossa faz aquilo que lhe sugerem: um padre, um clérigo é capaz de o levar a fazer determinada coisa, porque quer bem e gosta de agradar. Em geral ou pelo menos em muitíssimos casos, o em.mo de Canossa dá razão a quem está perto dele, a quem o consegue abordar oportunamente, quando (como dizem os velhos párocos e nobres de Verona) não lhe dá a canossina, isto é, o mau humor causado por palpitações do coração, etc.


[7004]

A segunda verdade é que tanto o em.mo de Canossa como o meu reitor Sembianti na questão de Virgínia agem em consciência, movidos por um santo fim e procurando unicamente o bem da missão e o meu (creio, ao invés, que o bem dessa pobre infeliz e do seu irmão convertido, cuja abjuração perante mim, por ordem de S. Em.a, na bela igreja da sua congregação, o P.e Sembianti viu com bons olhos, não é para eles motivo de atenção, como se fosse algo de secundário). Devo dizer-lhe, por outro lado, que tenho em muita estima ao R. P.e Sembianti, embora seja casmurro como todos os santos, pessimista e escrupuloso em excesso, porque, além de ser um sacerdote pio e um homem de bem, me prepara muito bem o pessoal e, sem dúvida, mandará para a missão gente de óptimo espírito e disposta a morrer pela África. Todas estas discrepâncias são coisas dispostas por Deus, que fabricou a cruz para que a levemos; e Deus saberá tirar disso grande bem em favor da África e das almas de todos nós.


[7005]

Ora bem, quem é esta Virgínia? Aqui só vou tocar o assunto ao de leve, mas depois explicar-lhe-ei e provarei tudo, valendo-me exclusivamente da verdade. Ela é uma órfã destinada desde o seu nascimento a sofrer na Terra para depois gozar muito no Céu. Depois de ter visto com os seus próprios olhos o seu pai e irmão mais velho degolados na tremenda matança de cristãos ocorrida na Síria em 1860 e depois de ter visto queimadas as casas e quintas paternas, foi levada com seis anos de idade para Saïda pela superiora das Irmãs de S. José da Aparição, Ir. Emilienne Naubonnet. Esta, que morreu em Cartum em 1877, quando era minha superiora provincial, contou-me quanto lhe digo. Quando tinha já 15 anos, o bispo grego cismático e os parentes dela, também cismáticos, ajudados por um agente francês maçónico, tiraram-na do convento e levaram-na para Beirute, onde tentaram à força casá-la com um jovem cismático, que durante seis meses o teve sempre à sua volta. Mas ela manteve-se firme como uma coluna. E obrigada a permanecer em casa, com absoluta proibição de ir à igreja, de se confessar e comungar, porque a queriam fazer cismática, suportou este martírio durante seis meses. Finalmente, uma noite, vendo que ninguém a vigiava, fugiu e essa noite e todo o dia seguinte esteve a caminhar. Tinha já os pés a sangrar quando se encontrou com um maronita, que a levou a Saïda; e daí a mesma madre superiora passou-a sub-repticiamente para a França. Tendo terminado o noviciado no Convento de S. José de Marselha, foi mandada para Cartum, a pedido da superiora do mesmo, que me dizia que Virgínia (em religião Ir. Ana) Mansur valia por três Irmãs.


[7006]

Durante os seis anos que esteve no meu Vicariato teve um comportamento excelente e trabalhou mais que nenhuma outra. Teve o afecto e a estima das quatro superioras que lhe morreram nesses seis anos, mas foi muito odiada e perseguida – injustamente, como demonstrarei – por outras duas Irmãs não superioras. Quando em Cartum se baptizava solenemente oito ou dez raparigas que ela tinha instruído e preparado, enquanto para todas aquilo era uma festa, ela chorava e dizia: «Estou aqui a converter negros e, entretanto, deixo que possam perecer eternamente a minha mãe, os meus irmãos e irmãs, que são cismáticos.» Várias vezes pediu à minha provincial, a madre Emilienne (a mesma que em 1870 a tinha levado para França para se tornar religiosa), que lhe permitisse ir por alguns meses a sua casa, a Beirute, para converter a sua família. Mas aquela santa e boa madre respondia-lhe precisamente que a rev.ma madre geral nunca permitiria que ela voltasse, mesmo por pouco tempo, para junto de sua família, porque como as Irmãs de S. José a tinham levado de modo oculto para a França e a família não tinha voltado a ter notícias dela, «a Congregação de S. José na Síria poderia ficar em muito difícil situação perante os cismáticos». Isto foi um espinho no coração de Virgínia e a origem e primeira causa para ela começar a pensar em abandonar a sua congregação, que ela tanto amava, como, de facto, acabaria por fazer, movida por três razões principais, que direi mais adiante, porque se aproxima a hora de despachar o correio.


[7007]

É pois uma mentira dos de Verona dizerem que foi expulsa do seu instituto, porque, quando as Irmãs foram chamadas da África Central, ela tinha a obediência, que eu mesmo vi, para uma casa da congregação.

E eu não tive nada a ver com a sua decisão de deixar as Irmãs de S. José, porque às repetidas petições que me fez, de viva voz e por escrito, eu respondi-lhe sempre que não aconselharei nunca ninguém a deixar a sua congregação ou ordem e, por norma, não admitirei no meu instituto quem vier de outro.


[7008]

Entre as principais razões pelas quais abandonou a Congregação de S. José, cito-lhe só (para, depois, aduzir provas e documentos) as seguintes:

1.a Converter a sua família

2.a O facto de as Irmãs de S. José abandonarem a África Central, onde, diz ela, uma só casa de Irmãs converte mais gentios que todas as casas sírias juntas.

3.a O facto de ter sido horrivelmente maltratada por algumas companheiras suas e ter sabido que em casa das Pias Madres da Nigrícia há paz absoluta e um afecto fraternal entre as Irmãs.

4.a Finalmente, chegada ao Cairo, tendo pedido e obtido a obediência para ir para Marselha, disse e assegurou à madre geral que foi uma calúnia e uma mentira o que foi escrito à madre geral, ou seja, que D. Comboni tinha feito passar fome às Irmãs na África, porque «D. Comboni tratou as Irmãs melhor que a si mesmo e melhor que um pai: quando faltou a água no Cordofão, primeiro bebiam as Irmãs, depois os missionários, etc.».


[7009]

Foi no mês de Julho de 1879 que Virgínia deixou a Cong. de S. José e partiu para a Síria, com dor de muitas das suas companheiras. Portanto, esteve nas comunidades religiosas da congregação, fazendo muito bem, desde 1860 até mais de meados de 1879: portanto, quase vinte anos.


[7010]

Por conseguinte, digo que é uma proposição falsa e muito arriscada a do em.mo de Canossa e do P.e Sembianti, que escreveram que Virgínia nunca teve vocação religiosa, uma vez ela permaneceu 20 anos num insto., aprovado pela Igreja e tão benemérito das missões.

Dois meses depois da sua ida para Beirute, comunicou-me por carta que três membros da sua família estavam já dispostos a tornar-se católicos, mas que era necessário afastá-los de sua casa, que distava mais de duas horas da igreja católica mais próxima; e também que ela, acostumada à vida religiosa desde há vinte anos, estava a passar um purgatório ao ficar em sua casa, especialmente porque, para ir à missa, precisava de duas horas. Por isso perguntou-me:


[7011]

1.o Se eu a admitia entre as minhas Irmãs, disposta a tudo e especialmente a morrer na África e logo (e disso deu na África esplêndidas provas durante seis anos).

2.o Se a ajudava a colocar o seu irmão, a sua irmã e o seu primo Alexandre nalguma casa, onde se preparassem para abjurar.


[7012]

À primeira pergunta, sendo eu o fundador e chefe dos meus institutos e conhecendo quem se me oferecia e as necessidades da minha obra quanto a pessoal que dominasse o árabe, respondi afirmativamente, embora deixasse para mais tarde ponderar se devia mandá-la para um noviciado, quer em Verona com a superiora geral, quer na África com a superiora principal, Teresa Grigolini. Entretanto, disse-lhe que fizesse todo o possível por converter sua mãe.


[7013]

Quanto à segunda pergunta, tendo eu vivido o gozo do meu santo superior P.e Nicolau Mazza quando eu lhe levava para o insto. almas infiéis e protestantes para converter, respondi-lhe que receberia os seus três familiares nos meus institutos, tanto em Verona como no Cairo.

Detenho-me aqui e continuarei com o próximo correio a narração do resto, para terminar propondo-lhe submissamente uma pequena coisa. O em.mo cardeal de Canossa nunca me falou nem escreveu sobre Virgínia, nem nunca me pediu informações, explicações ou algo semelhante. Sempre agiu por sua conta, embora seguindo as sugestões de alguém não competente, com a relativa excepção do reitor que, ao fim e ao cabo, foi enganado por um tal Grieff, a quem logo mandou embora, e por dois camponeses.


[7014]

Ainda antes de o P.e Sembianti tomar o cargo de reitor, S. Em.a excluiu dos institutos Virgínia e os dois árabes, que eram uns anjos, sem me consultar, enquanto eu estava em Roma em Fevereiro de 1880 e mandou que ficassem isolados numa casita que tenho fora dos meus estabelecimentos, ordenando que não tivessem nenhum contacto com os institutos fora da hora em que, vigiados, davam a lição de árabe. Imagine-se o purgatório de Virgínia em tal isolamento, habituada como estava desde há vinte anos a viver em comunidade e numa comunidade tão animada e activa como a das Irmãs de S. José. Foi por isso que, ao cabo de alguns meses, a mandei para Sestri.


[7015]

Mas o em.mo de Canossa nas suas disposições a respeito de Virgínia não só não se dignou nunca consultar-me a mim, que certamente era juiz competente, como nem sequer consultou as superioras de Verona e de Sestri, antes de o ano passado escrever a V. Em.a para que me ordenasse livrar a missão de Virgínia, expulsa (sic) pelas Irmãs de São José. E prova disso é:

1.o Que tendo falado depois com a superiora de Verona, escreveu a V. Em.a em sentido contrário ou não conforme ao que tinha escrito antes.

2.o Demonstram-no também os dois documentos manuscritos que lhe junto, isto é, uma carta da minha superiora geral, a madre Maria Bollezzoli, que aprova o eminente espírito religioso de Virgínia (Anexo I) e outra da Ir. Matilde Corsi, superiora de Sestri, que faz o mesmo (Anexo II).


[7016]

Certamente julgará V. Em.a que o card. de Canossa, antes de lhe escrever esta vez a dizer tão mal de Virgínia para lhe rogar que desse ordem de que por agora ela não venha para a África, consultou a superiora de Verona sobre a conduta de Virgínia. Pois não foi assim, Em.mo Príncipe: ele mesmo me diz numa longa carta dirigida a mim em 27 de Maio passado (Anexo III, que enviarei com o próximo correio, porque tenho que fazer a cópia) que não consultou o reitor Sembianti (sic), nem a madre superiora geral. Eis as palavras textuais de Sua Eminência:

«Virgínia é uma chaga para a missão; é uma mulher turbada, caprichosa, volúvel, sem nenhuma vocação para a vida religiosa... e tal, que de onde ela saiu (Congregação de S. José) todos cantaram (sic), e se agora se fosse embora, todos cantariam o Te Deum, etc., etc.».


[7017]

Depois deste belo retrato, acrescenta: «Não creia que o P.e Sembianti ou a madre superiora me informaram disto; não, não me falaram absolutamente nada disso: nem sequer sabem que lhe escrevo... Mas por meias palavras recolhidas por outros aqui e ali (meu Deus!) e por P.e Tagliaferro, formei uma ideia dos factos, que força a julgar Virgínia deste modo.»

Ao contrário, a madre superiora de Verona nunca me deu más informações sobre Virgínia, mas sim boas; e há um mês escreveu-me a dizer que Virgínia é alegre, que todas as postulantes e noviças a respeitam, a amam e estimam, etc. Ora, se todos a respeitam e amam, como diz o em.mo que ela é uma chaga, etc.? Mais adiante mandar-lhe-ei as cartas da superiora, que encontrarei, porque agora, eminência, estou cansado, fatigado, cheio de achaques, uma vez que não consigo conciliar o sono, etc.


[7018]

Agora vou pedir-lhe uma graça, meu em.mo pai: tenho fundado receio de que os de Verona mandem Virgínia imediatamente para a Síria, para o meio dos cismáticos, com o perigo da perda da sua alma, como há dois meses fizeram com o seu irmão Jorge, a quem, sem o avisar previamente a ele nem a Virgínia, o conduziram a Trieste e o fizeram embarcar para a Síria.


[7019]

Por isso, uma vez que V. Em.a teve a bondade e prudência de ordenar a P.e Sembianti que diga a Virgínia que por agora não deve ir para a África, mande duas linhas ao mesmo Sembianti para «ordenar a Virgínia que permaneça no instituto na condição de postulante e isso até novas ordens de S. Eminência». O grau de postulante é o mais baixo no meu instituto e requer uma boa dose de humildade e abnegação por parte de Virgínia para permanecer aí, ao ver que outras chegadas depois dela lhe passam à frente e são admitidas ao noviciado. Mas ela tem essas virtudes.


[7020]

Eis a principal razão desta minha humilde petição:

Logo que o irmão e o primo de Virgínia e Bescir chegaram a Verona, os dois camponeses e Grieff, que tanta influência tinham sobre o meu bom P.e Sembianti, que acreditava neles cem vezes mais que em mim, foram repetindo por meses e meses que aqueles árabes nunca se tornariam católicos. Estes suportaram as maiores humilhações, injúrias, a negação da saudação e a sua expulsão da comunidade, mais o afastamento da mesma, como lhe disse mais acima e tudo isso com uma paciência heróica. Finalmente, desesperando de os converter em Verona, mandei Alexandre, primo de Virgínia, e Bescir para Roma, ao P.e Dionísio Sauaia, para que me ajudasse a fazê-los católicos. O bom P.e Dionísio, que vive na Via Frattina 17 e é procurador dos monges gregos do monte Líbano, ocupou-se deles. Em poucas palavras: fale V. Em.a com o P.e Sauaia e ele dir-lhe-á quão bons foram esses dois orientais. Um deles abjurou ante Mons. Sallua; ao outro baptizou-o um bispo após o catecumenato e depois levei-o eu para o Cairo.


[7021]

O P.e Sembianti, admirado do que se tinha feito em Roma, teve a bondade de levar Jorge, o irmão de Virgínia, aos padres da sua santa congregação; e, depois de vários dias de exame, tendo encontrado nele elevados sentimentos de fé católica, decidiram que Jorge merecia fazer já a abjuração. E, por ordem de Sua Em.a, pronunciou-a perante mim, na própria igreja dos padres bertonianos, num acto comovedor, a que assistiu o rev.mo P.e geral.


[7022]

O P.e Sembianti gostava muito do Jorge e levava-o com frequência ao seu instituto, etc. Mas que aconteceu depois?

Antes de eu partir para o Cordofão, recebi uma carta de P.e Sembianti, na qual me dizia que, seguindo o conselho de S. Em.a e dos habituais conselheiros (que são homens muito piedosos), «meti Jorge num carro e com ele fui a S. Martinho. Aí apanhámos o comboio e, chegados a Trieste, fi-lo embarcar no Lloyd para a Síria. Mas Virgínia não sabe ainda nada, nem sequer o imagina; amanhã vou-lho dizer e verei o que diz. Tive que o fazer pelo bem do instituto, por prudência e seguindo o conselho de S. Em.a, etc.».


[7023]

Eu admito, embora não o saiba, que tenham feito assim pelos mais justos e santos motivos. Mas V. Em.a conceder-me-á que se pode desculpar Virgínia se, ao dar-lhe tal notícia, ficou perturbada e respondeu com arrogância. Eu teria reagido pior.

«No dia seguinte – escreve-me Sembianti – fui ao locutório e, chamada Virgínia à presença da superiora, comuniquei-lhe friamente que tinha embarcado o seu irmão em Trieste, em direcção à Síria e que, por motivos de prudência, o em.mo de Canossa não tinha julgado conveniente avisá-la e que tinha de se resignar, etc.». Virgínia, atónita, não podia acreditar e perguntou-lhe o que é que Jorge tinha feito de mal, etc., etc. Depois do que, diz Sembianti, ela acrescentou que queria partir, que não queria continuar submetida ao seu mandato, etc., etc. Depois, ele transmitiu-me aquelas respostas, etc. O P.e Sembianti julga em consciência que Virgínia não tem vocação, nem paciência, que está inquieta, etc. Mas a madre superiora disse-me numa carta dois dias depois que ela chorava, sim, mas que estava tranquila e deixou de se queixar do P.e Sembianti, a quem tinha dito que não tinha coração, e que se lhe tivesse permitido falar primeiro com o seu irmão, tê-lo-ia corrigido e ele teria pedido perdão, etc. Mas com o P.e Sembianti foi tudo inútil.


[7024]

Eu irei mandar-lhe as duas cartas escritas pelo punho e letra do P.e Sembianti, pelas quais julgará V. Em.a. Mas, entretanto, não considera que Virgínia teve razão para se afligir, ao ver arrancar do seu lado um irmão, sem oportunidade de lhe dizer adeus e sabê-lo enviado para a Síria, para o meio dos cismáticos, com o perigo de perder a fé, pelo tratamento pouco bom recebido em Verona; um irmão pelo qual ela chorou tantos anos na África e que lhe custou tantos sacrifícios, como o ter deixado a sua congregação para converter o Jorge e os seus outros familiares?


[7025]

Esta é a verdade. Portanto, suplico a V. Em.a que escreva a Verona no sentido que lhe disse.

Por outro lado, o P.e Sembianti retirou de Sestri as Irmãs e o instituto (tinha mil razões, que eu aprovo, pela mudança do Tagliaferro, o qual, dizem, não se confessa há trinta anos e anda vestido como um camponês secular e porque Virgínia, como verdadeira missionária, exortou duas vezes Tagliaferro a vestir de sacerdote em honra do monsenhor [de mim] e a pôr-se em ordem com Deus para ir para o Paraíso; Tagliaferro disse-me que Virgínia era uma intriguista: não é estranho, pois, que ele falasse mal de Virgínia ao em.mo de Canossa, o qual, como disse mais acima, cita Tagliaferro como fonte pela qual S. Em.a a julga a ela tão mal) e à uma da madrugada partiu com as Irmãs, sem se despedir e sem ter avisado o dono da casa. Não é que eu trate de exprimir um juízo negativo, mas, em geral, estes sistemas de prudência não me agradam. Beijo a sagrada púrpura, etc.



Seu hum.mo, obed.mo, devot.mo filho

† Daniel Comboni bispo e vig. ap.

Segue o Anexo I


1115
Principe de Teano
0
Cartum
03. 09. 1881

N.o 1115; (1069) - AO PRÍNCIPE DE TEANO

ASGIR, v. IV (18700), Esplorazioni e Spedizioni, c. 4


Cartum, 3 de Setembro de 1881

Excelentíssimo príncipe,

[7026]

Peço-lhe desculpa pela demora em agradecer a V. E. e aos honoráveis senhores o comendador Malvano, o prof. Dalla Vedova e a todos os membros do conselho da Sociedade Geográfica Italiana, pela honra de que me fizeram objecto ao nomear-me sócio-correspondente dessa ilustre Sociedade a que V. E. com tanta inteligência preside. O documento com a carta que o acompanhava foi-me entregue só pouco antes de partir desta capital para a visita às missões do interior. E antes de lhe dar resposta desejava oferecer-lhe uma demonstração prática de que sou membro correspondente dessa ínclita Sociedade não só de nome, mas também de facto.


[7027]

Por isso, tendo efectuado com vários dos meus missionários uma importante exploração pelos montes de Dar-Nuba, para organizar e ampliar aí as missões católicas e, além disso, para acabar de vez com o infame tráfico de escravos, graças à poderosa ajuda e aberta, leal vontade de S. A. o quedive e do seu digno representante Rauf Paxá, governador-geral do Sudão, os quais me prestaram todo o seu apoio, apresso-me a enviar a V. E. uma cópia do mapa que, depois de diligentes observações, tracei com os meus missionários e que é muito exacto. Tenha, além disso, a certeza de que, quando eu dispuser de um pouco de tempo livre, escrever-lhe-ei a correspondente informação sobre aquelas interessantíssimas populações que, com a divina ajuda e um bom número de missionários e Irmãs veroneses, depois de enormes dificuldades, iniciei a instruir e civilizar.


[7028]

Confio em que dentro de um ano seja um facto consumado a total abolição do tráfico de escravos em Dar-Nuba, que todos os anos dizimava aquelas nobres e infelizes populações. Espero igualmente que se leve a cabo a proposta que fiz ao prudentíssimo e na verdade excelente governador-geral, de segregar da jurisdição do Cordofão os ditos montes dependentes dela e constituir uma nova província, chamada Dar-Nuba, que se estenda desde Birkat el-Koli, a 12o de lat. norte, até ao Bahar-el-Arab e o Bahar-el-Ghazal e seja dirigida por um mudir ou governador europeu. Tenho também a esperança de que a boa vontade de S. A. o quedive e a sabedoria dos seus ministros produza dentro de não muito a concessão da permissão para um caminho de ferro que una o mar Vermelho e o Nilo em Cartum, havendo quem toma a seu cargo o financiamento da empresa. Rauf Paxá é entusiasta do mesmo e sabe explicar sabiamente as vantagens materiais que derivarão dele para o Sudão e para o Egipto e muito mais as morais, entre as quais não figura em último lugar o axioma: «Via férrea no Sudão é igual a abolição definitiva da escravatura.»


[7029]

Para além de outros trabalhos, preparámos com indizível esforço um dicionário – que em breve publicarei – de mais de três mil palavras da interessante língua de Dar-Nuba, a qual é totalmente desconhecida para a ciência. Só quem tem experiência disso, por o ter tentado, pode compreender as enormes dificuldades que há em tirar uma língua desconhecida dos lábios dos indígenas, entre os quais há um outro que sabe um pouco de árabe, mas muito mal. Eu vivi isso em 1858-59 quando, encontrando-me na tribo dos Kich com P.e Beltrame e com P.e Melotto (de saudosa memória) na estação de Santa Cruz, à frente da qual estava o mui sábio tirolês P.e José Lanz (que morreu em Cartum em 1860), juntos conseguimos compor, com enorme trabalho e estudo, um dicionário, uma gramática e um não breve tratado de religião na língua dos Dinca, que depois (tendo nós mandado os manuscritos para Bressanone) foram publicados pelo douto professor Mitterrutzner e, mais tarde, pelo excelente P.e Beltrame.


[7030]

Dentro de pouco publicarei um importante volume manuscrito de P.e José Lanz, com quem P.e Beltrame e eu vivemos mais de um ano na tribo dos Kich e estudámos juntos o dinca. O livro em questão, que encontrei nesta biblioteca, consiste num longo catecismo, bastantes discursos em dinca dirigidos àquelas gentes e outro trabalho que fizemos juntos nessa mesma língua e que pode servir de ajuda aos missionários que dentro de pouco destinarei àqueles povos, onde pretendo fundar novas missões, estabelecendo missionários, Irmãs e artesãos leigos. Quando fundei a estação de Delen no Dar-Nuba, todos os nativos, homens e mulheres, trajavam à moda de Adão e Eva. Nós introduzimos – especialmente os meus bons missionários P.e Luís Bonommi, de Verona, o superior, e P.e João Losi, de Placência, que tem o principal mérito do dicionário nuba – o costume de lhes comprarmos o necessário para comer pagando com pedaços de tecido; assim, na visita que agora fiz por esses países, verifiquei que uma parte da população em Dordor anda vestida fora das suas cabanas. Contudo não há em Dar-Nuba nenhum chefe indígena, nem homens, nem mulheres, que andem vestidos, mas literalmente nus.


[7031]

Alegro-me muito do feliz resultado da longa viagem, única nessa direcção, numa parte, que realizaram o dr. Matteucci e Massari, os quais chegaram à Guiné e agora estarão já de volta na Itália. Isto redunda em grande honra, depois dos descalabros sofridos com a expedição de Antinori e com o infeliz Giulietti.

Disponham de mim V. E. e essa ilustre Sociedade, naquilo que puder resultar realmente útil para a ciência e a autêntica civilização na África Central, porque a divisa da minha árdua e laboriosa obra, que com tantos suores fundei, é: religião católica e civilização cristã, como pode ver por um opúsculo que redigi em oito dias em Sestri Levante. Esse opúsculo, que fiz publicar em Verona antes de abandonar a Europa em Setembro passado, sem ter podido supervisionar a impressão (contém erros tipográficos), intitula-se: Quadro Histórico dos Descobrimentos em África e permito-me mandá-lo a V. E.


[7032]

Para além deste opúsculo, mando-lhe outro em alemão, que publiquei em Viena e que compreende uma breve resenha sobre a história do Vicariato Apostólico da África Central, desde a sua fundação até à minha nomeação como primeiro bispo e vigário apostólico da África Central em 1877. Junto com estes dois opúsculos mando-lhe um terceiro e o n.o 25 dos Anais do Bom Pastor, que fundei em Verona, no qual está uma carta de S. E. Rauf Paxá. Nela me encarrega de estudar a questão da escravidão no Dar-Nuba e propor-lhe os remédios oportunos; algo que levei a cabo à letra e com utilidade, uma vez que o governador-geral adoptou as minhas propostas, como verá pela breve informação que lhe enviarei quando o fizer, se recobrar as forças.


[7033]

Desejaria que a fim de eu poder mandar a V. E. relatórios para a sua possível aparição nas publicações dessa ilustre sociedade com o devido conhecimento das mesmas, se dignasse mandar-me enviar para Cartum, minha residência provincial, o boletim da sociedade, do que lhe ficaria muito grato.

Honro-me em me declarar com o mais profundo respeito

De V. E. devot.mo e verdadeiro servidor

† Daniel Comboni bispo


1116
Seu pai
0
Cartum
06. 09. 1881

N.o 1116; (1070) - A SEU PAI

AFC

Cartum, 6 de Setembro de 1881

Querido pai,

[7034]

Esta noite, às três, celebrei missa no meu salão (não dormindo quase nada). Como pela manhã não tenho forças nem para a celebrar nem para assistir, celebro-a depois da meia-noite, altura em que sinto forças, nos meus aposentos. E a missa desta noite foi por ti, para comemorar os 78 anos desde que vieste ao mundo a armar imbróglios e a servir de intriga para os outros.

Rezei para que Deus te santifique e te dê muitas graças espirituais que assegurem o grande negócio da tua alma.

Não rezei nenhuma oração para que te prolongue os anos, porque isso é demasiado terreno e mundano, embora eu tivesse imenso gosto que vivesses até aos cem anos, se isso contribuísse para te aumentar a graça e os méritos.

Se não for por isso, para que serve este mundo sujo?


[7035]

Rezo, ao invés, muito para que prolongue a vida a quem vive mal, longe da graça de Deus, para que deus lhe conceda tempo de penitência, ao menos quando o mundo estiver cansado dele e não souber que fazer.

Rogo pelos nossos parentes, porque têm família, etc.; porém, nem por ti nem por mim me incomodo nada a rogar pela vida.

Devemos pedir, em vez disso, para salvarmos muitas almas e não irmos sozinhos para o Céu, mas com uma multidão de convertidos.


[7036]

Há mais de duas semanas partiu P.e Vicente Marzano e, com ele, Domingos, meu camareiro, que antes foi visitar as Irmãs e a superiora e, chorando, lhes disse: por favor, recomendo-vos o monsenhor, pobrezinho, que não tem ninguém que cuide dele, etc., etc.

Para te dizer mesmo a verdade, depois da partida de Domingos, tomei como camareiro José, aquele toscano alto, etc., a quem conheceste em Verona e que me veio de Placência, embora seja da Toscana. Trata-se de um homem excelente que vale cem vezes mais que Domingos, porque, além de me servir dez vezes melhor e com mais habilidade que ele, não me enfada com tagarelices e maluqueiras como costumava Domingos, mas trabalha, mexe-se, faz e cala-se; e é um modelo de gentileza, tem-me afecto e respeito, etc.: em suma, um serviçal digno de um bispo.

Ainda por cima este não bebe, enquanto Domingos, bebendo às escondidas, mentindo por de mais, etc., etc. era para mim causa de desonra, até ao ponto de me ter envergonhado dele várias vezes em Verona, em Roma, na África.


[7037]

Oh, quão mais contente eu agora estou! E mais contentes estão ainda todos os missionários e as Irmãs. Mas ao Domingos mandei-o para a Europa com toda a simpatia e amabilidade, porque, com a sua língua comprida e a sua falta de vergonha, teria podido prejudicar em Roma alguns missionários e especialmente P.e Luís, que se opôs a que ele viesse a Gebel Nuba, pois seriam precisos dois criados só para o Domingos. Agora em Roma está em plena paz comigo e com todos e quer escrever-te e ir ver-te (não tem dinheiro, pelo que não irá); ele olha tudo o que me pertence como se fosse seu.


[7038]

Mas eu agradeço ao Céu por se ter ido. José, ao contrário, não só não me deu nem uma vez motivo de aborrecimento, mas até suscita o meu respeito ao vê-lo tão gentil, atento e modesto. Além disso, José está sempre disposto a prestar serviços a todos, pelo que todos os missionários estão entusiasmados com ele.

Dá saudações minhas aos nossos parentes que, certamente, irão em Outubro de Milão e da Suíça a Limone. Lembranças também ao Pedro e sua mulher, aos de Riva, a Teresa e Faustino, etc.

Teu af.mo filho

† Daniel bispo

P. S. Domingos foi-se pensando que eu ficava desolado com a sua partida.


1117
P.e José Sembianti
0
Cartum
06. 09. 1881

N.o 1117; (1071) - AO P.e JOSÉ SEMBIANTI

ACR, A, c. 15/134

N.o 35

Cartum, 6 de Setembro de 1881

Meu caro padre,

[7039]

Na sua carta de 11 de Junho, a n.o 30, o senhor escrevia-me: «Não quero terminar esta carta sem exprimir a V. E. rev.ma um receio que tenho e consiste em que as Irmãs de África possam ser submetidas a uma pressão tão penosa quão injustificada para que mostrem vontade de ter Virgínia no Vicariato. Eu não sei nada; mas o passado faz-me temer o futuro e poderia acontecer que tivéssemos umas vítimas emudecidas», etc.


[7040]

Como é algo completamente alheio à verdade que no passado eu tenha pressionado alguma Irmã ou superiora das Pias Madres da Nigrícia (e esta é uma de tantas afirmações falsas que se encontram nas cartas que o senhor me escreve desde há três meses em relação à pobre e desventurada Virgínia) e, dado que estando em África não posso chamar à sua presença essas Irmãs de Verona, sobre as quais o senhor afirma que eu exerci pressão, para lhe dar a conhecer quanto se refere às Irmãs de África (porque para o bem da obra interessa-me que entre si e mim haja a mais sincera, franca e verdadeira estima recíproca, para se poderem alcançar mais facilmente os objectivos pelos quais trabalhamos), desde o momento em que recebi a sua carta no Cordofão decidi mandar a Verona a Ir. Teresa Grigolini, a fim de que, colocada sob a sua influência, o senhor tenha a oportunidade de averiguar e de se persuadir de que jamais fiz pressão alguma, porque eu sou o mais interessado em que as coisas vão bem e que as Irmãs não sejam vítimas de ninguém, e menos de mim, que sou o seu primeiro pai e mestre e seu fundador. Além disso, escolhi esta santa Irmã, que, sem dúvida, é o primeiro e mais perfeito modelo da verdadeira Irmã filha da caridade para os necessitados da África Central, porque agora está reduzida a metade do que era e precisa de um pouco de descanso; e recaiu nela a minha escolha, embora isso possa vir a causar-me os maiores sacrifícios, também porque, no dizer dos missionários que a conhecem e da Ir. Vitória, que a admira, constitui o mais forte apoio da África Central, para além do meu alívio e conforto, porque é uma alma toda de Deus.


[7041]

Depois, quando li na sua carta n.o 35, de 24 de Julho: «Há que assinalar que a madre (de Verona) não tem já nem a energia, nem a capacidade de resistência de antes; precisa da ajuda de alguém que a substitua nalgumas funções, etc., etc.», fiquei mais firme na sua decisão; e já escrevi para o Cordofão, à M. Grigolini, a dizer-lhe que se prepare para vir para Cartum depois do kharif e a ordenar-lhe que avise em meu nome a que deve substituí-la. Na sua viagem para o Cairo farei com que vá devidamente acompanhada e não terá problemas. Estou certo de que a sua ida a Verona por alguns meses fará bem à obra, ao instituto e sobretudo à superiora que, durante esse tempo, poderá gozar de um repouso total, ir às termas, etc. Chegará a Itália na próxima Primavera.


[7042]

Ao ler depois na carta de S. Em.a à Ir. Vitória que ela tinha pedido submissamente a vinda de Virgínia por pressão alheia (ou seja, minha), então decidi mandar a madre Grigolini também a Roma, para dar conta à Propaganda do apostolado das Pias Madres da Nigrícia, a fim de que se saiba lá como são as coisas na África Central, e dar uma resposta clara ao cardeal Simeoni sobre se eu faço pressão sobre as Irmãs, no caso de o cardeal de Canossa ter dito à Propaganda que eu as pressiono e as converto em vítimas.

Por outro lado, interessa-me mandar a M. Grigolini ao Cairo para que decida sobre a vocação de uma postulante nascida no Egipto e que nos foi oferecida (!) pelas Irmãs Franciscanas (!), bem como para que examine o estado de saúde das nossas Irmãs daí e veja quem é que posso mandar vir para a África Central.


[7043]

Brown escreveu-me de Malta a dizer-me que, antes de ele abandonar Roma, preparou e separou 400 libras esterlinas (10 000 francos), que eu lhe tinha pedido, para que mas entregasse o seu filho, e que não é culpa sua (do velho) se o seu filho, o cav. José Brown, mas não deu. E que, além disso, o encarregou de me entregar a mim ou aos meus encarregados um magnífico anel de Pio IX com a autenticação de mons. Ricci (certificado que eu vi, assim como o anel, que Brown avaliava em 20 000 francos); mas não mo entregou. Incluo-lhe aqui o bilhete que Brown escreveu para Roma a seu filho, e a carta que me dirigiu a mim; e solicitaria a sua bondade de se aconselhar com o dr. cde. Teod. Ravignani, para ver se se pode meter uma causa a José Brown por reter o que me é devido.


[7044]

Com tal objectivo escrevo ao velho Brown em italiano, porque o entende o senhor e também Brown, convidando-o a fazer-me uma declaração legal do modo que lhe indicar o P.e Sembianti, meu procurador, e a mandá-la de Malta directamente para si. Para o ajudar em Roma, ou para os assuntos em inglês, ou para fazer falar Brown filho, recorra a mons. António Grasselli, arcebispo de Colossi i.p.i. e secretário da Sag. Congr. da Visita Apostólica, que habita no Colégio Grego, Via Babbuino, Roma, e que conhece bem S. Em.a, bem como todos os Brown, e para o qual lhe junto um bilhete.

Eis a tradução do bilhete que de Malta Brown pai escreveu para Roma ao filho.



Anexo I

(do inglês:) «Malta, 22 de Julho de 1881

Sr. José Brown Júnior,

131 Via Rasella, Roma



Como me parece que não pagaste a D. Comboni o dinheiro que preparei e destinei para ele antes de partir de Roma, peço-te que lhe dês a ele ou a quem ele designar o anel precioso (de grande valor) de Pio IX com os documentos de autenticidade que te deixei, ou o dinheiro equivalente, se é que foi vendido.

H. G. Brown»



O mesmo velho Brown escreveu-me depois uma longa carta, Anexo II, da qual extraio os seguintes fragmentos:

42 Cathedal Street

Sliema – Malta

22 de Julho de 1881


[7045]

«O senhor acusa-me de premeditação! Pois eu posso provar-lhe que dias antes de deixar Roma eu preparei e pus de lado para si as 400 libras esterlinas que me tinha pedido e estavam à sua disposição, etc... Isto, quanto à premeditação (!!!) de que me acusa. Estou muito surpreendido por o José lhe ter dito que lhe reservei as 400 libras em Nápoles, quando ele sabia bem que eu tinha entrado em acção logo depois de receber o seu aviso... (na realidade ele falhou em muitas coisas, etc. e tratou-me indignamente). José (o filho) foi a nossa ruína, etc., etc.


[7046]

O anel de grande valor de Pio IX, que sempre esperei se pudesse vender (tinha-me encarregado a mim disso, mas não encontrei quem o comprasse; e não me deixou o anel, mas só um anúncio impresso), tinha um valor intrínseco de 2000 fr.; mas, com o documento de autenticidade que o acompanhava, podia ter o valor de mais de 20 000 e, dizia-se, até mesmo mais de vinte mil liras. Este anel sempre lhe esteve destinado e agora junto-lhe uma ordem de entrega com esse fim, embora tema que não consiga recuperá-lo dele.»


[7047]

Pense nisso e aconselhe-se com Ravignani para arrancar também o anel a esse ladrão (tenho direito de chamar assim ao cav. Brown filho em Roma, por tudo o que nessa carta me conta o seu pobre pai, a quem escreverei em melhores termos daqui em diante).

Para além de mons. Grasselli (que lhe pode ser útil para o inglês, etc.), recorra, se for preciso, a quem dei poderes para recuperar o saldo a meu favor que eu tinha com Brown e só arrancou 5% dos 13 000 francos que encontraram registados nos livros do velho, isto é, ao cav. Luís Pelagallo, uma pessoa excelente que vive em Roma, Via Capo le Case 9, 4.o piso.


[7048]

Mas o velho escreve-me ainda na sua carta que em Agosto não recebeu de mim nenhum dinheiro para depósito. Realmente eu mandei-lho a ele, mas em Agosto tratou-se sempre com o filho, também para a expedição, etc. Contudo, vejo pelos meus livros e recordo com certeza que em Agosto fiz esse envio para Roma, a Brown (talvez o tenha recebido o filho e não disse nada ao pai).


[7049]

De Viena, no dia 7 de Agosto de 1880, mandei a Brown uma letra cambial de Lião (Vve. Guerin et fils à Lyon, compte n. 335, Mandat 393) de 12 000 francos ouro. Mandei-a; mas, como digo, então tratava-se com o filho, o qual me escreveu relativamente à ordem do envio de 5000 francos a Giulianelli, dizendo-me que como não sabia se este nome era com G ou com J, não tinha podido enviar a letra (gatuno). Em suma, em mando-lhe tudo a si e estou certo de que algo se tirará para bem dos institutos de Verona. Ah, o anel de Pio IX! A mim pouco me importa, mas os príncipes pagá-lo-iam muito bem.


[7050]

Queria enviar a S. Em.a as cinco grandes folhas que são a continuação das quatro que lhe remeti de El-Obeid em resposta e justificação relativamente à sua carta de 26 e 27 de Maio passado, de Verona e de Monteforte; mas agora que o em.mo meteu ao barulho o card. Simeoni, já não vale a pena mandá-las para Verona, onde eu seria escutado tanto como até agora, ou seja, nada. Por isso retenho-as com intenção de as utilizar para Roma, se o em.mo Simeoni me escrever sobre a questão.

É uma coisa total e absolutamente contrária à verdade que o arcipreste de Sestri me tenha falado claro sobre a vocação de Virgínia e escrevi-lhe imediatamente pedindo-lhe que me explicasse o que pretendeu ter-me dito. Nunca me falou nem bem nem mal de Virgínia e em Sestri não se tratava de vocação; mas a pobre da Virgínia lá teve desgostos com a sua irmã, que fugiu várias vezes do convento, tendo Virgínia que correr atrás dela. Aproveitando este correio, vou escrever de novo àquele arcebispo, para lhe dizer que é mentira que ele me tenha falado de Virgínia e muito menos de vocação.


[7051]

Termino esta carta com um episódio do grande Pio, em que participei em Roma.

Em 1864, encontrando-me em Roma, depois da beatificação de Alacoque, o em.mo Barnabó (de saud. mem.) encarregou-me de ir ao Colégio de Catecúmenos (onde foi instruído Bescir) procurar um jovem de Damasco convertido do Islamismo (hoje é um rico lorde que vive em Londres), o qual já tinha recebido o baptismo, para o apresentar ao Papa Pio IX. Vou aos Catecúmenos e encontro também aí aquele pobre sapateirinho judeu de 10 anos, que em Damasco tinha recebido o baptismo com ele. O reitor do colégio e eu entrámos com os dois afortunados convertidos no carro de mons. Jacobini, que então era o prelado chefe dos Catecúmenos e hoje é card. secretário de Estado de Leão XIII, e fomos ter com o Papa. Voltámos e mons. Jacobini conduziu-me à Propaganda, onde devia informar o em.mo cardeal-prefeito. Nesta circunstância conheci bem o sapateirinho do gueto, muito mais tosco e menos educado que os nossos sapateiros de aldeia, mas feliz por se ter tornado cristão.


[7052]

No domingo seguinte, em Outubro, encontrava-me eu como convidado num jantar que dava o conde Sartiges, embaixador da França na Santa Sé, em companhia do barão Visconti, comissário das Antiguidades, e de mons. Place então auditor da S. Rota Romana, depois bispo de Marselha e hoje arcebispo de Rennes. O embaixador contou-nos que, por encargo do imperador Napoleão III, ele tinha estado no dia anterior a visitar Pio IX, para lhe comunicar a vontade do imperador de que Sua Santidade entregasse o sapateirinho baptizado a seus pais judeus e que o Papa tinha respondido com um não rotundo e decisivo. «Que loucura – exclamou o conde de Sartiges –, que estupidez, que fanatismo por parte do Papa, negar ao imperador tão pequena coisa! Um sapateiro! Isso é de mais! Negar ao imperador dos franceses tal insignificância! Isso não está bem: isso não é política», etc.


[7053]

Depois de o comendador Visconti e mons. Place terem falado e respondido para justificar o Papa, o embaixador dirigiu-se a mim e disse-me: «Et vous, mon cher abbé, que pensez-vous? Vous n’auriez pas fait aussi». «Peço-lhe perdão, meu caro embaixador – respondi –, mas não vê que o Papa é um perfeito imitador de Jesus Cristo, que teria derramado todo o seu sangue por uma só alma? Não vê o estupendo espectáculo de um Papa que dá ao mundo uma esplêndida lição do que custa uma alma, pela qual morreu o Divino Redentor? A mim, ao invés, parece-me distinguir neste acto sublime do Sumo Pontífice a formosura da nossa santa fé. Sim, que a maior autoridade da Terra negue ao mais poderoso imperador do mundo algo como a entrega a um sapateiro judeu do seu pobre filho convertido, é um espectáculo verdadeiramente sublime e digno da admiração do universo. Esta surpreendente coragem de Pio IX ao rejeitar a petição de Napoleão III para entregar um sapateirinho mostra a grandeza de ânimo, o zelo apostólico e a caridade sobre-humana do maior Papa da idade moderna, ao qual eu admiro, e torna verdadeiramente sublime Pio IX.»


[7054]

«Oh, o senhor é um poeta, meu caro amigo», disse-me sorrindo o embaixador; e os outros aplaudiram a minha resposta.

Pode deduzir disto, meu caro reitor, que, em Roma, Virgínia, embora infeliz e insignificante, encontrará maior caridade que a que encontrou em certos lugares do mundo.

Rogue por mim, enquanto o abençoo de coração, bem como aos institutos.

Seu af.mo † Daniel bispo


1118
P.e José Sembianti
0
Cartum
10. 09. 1881

N.o 1118; (1072) - AO P.e JOSÉ SEMBIANTI

ACR, A, c. 15/135

N.o 36

Cartum, 10 de Setembro de 1881

Meu caro padre,

[7055]

Leia primeiro a carta que escrevo a P.e Rolleri e assim poupo-me a explicar-lhe os motivos pelos quais deixei que P.e Rolleri fosse para a Europa. Isto é em resposta ao que o senhor me dizia de que podia retê-lo em Cartum como administrador (sobre Rolleri e sobre a sua saúde não posso fazer cálculos positivos).

Mando-lhe diversas cartas de Sestri, mais o anúncio de Brown relativo ao anel de Pio IX, que ele me encarregou de vender (só com a etiqueta – ele guardou o anel) a algum príncipe; mas em Viena eu não tive tempo de o mostrar a ninguém.


[7056]

Mando junto cartas de Properzi, testemunha das promessas de Tagliaferro, e do próprio Tagliaferro. Fique com os 6300 fr. de Paris. O correio parte. Até ao próximo.

Recebi a magnífica colcha de Virgínia, que demorou 32 dias a ser trazida de Berber até Cartum. As Irmãs ficaram encantadas e disseram que a colcha era digna de ser oferecida ao grande paxá.

Abençoo a todos/as.

Seu af.mo † Daniel bispo


1119
P.e Francisco Giulianelli
0
Cartum
13. 09. 1881

N.o 1119; (1073) - A P.e FRANCISCO GIULIANELLI

ACR, A, c. 15/32

Cartum, 13 de Setembro de 1881

Meu caro P.e Francisco,

[7057]

Repito-lhe o que lhe disse na minha última, n.o 1, de 16 do corrente, ou seja, que o nomeei procurador-geral com plena liberdade de pôr e dispor dos fundos confiados à sua consciência, de fazer compras quando as julgar necessárias para a obra, etc., recomendando-lhe a mais conscienciosa economia.

Recebi as suas de 10, 15 e 22 de Agosto, com a prestação de contas do mês de Julho tudo em ordem.

Pouco a pouco ir-lhe-ei mandando nota de todas as receitas entradas no presente ano e que não passaram pelas suas mãos, para fazer o respectivo registo no livro da administração geral.


[7058]

A partir de agora e para o que resta do ano, não mande mais dinheiro ao P.e Sembianti, porque com o que tem em seu poder e o que receberá tem o suficiente para os institutos de Verona para o corrente ano.

O dinheiro que o senhor receber, uma vez atendidas as estritas necessidades do Cairo, guarde-o à espera de ordens minhas, para o que eu lhe disser. Tenha-o à minha disposição.

De três em três meses dar-me-á conta da administração geral.

Além disso, continuará todos os meses a mandar-me a informação mensal das entradas e dos gastos.

Ao escrever-me, por causa da ordenação, ponha sempre no princípio o número de referência, como eu comecei a fazer consigo e como faz sempre a Propaganda.


[7059]

Espero que tenha mandado para casa Domingos Donizzoni e que Domingos Polinari aceite ir para o Cordofão. Cartum está provido. Informe-me sempre do comportamento dos seculares e de todos os seus subordinados.

Há muito tempo que ando a insistir junto do Governo de Cartum para receber o dinheiro do copta católico Armenios, do qual parece reconhecer pelo menos 47 000 piastras obtidas com a venda das suas mercadorias no Nilo Branco; mas até agora não consegui que nada me fosse entregue.

Saúde da minha parte o delegado apostólico dos coptas, abuna Marcos. Quando vir o novo delegado apostólico, mons. Anacleto de S. Felice, apresente-lhe os meus respeitos e ponha-me à sua disposição.

[segue uma nota administrativa]

Recebi os sais de quinino, etc.

Informá-lo-ei de outras importâncias recebidas em Verona e mandadas ao Vicariato, etc., etc. Saudações ao P.e Pedro, ao P.e Germano, etc.

Abençoo a todos/as.



Seu af.mo

† Daniel bispo e vig. ap.

O dia 1 de Janeiro de 1881 é a data a partir da qual o senhor deve efectuar os registos da administração geral.


1120
P.e José Sembianti
0
Cartum
13. 09. 1881

N.o 1120; (1074) - AO P.e JOSÉ SEMBIANTI

ACR, A, c. 15/136

J. M. J.

Cartum, 13 de Setembro de 1881

Meu caro reitor,

[7060]

Com a minha carta n.o 36 mandei-lhe algumas cartas de P.e Tagliaferro e de P.e Properzi, que foi o intermediário. P.e Properzi, que é um homem de extraordinário talento e argúcia, previu tudo o que ia acontecer, ou seja, que Tagliaferro não é capaz de um acto de generosidade e que nunca me doaria (como nos tinha prometido a si e a mim) a sua propriedade de Sestri. Properzi é advogado e é arguto, etc. Eu disse-lhe que conseguiria obter o convento, esperando depois ser a causa e ocasião para beneficiar espiritualmente Tagliaferro, fazendo com que voltasse a ficar na graça de Deus, pois dizem que há anos e anos que não se confessa e que é usurário, etc. Meu Deus! E foi religioso! Corruptio optimi pessima. Se Properzi se lhe oferecer (mantenha sempre certa reserva em relação a ele, porque, precisamente pelo assunto de Tagliaferro, que ele me propôs e iniciou, deixei de lhe falar), o senhor não se negue definitivamente, mas diga-lhe que se quer fazer que faça. Properzi é um homem de grande coração, que se venderia a si mesmo pelos outros, um homem cheio de virtudes e de defeitos. É napolitano.


[7061]

Eu escrevi a Tagliaferro secamente, dizendo-lhe que me tinha enganado, que o senhor não podia fazer de outra maneira senão retirar as Irmãs, porque tê-las em Sestri era prejudicial para o instituto e que um homem – disse-lhe – que faz pagar os móveis, umas camas miseráveis, etc. dificilmente podia fazer a propalada doação. O senhor não pague tais coisas; responda-lhe que sobre isso não lhe dei instruções de espécie alguma e que se entenda comigo. Quanto ao resto, não vejo que haja motivo para receio: o acordo não tem valor e, não tendo valor, nós não podíamos apresentá-lo ao Governo. Quanto ao aluguer que queria cobrar, deve-se dizer que ele nos deu grátis (é verdade) o alojamento, etc.


[7062]

A Rolleri não lhe devo nem um cêntimo. O depósito de 2200 liras, feito nas suas mãos em Novembro passado, pagou-se por si em Cartum com o dinheiro que lhe dei como administrador para a viagem do Cairo a Cartum.

Há dez dias li na Gazeta de Gratz que S. M. a imperatriz Maria Ana de Praga mandou a D. Comboni 500 florins (poucos); eu escrevi-lhe (a mons. Gaspardis) rogando-lhe que mandasse a esmola para Verona. Regra geral: tanto os 6300 francos da Santa Infância de Paris como estes 500 florins e outros que lhe cheguem, etc., retenha-os para as necessidades de Verona. Só lhe repito: no caso de eu ter extrema necessidade de retirar fundos de Verona para o Vicariato, fá-lo-ei, escrevendo-lhe que mande para o Cairo, etc. a soma de que se tratar. Confiança em Deus, que é tão rara mesmo nas almas mais piedosas, porque se conhece e se ama pouco a Deus e a J. C. Se se conhecesse e amasse de verdade Jesus C., mover-se-iam montanhas; e a pouca confiança em Deus (assim mo diz uma longa experiência e assim pensava o em.mo Barnabó) é comum a quase todas as almas boas, incluídas as de muita oração, as quais têm muita confiança em Deus dos lábios para fora, mas pouca ou nenhuma quando Deus as põe à prova ou se alguma vez lhes faz faltar o que querem.


[7063]

Isto pude vê-lo eu mesmo em frades, em jesuítas, em cartuxos e em muito bons sacerdotes. Eu não pensava que assim fosse, mas é assim. Digo-lhe para o advertir que tenha firme e decidida confiança em Deus, na Virgem e em S. José. Impressionou-me a queixa que me dirigiu numa carta quando soube que do envio de Lião só lhe atribuí 6000 francos. Modicae fidei, quare dubitasti? Quem tem verdadeira fé e confiança n’O de lá de cima, mais do que o senhor e do que eu e mais que os santos que comem na Europa (ou ao menos que grande número deles) são a Ir. Teresa Grigolini, a Ir. Vitória Paganini e a Ir. Maria Josefa Scandola, mais alguns dos meus missionários, Nöcker, o santo pároco presidente da nossa Sociedade de Colónia, e muita outra gente que conheço no mundo. Portanto, rezar e ter fé; mas rezar não com palavras, mas com o fogo da fé e da caridade. Assim se implantou a obra africana e assim foram implantadas a religião e todas as missões do mundo.


[7064]

Não tive tempo de o informar sobre Domingos Polinari. O único que se mostra favorável a ele na África sou eu, porque, embora louco, é de bons costumes e grande trabalhador e porque é o mais antigo dos da nova fase do Vicariato, isto é, desde que o Vicariato me foi confiado a mim e ao instituto de Verona. Mas P.e Bouchard, o cônsul, os missionários e as Irmãs (com mil razões para isso) não querem nem ouvir nomeá-lo. Por que desejava apresentar-me a mim a administração do quintal? O seu dever era dar conta dela ao superior local, P.e Luís, e obedecer-lhe a ele. Contudo, vendia os produtos fora e não levava nada para casa, e P.e Luís nunca viu um cêntimo. Agora, ao contrário, além de se abastecer a casa, que é provida de tudo o que há no quintal, cada dia se entrega ao superior um ou dois táleres da venda de limões, e quando há outros frutos ainda entra mais. Agora, para além de 400 táleres de tâmaras, há para vender okalib, cana-de-açúcar, etc., e tudo entra na missão. Com Domingos Polinari, a missão não viu nunca um cêntimo e ele não quis prestar contas a ninguém. E agora quer conduzir-me a administração? Está louco. P.e Giulianelli telegrafou-me do Cairo, avisando-me de que Polinari não quer ficar aí: «Ou vai para o Sudão ou vai-se embora.» Por isso, roguei a P.e Fraccaro que o recebesse no Cordofão e ele aceitou. Então, com outro telegrama, respondi a Giulianelli que para Cartum destinei Baptista (mas subordinado ao negro Lonardo, chefe do quintal, a quem Polinari despediu, sem dizer nada ao superior, ele que já estava no quintal há 22 anos), e para o Cordofão Polinari.


[7065]

Não sei ainda o que decidiu Domingos depois desse telegrama de resposta. Somente eu, entre todos, tenho gosto em que venha. Escreverei para Trieste, ao barão de Bruck, a quem conheço bem: é filho daquele que era ministro das Finanças do império austríaco, e que, dizem-me, se suicidou. Eu tinha muito contacto com ele, e foi em Viena, no Ministério das Finanças, onde conheci o jovem barão de Trieste.

Não encontrei ainda o recibo das 1299,50 liras que paguei a Tagliaferro em Novembro, mas talvez o encontre.


[7066]

P.e Francisco Pimazzoni, que, tendo melhorado um pouco, já se passeava (talvez de mais) pelo jardim, recaiu e agora não sei que dizer. Será uma grande cruz se perco este caro missionário.

Pobre Matteucci! Foi desde o mar Vermelho até ao Atlântico, numa viagem nunca feita por ninguém, feito que o coloca ao nível de Stanley, etc. e morreu em Londres, como Gessi Paxá no Suez, no momento de recolher os louros do triunfo. Que vida esta! Porro unum est necessarium: a alma, os interesses da glória de Deus, a salvação das almas. Muitas saudações ao em.mo, ao P.e Vignola, a Baclieri, a Ravignani e a P.e Luciano. Abençoo a todos.



† Daniel bispo




[7067]

Com esta, mando-lhe cartas de Tagliaferro e Properzi. Seria uma grande alegria para mim poder recuperar de Brown o anel de Pio IX.

[No alto da p. 1] Oh! Ficaria muito agradecido a Deus, se me fizesse recuperar o anel de Pio IX, do qual tiraria, sem dúvida, vinte mil francos em Paris ou noutra parte.

O senhor faça todos os possíveis e mande rezar a S. José ad hoc.

[À margem, nas pp. 1 e 3] Todas as Irmãs daqui, especialmente a Ir. Vitória, a Ir. Maria Josefa, as piemontesas, etc. tecem elogios à pequena Elvira de Astori, cuja proveniência se ignora, e dizem a Ir. Vitória e a Ir. M.a J. Scandola que ficariam muito contentes de a ter com elas, uma vez professa.