Comboni, neste dia

Al cugino Eustachio scrive da S. Croce (1858) dopo la morte della madre:
Quantunque io abbia volto le spalle al mondo consacrandomi ad uno stato di vita simile a quella di Cristo e degli Apostoli, tuttavia sento vivamente i latrati della fragile natura, e piansi amaramente la gran perdita.

Escritos

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N° Escrito
Destinatário
Sinal (*)
Remetente
Data
171
Assinaturas de missas
1
Alexandrie
1865
N.o 171 (1146) - ASSINATURAS DAS MISSAS CELEBRADAS

Em St.a Catarina, em Alexandria, no Egipto

ASCA, Registo de Missas





172
Assinaturas de missas
1
Paris
1865
N.o 172 (1195) - ASSINATURAS DAS MISSAS CELEBRADAS

Em «Notre Dames des Victoires» de Paris

ANDP. Registo de Missas





173
Mons. Luis de Canossa
1
Paris
1865
N.o 173 (1196) - A MONS. LUÍS DE CANOSSA

Direcção sobre um exemplar do «Plano»

ACL





174
P.e Joaquim Tomba
1
Paris
1865
N.o 174 (1197) - A P.e JOAQUIM TOMBA

Direcção sobre um exemplar do «Plano»

AMV





175
P.e Francisco Bricolo
0
Scellal
7. 1.1866
N.o 175 (164) - A P.e FRANCISCO BRICOLO

ACR, A, c. 14/19





Schellal (Núbia Inferior)

7 de Janeiro de 1866



Meu caríssimo P.e Francisco,



[1204]
Quem sabe o que terá dito, ao ver que eu nunca lhe escrevo! Tenho andado tão assoberbado com ocupações, que só uma vez escrevi ao superior P.e Tomba desde que abandonei a Europa. Com isto creio que fico justificado. Quero contar-lhe um pequeno abrégé da minha viagem até Schellal. Quando saí de Vicenza, onde realmente passei um dia feliz, num ambiente de verdadeira amizade, dirigi-me a Verona. Aí, a 26 de Outubro, apresentou-se-me o P.e Ludovico, acompanhado de José Habachy, já sacerdote regular, e dois negros terceiros, vestidos de frade, com a ordem expressa da Propaganda de me virem buscar, para irmos à África, ocupar Schellal e combinar comigo a divisão do vicariato apostólico da África Central. Sem rodeios, o P.e Ludovico dirigiu-me esta afirmação: «Eu não tenho nem um centavo: encarrega-te tu de conduzir o grupo a Viena e ao Cairo, que do resto me ocuparei eu». «Obrigado pela lisonjeira incumbência» disse para comigo; benzi-me e respondi: «Está bem»! Eu não tinha dinheiro, apenas algumas pequenas dívidas.


[1205]
Tregnaghi e alguns outros negaram-se a fazer-nos empréstimos. O marquês Octávio Canossa, sem eu lhe dizer nada, bem como o velho Vertua, entregaram-me uma esmola; e recebida a bênção do superior e do bispo (o qual aprovou a minha proposta de fundar no insto. um seminário para as missões africanas, no qual se acolheriam os postulantes sacerdotes de todo o Império austríaco), parti no dia 26 para Brixen. Mitterrutzner deu-me dinheiro para ir até Viena e o bispo de Brixen e o arcebispo de Salzburgo entregaram-me 100 florins. Visitei S. A. a imperatriz Carolina, esposa do falecido Franc. I e no Dia de Todos os Santos estávamos em Viena. O comité negou qualquer ajuda ao P.e Ludovico, pelo que me vi embaraçado; por isso em Viena afadiguei-me por obter, e obtive, a viagem gratuita para todos até Trieste. Telegrafei para Colónia e escrevi a Mitterrutzner; assim vieram-me ter às mãos rapidamente 60 napoleões de ouro. Em Trieste fiz um contrato com o Lloyd austríaco; o presidente, o hebreu Morpurgo, deu-me uma generosa esmola: reduziu para 220 os 660 florins necessários para a passagem de todos nós e a do negro Miguel. Assim, no dia 12, zarpámos de Trieste, onde tinham vindo P.e Beltrame com o negro e a baronesa Hermann.


[1206]
Não posso explicar com palavras o horror de seis dias seguidos de tempestade entre Trieste e a ponta da ilha de Cândia. No arquipélago grego levantou-se um terrível furacão, que matou 48 grandes bois, rompeu o costado esquerdo, de ferro, do Aquila Imperiale, vapor enorme, e destroçou a popa. O P.e Ludovico permaneceu 28 horas com umas náuseas atrozes; fizemos o sacrifício da vida e uma oblação ao Senhor. Eu estive mais de 30 horas separado do P.e Ludovico, porque sair do meu camarote equivalia a perder a vida. Mais de cem vezes encomendei a minha alma e o P.e Ludovico e Habaschy deram-se mutuamente a absolvição. O capitão confessou que aquilo já não tinha remédio e sugeriu-me que me mantivesse bem firme na ponte da proa para alcançar a lancha e salvar-me com ele. Ainda agora me invadem continuamente tremuras e sinto horror da tempestade, que me deixou bastante mal. Fiat. O P.e Ludovico vê como um dom extraordinário de Deus o que lhe restar de vida e diz sempre que prefere a morte a suportar outra borrasca como aquela. Finalmente, mais mortos que vivos, chegámos a Alexandria no Egipto, onde nos juntámos a outros quatro que tinham partido de Nápoles um mês antes.


[1207]
No Cairo fretei um barco fluvial para ir a Assuão pelo preço de quatro mil piastras (32 nap. de ouro) e em 32 dias de infeliz navegação, subindo o Nilo, chegámos a Assuão. Ontem chegámos aqui a Schellal. Saturados daquela embarcação, decidimos, com o P.e Ludovico, romper o contrato e regressar ao Cairo num vapor do Governo turco. Para tal fim, desci até Esneh, de onde depende Assuão, e, apresentando-me ao paxá, pedi-lhe que fizesse o necessário para conseguir para mim, para o P.e Ludovico e para o seu sobrinho P.e Francisco, passagem num vapor do Governo. E, coisa admirável, o paxá respondeu-me que, dentro de poucos dias, três vapores chegariam a Assuão e ele ordenar-lhes-ia para que nos levassem aos três gratis. De facto, deu-nos uma carta para o governador de Assuão e ordenou-lhe que reservasse três lugares bons para três padres austríacos, para que pudéssemos voltar ao Cairo quando quiséssemos.


[1208]
No dia em que chegámos a Assuão, chegou também o paxá, que renovou a ordem ao governador, nos fez uma visita e nos cumulou de gentilezas. Por isso, dentro de poucos dias voltarei ao Cairo, onde me deterei um mês ou mais. Temos mais protecção dos turcos que do Governo italiano, dos austríacos e de Vítor Emanuel. Que governo europeu presta tanta ajuda ao missionário católico? Peço-lhe tenha a bondade de apresentar os meus respeitos ao sr. bispo de Vicenza, a mons. Dalla Vecchia, ao prefeito do ginásio e a todas essas boas pessoas que eu conheci; saudações ao B. de P.e Tilino e aos bons clérigos do nosso insto. Gnoato, Ravignani e Angelina. Do Cairo irei a Nápoles, a Roma e a Verona: escreva-me para o Cairo. Adeus. Creia na eterna amizade de



Seu af.mo P.e Daniel Comboni






176
Cón. José Ortalda
0
Scellal
8. 1.1866

N.o 176 (165) - AO CÓN. JOSÉ ORTALDA

«Museo delle Missioni Cattoliche» IX (1866), pp. 145-147

Schellal (Núbia Inferior), 8 de Janeiro de 1866


 

[1209]
Apresenta-se-me uma ocasião propícia para enviar correio para Itália e eu aproveito-a para lhe escrever duas linhas que, unidas às mais afectuosas saudações, lhe levem notícias das nossas missões.

Alegro-me por lhe poder dizer que se conseguiu fazer algo para levar a efeito o plano publicado no Museo do ano passado, ou seja, tentar regenerar a África com a própria África. Por vontade do Em.mo Cardeal-Prefeito da Propaganda, acompanhei o P.e Ludovico de Casoria, o benemérito fundador do Instituto que é admirado no convento de La Palma, em Nápoles, onde centenas de jovens negros e negras são educados na civilização e na religião cristã.


[1210]
O objectivo da nossa viagem foi proceder a uma divisão do vicariato da África Central, o mais extenso do mundo, igual a duas vezes pelo menos à nossa culta e civilizada Europa, e atribuir uma parte aos beneméritos filhos da família franciscana, à qual pertence o mencionado P.e Ludovico, e a outra parte ao Instituto Mazza, de Verona, do qual sou membro. A proposta que fiz com tal fim ajustava-se ao desejo expresso pelo já falecido superior e fundador.


[1211]
Deixámos o Cairo no dia 2 de Dezembro passado e em trinta e dois dias de navegação chegámos às primeiras cataratas do Nilo; depois, após atravessarmos um pequeno deserto, alcançámos Schellal, de onde lhe escrevo. O P.e Ludovico, que só ficou comigo um dia e meio, voltou a partir a bordo de um vapor turco e regressou ao Cairo, de onde esperava chegar a Nápoles dentro de um mês.

A pressa não me permite entrar em pormenores, mas não tardarei a mandar-lhe um informativo da nossa viagem. Esta foi muito interessante, pois deu-nos oportunidade para muitas observações e ocasião para tratar de muitas coisas com o dito padre, que parece só pensar e viver para a sua querida família africana.


[1212]
Dentro de pouco, espero regressar também eu ao Cairo. E uma vez abertos alguns institutos de acordo com o plano apresentado à Propaganda, voltarei a Itália, se Deus quiser, e darei uma saltada a Roma para dar conta de tudo o que foi realizado. Entretanto, compraz-me poder comunicar-lhe que em Schellal se abriu uma casa e um instituto para educar cristãmente estes negros, os quais, por sua vez, levarão o mesmo benefício a seus irmãos que vivem no interior.


[1213]
O director do instituto é um padre franciscano da província de Nápoles; depois há um sacerdote de Cartum, que esteve seis anos a formar-se em Verona e cinco em Nápoles, razão pela qual veste o hábito franciscano; a eles juntam-se dois irmãos leigos e dois jovens artesãos. Espero abrir outros dois institutos ao longo do itinerário que fizemos na nossa viagem, segundo o modelo deste.

Em Cartum circulam rumores da fundação de uma missão protestante prussiana, mas nunca poderá competir com a católica. O paxá do Egipto criou três províncias no Nilo Branco. Esta organização provincial tornar-se-á vantajosa para a difusão do Evangelho, porque se multiplicarão as relações.


[1214]
A todos os missionários que encontrei no Egipto e ao longo do Nilo dei a ler a memória que o senhor apresentou ao Senado em favor deles e todos se uniram a mim para dar graças ao Senhor, que se dignava cumprir os nossos desejos e dissipava a tormenta que ameaçava eliminar a isenção do serviço militar ao jovem clero, o que representaria um golpe mortal para as missões. Em toda a parte se reza e se faz com que os bons neófitos rezem para que se não dispersem as famílias religiosas que fornecem um tão numeroso contingente de obreiros às missões.


[1215]
Quereria ter à minha disposição cem línguas e cem corações para falar em favor da pobre África, que é a parte do mundo menos conhecida e mais abandonada e, em consequência disso, a mais difícil de evangelizar. Mas os Sagdos. Corações de J. e de M. bastarão para todos e espero milagres por sua mediação. São necessários muitos sacrifícios, mas qualquer sacrifício vale a pena pela África cristianizada. As muitas vidas dos meus companheiros, imoladas nas explorações que, faz agora dois lustros, fizemos até aos dois graus de lat. N., foram aceites por Deus e serão, espero, semente fecunda de novos apóstolos e de muitos cristãos. Saúde de minha parte d. Bosco e o cón. Anglesio e diga-lhes que se apressem na preparação de jovens corajosos, habituados a toda a espécie de agruras, mortificações e sacrifícios: tal deve ser o apóstolo da África, o qual deve pôr-se inteiramente nas mãos da Providência.

Na esperança de o ver no meu regresso a Itália, encomendo-me à caridade das suas orações, reiterando-me nos Sagdos. Corações de Jesus e de Maria



Seu af.mo P.e Daniel Comboni

Missionário ap. da África Central






177
P.e Venâncio OFM
1
Cairo
26. 1.1866

N.o 177 (166) - AO P.e VENÂNCIO O. F. M.

«Jahresbericht...» 14 (1866). pp. 7-76

Vinte e seis de Janeiro de 1866

Veja-se o escrito n.o 188, pp. (389-415).




 

178
Card. Alexandre Barnabó
0
Cairo
6. 2.1866

N.o 178 (167) - AO CARD. ALEXANDRE BARNABÓ

AP SC Afr. C., v.7, ff. 827-828

Cairo, 6 de Fevereiro de 1866

Em.mo Príncipe,


 

[1216]
Saberá V. Em.a que o dia da Epifania chegámos a Schellal e que o P.e Ludovico tomou posse daquela estação. No meu regresso visitei pela quarta vez as estações católicas do Alto Egipto, no intuito de examinar se esta prefeitura se presta para formar nela eficazmente elementos para a conversão dos negros. Com este fim e também para ajudar esta missão egípcia, o P.e Venâncio acolheu de boa vontade um pequeno e viável projecto, ao qual já os missionários mais velhos do Alto Egipto me tinham dado a sua aprovação.


[1217]
No caso de ser do agrado de V. Em.a, nós resolver-nos-íamos a começar com um pequeno instituto feminino em Negadeh, a estação mais próxima da Núbia, da qual não dista mais que umas 50 léguas e que tem uma população de 4000 habitantes, dos quais 170 são católicos e 3000 coptas heréticos. O chefe destes, que é muito influente e me confessou abertamente a verdade das duas naturezas de Cristo, não está muito longe de dobrar a cerviz sob o suave jugo da nossa fé. Onde se introduzisse a acção poderosa da mulher católica, desconhecida nessas paragens, veríamos em poucos anos grandes progressos. A casa para o dito instituto poderia estar disponível após uns pequenos arranjos. Começar-se-ia em seguida com três irmãs, a cada uma das quais eu faria uma atribuição de 500 francos, retirando-os do meu legado da Sociedade de Colónia; e isto até se conseguir obter para as irmãs essa mesma importância da Propagação da Fé de Lião, quando a obra já estivesse em marcha. Às irmãs de Negadeh eu juntaria duas ou três jovens negras de Verona muito bem instruídas no árabe e nos lavores femininos.


[1218]
Quanto ao instituto de irmãs, esperamos a decisão de V. Em.a Rev.ma. Eu tinha escrito à superiora geral das Irmãs de S. José. Porém, como mons. Pascoal me diz que presentemente madre Emilie não dispõe de pessoal, se isto é verdade, eu atrevo-me a propor a V. Em.a as Irmãs do Bom Pastor. Este instituto tem aqui no Cairo vinte e duas irmãs e a superiora está disposta a colaborar na obra com a aquiescência de V. Em.a; e o mons. delegado protege com toda a razão estas pias e laboriosas irmãs. Por isso, quando V. Em.a se dignar pronunciar-se sobre o assunto referido, tudo se organizará rapidamente.


[1219]
Com a sua perspicácia, V. Em.a compreende bem as imensas vantagens que trará para a prefeitura do Alto Egipto a formação de pequenos institutos, masculinos e femininos, nas suas diferentes estações, os quais formarão também bons elementos de raça negra de ambos os sexos para as missões que depois se criarão na África Central. Ainda que a erecção destas missões venha a ter lugar mais tarde, convém ir preparando já os braços necessários, sem os quais é estéril a obra do missionário.


[1220]
Com o objectivo de prover de negras estes institutos, tornar-se-ia utilíssimo o concurso da obra do P.e Olivieri. Cada negra custa 100 escudos e, embora o negro morra também no Egipto, ele sobrevive o dobro ou mais que na Europa. Cada jovem negra levada para a Europa custa 200 escudos. A obra de Olivieri, ainda que santa, é incompleta e não goza nada da simpatia dos bispos nem dos fiéis; por isso, antes ou depois, deve cair.


[1221]
Se a referida obra, mantendo intacto o seu programa do resgate de negros para salvar as suas almas, acolhendo-os nos institutos religiosos, fornecesse aos institutos religiosos estabelecidos nas costas de África os negros de ambos os sexos, ela teria um grande desenvolvimento, seria benéfica para a regeneração da Nigrícia e a própria obra se perpetuaria. Esta cooperação da obra do P.e Olivieri, no modo indicado, só é susceptível de se alcançar facilmente através de V. Em.a, persuadindo pouco a pouco o em.mo cardeal-vigário, que detém muito poder, a dar protecção à obra do resgate. Aqui há 21 negras com as irmãs italianas e já comecei a tratar de obter algumas.


[1222]
Dou a conhecer a V. Em.a os seguintes factos: começou a ser construída uma via férrea do Cairo a Assuão, que dentro de oito ou dez anos será prolongada até Cartum; outra linha férrea entre Suakin e Berber unirá o mar Vermelho com o Nilo. Os turcos invadiram o Nilo Branco, onde estão organizando três vastas províncias. Em Siut, capital do Alto Egipto, estabeleceu-se uma grande escola anglicana e em Cartum floresce uma escola luterano-prussiana. Pelo que pude saber, nas sociedades heterodoxas fervilha a ideia de uma propaganda em toda a região do Nilo.


[1223]
Mons. Vuicic considera prudente manter a neutralidade no tocante às operações no Alto Egipto; por isso, está-se à espera do que V. Em.a dispuser.

Pedindo-lhe dê lembranças ao monsenhor secretário, beijo-lhe a sagrada púrpura.



Seu humilmo. e devot.mo P.e Daniel Comboni






179
Conde Guido de Carpegna
0
Cairo
17. 2.1866

N.o 179 (168) - AO CONDE GUIDO DE CARPEGNA

AFC, Pesaro

Cairo, 17 de Fevereiro de 1866

Meu amável e caríssimo Guido,


 

[1224]
Não podes imaginar quão pesaroso estou por não receber notícias nem de ti nem da família. Já há tempos que escrevi à mamã e ao papá, mas nenhum deles deu sinais de vida. É tido por certo o provérbio longe da vista, longe do coração. Eu nunca o acreditarei, nem a teu respeito nem da família. Compreendo que a minha condição de vagabundo impossibilita a indicação de um endereço preciso; mas tu, que viajaste pelo Oriente, sabes seguir perfeitamente a minha pista. Desde que parti de Roma não voltei a receber notícias vossas, nem ninguém mas deu.


[1225]
Aqui no Cairo estou com frequência naquela sala onde tive o grande prazer de te ver pela primeira vez e onde se acendeu a chama daquele afecto que devia unir-nos para sempre pela amizade. A casa dos Rossetti está agora ocupada pelo cônsul-geral austríaco, excelente pessoa; e naquela mesma sala fumo com frequência o saibbuki e faço em segredo um brinde por ti: essa sala, caro Guido, tornou-se-me grata por tua causa. No Cairo, já não se fala da família Rossetti, que foi um dos elementos que impulsionaram o engrandecimento de Mahhamed Aly; graças a ela, a sua dinastia reina agora gloriosa no trono do Egipto. Desapareceu da terra como uma nuvem diante do Sol.


[1226]
Estive na Núbia Inferior e atravessei o Egipto pela quarta vez em toda a sua longitude. Oh, que deliciosas são as margens do caudaloso Nilo, que fecunda o solo egípcio e faz desta clássica terra uma das mais belas do mundo! Voltei a contemplar as gigantescas moles de Karnak e de Luxor, os famosos templos de Dendera, de Edfu e de File; e pisei a sagrada terra, santificada por tantos anacoretas e agora profanada pelos sacrílegos filhos do árabe profeta que ocupam as vetustas ruínas. Finalmente, num vapor do Paxá, voltei ao Cairo, onde criei um instituto baseado no meu Plano para a Regeneração da África.


[1227]
Sei que em Roma se encontram suas altezas o príncipe e a princesa Giovanelli. Peço-te que lhes faças uma visita por mim e de saudar e apresentar os meus respeitos ao príncipe José, que recebe o amor dos vénetos e dos institutos de beneficência e é a mais brilhante honra da nobreza véneta; diz-lhe que o lembro com frequência e o trago no coração. Diz também à princesa muitas coisas em meu nome e faz-te intérprete do respeito e veneração que lhe dedico.

Que dirás à mamã, ao papá e à pequena Maria? Tu podes imaginá-lo: a esperança de os ver no próximo mês consola-me; espero ver a Maria já crescidinha e cheia de juízo. Dá-me notícias de Pippo, a quem darás uma carinhosa saudação. Escreve-me para o Cairo, para o Convento da Terra Santa, com carta certificada para o cônsul austríaco do Cairo.

Por favor, saúda Manucci e toda a sua família. E tu que fazes? Foste preparando as coisas para o teu futuro?... Algo de positivo deve haver já a estas horas. Lembra-te dos quatro B... Saúda também o dr. da família e irmão e a todos os amigos da casa. Recorda-te que te estima muito e te tem sempre presente



Teu fiel e af.mo amigo

P.e Daniel






180
Cón. J. C. Mitterrutzner
0
Cairo
20. 2.1866

N.o 180 (169) - AO CÓN. JOÃO MITTERRUTZNER

ACR, A, c. 15/65

Cairo, 20 de Fevereiro de 1866

Meu caro e venerado amigo,


 

[1228]
Tenho imensas coisas para lhe escrever e não sei por onde começar. Já há mais de três semanas que voltei ao Cairo, mas uma secreta repugnância se apoderou de mim, de maneira que não consegui pegar na pena. E a causa da minha aversão em lhe escrever é o juízo que formei do P.e Ludovico e da sua instituição, que muito me custa expor. Mas finalmente decidi-me, porque o senhor é um verdadeiro amigo, um protector, o mais esforçado colaborador no apostolado dos negros e conhece o fundo do meu coração: eu desejaria ver centenas de instituições a repartirem entre si a África Central, para trazê-la toda para o catolicismo. Se lhe dou o meu juízo sobre o P.e Ludovico é porque estou convencido do que digo, embora me sentisse muito feliz em retractar-me e saber que me enganei. Digo-o a si, que não permite que lhe dêem gato por lebre e que antes ou depois chegaria por si mesmo a saber a verdade. Deus queira que me engane! Mas Deus que é a verdade sabe que eu não quero enganar ninguém; por isso vou contar-lhe o que sinto no fundo da minha alma.


[1229]
O P.e Ludovico é homem de grande caridade, verdadeiro filho de S. Francisco no cumprimento das regras da sua ordem e modelo de observância religiosa. Mas a sua cabeça não tem a mesma relação com o seu coração e não é claro e recto na sua maneira de agir. O P.e Samuel, de Negadeh, velho missionário do Alto Egipto, reformado franciscano, que nos acompanhou a Schellal, definiu o P.e Ludovico como uma mistura de ignorância, de caridade, de piedade, de hipocrisia e falsidade e de virtudes. De viva voz, dar-lhe-ei a conhecer um monte de provas e factos; agora limito-me a dizer-lhe apenas isto. O director de Schellal, o P.e Boa-ventura de Casanova e o próprio José Habaschy e todos os missionários franciscanos napolitanos, que vi no Egipto, dizem que o P.e Ludovico é um santo a seu modo. O director de Schellal e o nosso Habaschy explicaram-me bem a substância real da sua instituição; eu confrontei-a com as explicações do P.e Ludovico e com uma carta que ele escreveu aos frades Bigi, que eu traduzi para latim, porque ordenou que se lesse uma vez por semana em plena comunidade; e tudo isto, unido ao que vi no P.e Ludovico, leva-me a emitir o seguinte juízo: «A instituição do P.e Ludovico não poderá fazer nada em África, sem ser dirigida e governada pela primeira ordem franciscana». Probatur.


[1230]
Os irmãos Bigi são um amontoado de seculares de todas as classes e profissões, que se mostram inclinados à piedade e que o P.e Ludovico vestiu de franciscanos para dirigirem e ensinarem ofícios à juventude. Desde que dêem provas de piedade, rezem terços e façam genuflexões, ele entrega-lhes o hábito e põe-nos a trabalhar nas obras; e com a mesma facilidade lhes retira o hábito e os põe na rua. Ele às vezes recebe seis que veste de irmãos leigos e partem sete que regressam à condição de seculares. O P.e provincial de Nápoles e todos os frades são contrários ao P.e Ludovico, que faz tal embrulhada tanto na política como na comunidade, que compromete perante o público a ordem franciscana. A instituição do P.e Ludovico pode ter sacerdotes terciários, mas até agora não formou nem um; por isso precisa de franciscanos da primeira ordem, sem os quais o Instituto não pode funcionar. Mas foram-se uns atrás dos outros: nenhum se pôde acomodar às ideias do P.e Ludovico, o qual pretende que só a sua instituição dirija as obras com o nome franciscano.


[1231]
O facto é que agora tem 42 artesãos na Europa e na África e, sem depender da primeira ordem, quer governar as obras de Nápoles e de África. Não digo nada da formação, que não se conhece em La Palma. O P.e Boaventura, de Cartum, que é a pessoa mais instruída que a instituição do P.e Ludovico deu, confessou-me saber pouco mais do que aquilo que aprendeu em Verona; não sabe nada nem de dogmática nem de moral. O bom homem, depois de umas pequenas provas, mete os recém-chegados a trabalhar nas obras, nas missões e põe-nos em risco de perderem a alma. Venhamos agora à África. Em tempos passados, ele enviou para lá 12 dos seus: dois morreram, um – o senhor sabe – anda a acender o gás nas ruas públicas de Nápoles e todos os demais desertaram das suas bandeiras. Dois destes que estão aqui no Cairo asseguraram aos frades que nunca mais voltarão para a instituição do P.e Ludovico. Passemos agora à nossa expedição. Em Schellal deixámos o pessoal seguinte:



P.e Boaventura de Casanova, director

P.e Boaventura de Cartum

Frei Pedro, carpinteiro, procurador

Frei Inocêncio, enfermeiro

Frei João, negro, e

Frei Ludovico, artesãos, a quem em Trieste vestimos de seculares.


[1232]
O director, que é da primeira ordem e não quer saber nada da instituição do P.e Ludovico, é um bom frade, mas não o convencem nem a cabeça nem as obras do P.e Ludovico e ele julga-o bem.


[1233]
Fr. Pedro foi soldado durante sete anos e lutou muito contra Garibaldi em 1860; depois trabalhou como carpinteiro: era o director das oficinas de Capodimonte no instituto do P.e Ludovico, um dos melhores elementos de La Palma.

Fr. Inocêncio é verdadeiramente bom, o melhor de todos os de Schellal. Sabe assistir bem os doentes e arranja-se a sangrar e dar medicamentos.

Os outros viu-os o senhor em Brixen.


[1234]
Agora, em Schellal, o P.e Ludovico ordenou que se siga a mesma vida que em La Palma: coro, silêncio, solidão, etc. (não são mais que dois os padres) e proibiu ao director que mantenha comunicação com a Propaganda, com o geral ou com provincial, sob pena de o abandonar e de não lhe mandar provisões. Ora bem, escute!... No dia 15 do corrente, com enorme surpresa, vejo que se me apresenta aqui no Cairo Frei Pedro, o procurador de Schellal. Fico espantado. Jurou não voltar a pôr os pés em Schellal: após uma vocação de apenas 28 dias, foi-se. Em suma, entre os dois padres reina uma tremenda discórdia. O director não sabe uma única palavra de árabe e José Habaschy, ainda que subordinado, é quem tem de tratar os assuntos. Ora bem, pelo que diz aos frades Frei Pedro, parece que o nosso Habasky se envaideceu pelo bom acolhimento e amizade que lhe dispensam os de Schellal e procura criar um partido para empurrar o director e converter-se ele em superior de Schellal. Nunca foi ao coro, arrenda terrenos sem falar com o superior e escreveu-me a pedir dinheiro. Abre as cartas ao superior e até possui dinheiro, que pediu emprestado, contra o disposto pelo P.e Ludovico, que lhe proibiu de tocar em dinheiro. Em suma, aquilo em Schellal é uma Babilónia.


[1235]
Eu, pelo que vi, dava um espaço de seis meses até os frades entrarem em confronto; o P.e Samuel só dois meses, mas, na realidade, a paz entre eles não durou nem 15 dias. Em seguida escrevi ao director aconselhando-o a manter-se firme no seu lugar, segundo as ordens do P.e Ludovico, e mandei uma carta terrível a Boaventura, de Cartum, na qual lhe falava como verdadeiro pai. Espero que dê resultado. Depois, ao enviar para Nápoles a carta do director, escrevi outra, como bom amigo, ao P.e Ludovico, repetindo-lhe os conselhos que lhe dei no Nilo para não se precipitar demasiado em ordenar sacerdotes negros e não empenhar a sua instituição em grandes empresas, sem provar amplamente a vocação do pessoal. Dentro de pouco – diz Fr. Pedro – escaparão também os dois negros. É inútil: sem a primeira ordem, a instituição do P.e Ludovico não faz nada. O P.e provincial de Nápoles, conhecendo a fundo as coisas, disse ao P.e Ludovico: «Se quer missionários para dirigir a estação de Schellal, eu dar-lhe-ei os elementos melhores e mais capazes da província».


[1236]
O P.e Ludovico recusou. E sabe porquê? Ele mesmo o disse: porque quer apresentar um ou dois factos positivos à S. Congr. dos Bispos e Regulares, para que ela aprove o seu instituto e assim o rei de Nápoles seja protector do mesmo. Porém, nem a Congr., nem o Definitório dos franciscanos, nem o provincial de Nápoles querem saber nada. Ora bem, eu digo com muitos: «Este homem não procura o bem da África, mas a glória do seu instituto». Em África poderíamos ter muitos e óptimos missionários franciscanos e o P.e Ludovico impede-o. A sua instituição, que não tem ainda um único sacerdote, está atrasada; e será um milagre se conseguir manter-se de pé Schellal, porque não dispõe de pessoal: só tem artesãos sem vocação. Mas deixemos isto, pois há ainda outra coisa que o espantará.


[1237]
O inimigo principal do meu Plano é o P.e Ludovico. E, o que conta mais, é acérrimo adversário de que a Propaganda conceda um pedaço da África ao instituto. Estou plenamente informado e J. Habaschy é testemunha auricular de que o P.e Ludovico em Roma fez todo o possível perante a Propaganda para impedir a divisão e até solicitou com insistência ao card. Barnabó que impedisse que eu continuasse em África; mas o cardeal respondeu: «Não; quero que Comboni vá contigo, ordeno-o, e quero a divisão». Em Nápoles tinha-me dito: «A Palma e eu queremos ser teus servidores e cooperadores do teu Plano». Foi a Verona e manifestou a vontade da Propaganda a P.e Tomba, dizendo-lhe querer ajudar o instituto, etc. O senhor pode sabê-lo em pormenor de Verona. Foi a Brixen e lembrar-se-á de como ele falou.


[1238]
Deslocámo-nos a Viena e, enquanto eu estive ausente por dois dias em Praga a visitar S. E. o arcebispo de Schwartzenber, ele apresentou ao P.e Matzek o vosso belíssimo projecto sobre a divisão e pediu-lhe que exercesse a sua influência sobre o comité para se opor à mesma, dizendo: «Se nós podemos fazer o bem no Cairo e Cartum, porque ceder aos outros as tribos do Nilo Branco? O melhor, por agora, é negar ao Insto. Mazza uma parte da África». É o que de facto decidiu. Isto referiu-mo ad litteram José de Cartum, testemunha auricular. Eu não acreditava, mas factos posteriores convenceram-me de que é assim.


[1239]
Em Trieste, chegados ao barco e após termos partido, o P.e Ludovico falou-me assim: «Meu filho, eu penso ser prudente que, no Egipto, nem com o bispo, nem com os frades, nem com ninguém se fale de divisão, porque todos se ririam de nós. Vamos a Schellal e no nosso regresso falaremos com o bispo». Ao que eu acrescentei: «Como justificar perante os franciscanos a minha presença consigo? Têm porventura os franciscanos necessidade de padres para as suas missões?» Então ele respondeu-me: «Direi que me acompanhaste como amigo e conhecedor das obras de La Palma e também para me prestares ajuda, uma vez que tu conheces bem a África». Anuí ao seu desejo, na condição de no nosso regresso de Schellal nos determos algum tempo a falar com o bispo, segundo a ordem da Propaganda.


[1240]
Omito a maneira de lançar algumas frasezitas de descrédito contra o meu Plano, dizendo: «O Plano de Comboni é bom em teoria; na prática, impossível»; e disse isto às pessoas mais importantes. Calo o facto de ele estar cheio de recomendações para cônsules, personalidades, etc. do Egipto, nunca teve o gesto de amizade de me apresentar a algum deles, apesar de lho pedir a respeito de um; enquanto eu, ao invés, o apresentei a todos os benfeitores da missão que conhecia, desde Verona até Viena, passando por Trieste. Calo outros inumeráveis pormenores indignos que teve comigo e que me dá vergonha citar; talvez de viva voz lhe conte algum, ainda que seja só para nos rirmos. Calo a sua maneira de falar dos anteriores missionários da África Central; o seu maior elogio de Knoblecher foi este: «Oh, era um homem endinheirado... As missões devem ser feitas com humildade e não com dinheiro», etc. Passemos a Schellal.


[1241]
No dia da Epifania abrimos Schellal. Tendo chegado ali o príncipe António de Hohenzollern Sigmatingen, ele, na tarde do dia 8, obteve a passagem gratuita no vapor até ao Cairo. Ele tinha que partir pela manhã do dia 9 e pela tarde chamei o P.e Samuel, de Negadeh, que nos acompanhou a Schellal e, com P.e Francisco, o sobrinho do P.e Ludovico, entrámos no quarto deste e falei-lhe assim: «O motivo pelo qual a Propaganda quis que eu viesse consigo a Schellal e ao Egipto era pôr-nos de acordo sobre como dividir o vicariato apostólico da África Central e tratar com o mons. delegado apostólico do Egipto. O senhor parte amanhã e, quando chegar ao Cairo, regressará com o primeiro vapor, de maneira que já não poderemos tratar do importantíssimo assunto da divisão. «Que assunto? – perguntou ele. Eu não sei de nada»! Repliquei-lhe: «Então, que nos disse aos dois o card. Barnabó? Que lhe disse a si quando passou por Roma para vir a Verona? Não mandou que fôssemos os dois juntos a África, etc.?» «Eu não sei de nada» – disse ele. «Que queres que tu e eu, que somos pó, que temos os nossos superiores, decidamos sobre um assunto tão importante? Que o façam os nossos superiores; eu não sei de nada. Onde estão os papéis, etc. nos quais se diga que estamos autorizados a fazer esta divisão de que falas? Eu não sei nada»... Numa palavra, meu amigo, negou tudo. Cobriu-me de uma verborreia hipócrita, elogiando os missionários de P.e Mazza, mas que não há dinheiro, etc.


[1242]
Quando depois lhe mostrei a sua carta, na qual propôs sabiamente a divisão em merid. e set., etc., então disse: «Está bem, se a Propaganda mo pede, eu apresentarei este projecto». Prometeu que me esperaria no Cairo para falar com o bispo, a fim de evitar que a Propaganda, por nós não termos falado com o delegado apostólico, nos obrigasse novamente a vir ao Cairo ex professo. Porém, o facto é que, quando chegou ao Cairo, não fez a menor alusão dele ao bispo e partiu para Nápoles. Disse que na África Central se requer a humildade e a pobreza de S. Francisco. As suas teorias são bonitas e boas, mas os factos são diferentes: é o eclesiástico mais egoísta que vi na minha vida e o que me dará maiores problemas quando se tratar de introduzir em África outras instituições.

Ele, que ad litteram não tem nenhum pessoal (salvo algum artesão que já entrou preparado no seu instituto), pretende nada menos que ninguém vá para a África. E paciência, se só o impedisse ao Inst. Mazza; mas o facto é que fez um acordo com o geral para que não entre nela nenhum franciscano que não seja de La Palma. Isto, meu amigo, é só a décima parte do muito que vi e que lhe contarei do P.e Ludovico. Só lhe quero falar do falaz programa que apareceu nos jornais católicos Un Nuovo Indirizzo, etc. Pois bem, caro amigo, ou eu fui um joguete do card. Barnabó, do Papa e do geral, pois os três prometeram-me uma missão para o insto. e com esse objectivo fui enviado a África, ou o P.e Ludovico é um impostor. Pense neste novo rumo dado às missões africanas e julgue.


[1243]
Apesar de todos estes desgostos, eu passei com o P.e Ludovico, de 26 de Outubro a 8 de Janeiro, dias muito pacíficos, sem a menor sombra de disputa, como passaria um amoroso filho com seu pai. Apesar do procedimento do P.e Ludovico para comigo e para com todos os que trabalham pela África, eu sempre lhe farei bem no que puder; apenas devido ao bem de África, quero ter uma boa conversa com o P.e geral dos franciscanos. A si digo-o como sinto, para que não seja enganado como eu fui todas as vezes que estive em Nápoles. Mas agora que tratei com o homem e vi o que tem de positivo, e ouvi o que dele me contaram os bons frades napolitanos, só agora, com toda a dor do meu coração, abri os olhos. Eu ficaria feliz se me enganasse, pois a África teria uma boa ajuda no P.e Ludovico, mas temo que a África vai obter pouco dele: conheci-o a fundo e basta. Passemos a Cartum.


[1244]
Falei com nove ou dez comerciantes de Cartum e todos em coro criticam a conduta moral do P.e Fabião. Tem vinte e duas escravas fugidas dos muçulmanos. Alguns amos, por meio do cônsul austríaco, reclamam-lhe as suas escravas; mas ele, nada! Não se incomoda com o exterior, embebeda-se de aguardente de manhã à noite, etc. e vive com as suas escravas à muçulmana. Este é o falatório dos hipócritas dos comerciantes a respeito do P.e Fabião. Eu não creio em nada; considero o P.e Fabião inocente. Mas o certo é que o cônsul Hansal enviou um tremendo relatório ao cônsul-geral do Egipto, o qual me mostrou tudo, incluída a débil defesa que o padre fez de si mesmo.

Agora o cônsul-geral vai enviar ao Ministério de Viena uma comunicação contra o missionário. Diz-me o cônsul que na missão, ou seja, nas casitas do jardim onde estão as escravas, vieram ao mundo três crianças mulatas e Cartum inteira acredita... O P.e Fabião escreve ao cônsul-geral a dizer que se precisam na missão algumas escravas para fazer o pão. O facto é que é um padre sozinho, exposto a estas calúnias, sem poder confessar-se desde há muito tempo, etc. Escrevo-lhe estas coisas a si, como padre das missões que é, para que, se lhe for possível verificá-las, remediá-las e ajudar o P.e Fabião, o faça. Supliquei ao cônsul que não escreva a Viena, mas que se ponha em contacto com o bispo do Egipto.


[1245]
Já começou a ser feita a via férrea do Cairo a Assuão e, dentro de poucos anos, estará pronta de Assuão até Cartum. Outra via férrea entre Suakin e Berber unirá o Nilo com o mar Vermelho. Num só mês vai-se agora do Cairo a Cartum pela rota de Suakin. Partiram outros três mil soldados para o Sudão, e vão-se criar três grandes províncias egípcias no Nilo Branco. Está florescente em Cartum a escola protestante prussiana, muito mais frequentada do que a católica pela colónia europeia. Em Siut há outra escola anglicana. Que consequências terão para a fé estes factos? Escrevi sobre isso um pequeno relatório a Barnabó.


[1246]
Estou convencido e comigo todos os missionários do Egipto, de que a aplicação do Plano para a Regeneração da África no Alto Egipto é um dos meios mais adequados para ajudar a África Central. Como a história da divisão será um pouco mais longa (e certamente será feita segundo a sua ideia, como a mais sábia e justa), eu penso que será útil erigir dois pequenos institutos, um feminino em Negade, outro masculino em Kenne, com o duplo objectivo de ajudar a juventude copta egípcia e de preparar ao mesmo tempo elementos para os negros.


[1247]
Com tal finalidade visitei diligentemente todos os pontos do Alto Egipto onde há uma missão católica; e no meu regresso ao Cairo apresentei um pequeno projecto ao prefeito apostólico do Alto Egipto, no qual lhe propunha fortalecer essa missão com a aplicação do meu Plano para a Regeneração da África. O prefeito, solicitado por todos os seus missionários, aceitou a proposta e submeteu-a ao card. Barnabó; por isso, escreveu uma bela carta ao cardeal, na qual, entre outras coisas, lhe pedia autorização para que eu fundasse um pequeno instituto em Negade, instalando nele as irmãs que fossem do agrado de Sua Eminência.

No Cairo farei surgir um outro pequeno grupo de jovens negras sob a direcção das irmãs que aqui estão. Porém, sobre este ponto, mandar-lhe-ei uma carta pormenorizada no próximo vapor.


[1248]
Mandar-lhe-ei igualmente um pequeno informativo sobre a nossa viagem a Schellal, com a famosa e interessante conversa que tive com Lesseps, que me deu sábios conselhos sobre o modo de aplicar o Plano, etc. O P.e Ludovico chegou a Nápoles no dia 27 de Janeiro. Pensa abrir uma casa de ofícios no Cairo Velho, à frente da qual porá o seu sobrinho sacerdote, o que choca com os frades aqui do Cairo. Conseguiu uma casa perto do cemitério, tendo em contrapartida apenas que celebrar uma missa por semana. O mestre de estudos será o negro Morsal, que eu levei a Nápoles em 1862. Mas dar-lhe-ei depois mais amplas notícias sobre isso.


[1249]
O P.e Presidente de Schellal rogou-me que lhe mandasse dinheiro, pois o P.e Ludovico tinha-o deixado com cinco napoleões de ouro. Do Cairo, P.e Francisco mandou-lhe trinta táleres. Um dos motivos pelo qual aquele director se manterá firme no seu posto é a esperança de que lhe não há-de faltar o necessário. Portanto, assisti-lo é de capital importância para a missão. Se se ajudar, ficará lá, mesmo sozinho. Portanto, se puder, faça com que lhe prestem assistência quanto antes; mas é melhor que o faça directamente por meio do cônsul e de Fathalla, porque existe o risco de a ajuda ficar em Nápoles, como aconteceu no Outono passado. Contou-me o director que em Nápoles foram distribuídos várias centenas de novos endereços e que Habaschy e ele pregaram nas igrejas, e se recolheram 500 escudos. Estes foram misturar-se – disseram-mo os dois sacerdotes de Schellal – com as obras do ensino para artesãos do P.e Ludovico. Era o defeitozinho do nosso caro superior de Verona. Portanto, o director recomendou-me: «Se puder prestar-me ajuda, faça-ma chegar directamente e eu dar-lhe-ei contas de tudo».


[1250]
Eu fico no Cairo até meio da Quaresma e depois vou a Verona, passando por Roma, onde tenho que falar com a Propaganda. Em Verona recolho as negras e trago-as para o Egipto. Por isso recomendo-lhe o nosso negro Locwis, que juntamente com Cachiual quereria trazer para o Egipto. Mas antes tenho de esvaziar no seu coração tudo o que tenho cá dentro e agir segundo os seus conselhos.


[1251]
Não quero perder tempo; quero trabalhar e viver somente para a África e para a conversão dos negros. Espero que Deus me assista e me conceda grandes graças e que o senhor seja sempre meu pai, conselheiro, amigo, mestre e tudo.

Não temo nada, confio em Deus. Mil saudações a S. Alt. Rev.ma, a seus secretários, ao amo do negro, ao negro, etc.



Tuissimus in corde et opere

P.e Daniel Comboni