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Data
321
P.e Joaquim Tomba
0
Cairo
30. 7.1869

N.o 321 (301) AO P.e JOAQUIM TOMBA

AMV, Cart. «Missione Africana»

V. J. M. J.

Cairo, 30 de Julho de 1869

Amat.mo e rev.do P.e Joaquim,

[1930]
Umas linhas para lhe dar notícias nossas e pedir-lhe que lembre a P.e Beltrame a promessa que me fez de me mandar a cópia das informações que ele enviou de Cartum e do Nilo Branco para Verona, com excepção da última que está em minha posse. Prometeu-mo também na sua presença. Já lhe escrevi uma vez, mas nec unum verbum. Por isso recorro aos seus bons ofícios, a fim de poder dispor dos ditos relatórios, que me são necessários neste momento. Diga ao nosso estimado P.e Beltrame que, embora esteja ocupadíssimo, promissio boni viri est obbligatio.


[1931]
Desejaria receber notícias do instituto, tanto de S. Carlos como de Canterane, mas não tenho sorte: ninguém do instituto me escreve.

Quanto às negras do insto. de Verona, estão todas a ir bem, até Caltuma, e são verdadeiramente boas. Estão tristes, porque já não recebem notícias das suas mestras, tias, madres e superioras. Que lhe vamos fazer?! Consolar-nos-emos mutuamente e, cara alegre!

Pelo que me diz respeito, os meus três institutos vão muito bem. No dia da Assunção baptizarei cinco negras de dezassete a vinte e um anos. Não tenho tempo de lhe descrever as boas conquistas que eles fazem continuamente. Os meus institutos foram difamados em todo o Véneto pelo infeliz P.e Zanoni, que perdeu a cabeça e que escreveu ao bispo de Verona, à Propaganda e ao arcebispo e delegado do Egipto falando contra mim e contra os seus companheiros. Eu respondi com a paciência, com breves palavras e com os factos.


[1932]
Tal perseguição representou para os meus institutos um avanço de dez anos, pois granjeou-me a amizade íntima e o favor do nosso delegado e do pároco local. Monsenhor o delegado ordenou-me que fundasse um terceiro instituto e agora tenho três grandes casas, duas pagas por um ano e uma por sete; em tão pouco tempo, dotei os meus institutos de vinte mil francos anuais de renda e guarneci-os de móveis, roupas de cama, etc., no valor de mais de 20 mil francos. Tenho neles suficientes alimentos, bebidas, tenho sabão, açúcar, café, azeite de Niza e manteiga da Morávia para ano e meio; estou gordo, maciço, grande, forte, robusto, branco e corado, não beato e mais alegre do que Napoleão III, etc. Portanto tenho motivos para dar graças a Deus e confiar na sua bênção para o futuro. Os nomes dos três Institutos são:

1.o Casa do Sagrado Coração de Jesus (missionários); 2.o Casa do Sagrado Coração de Maria (Irmãs de S. José da Aparição); 3.o Casa da Sagrada Família (Ir. Catarina Valério T. F., de Verona), a qual mantém uma escola à qual assistem muçulmanas e hereges de todas as classes e que entre as suas cinco mestras conta com Luísa e Domitila.

Reze pelo pobre P.e Comboni e pelos seus institutos. Temos 38 graus; saudações a todos, homens e mulheres.



Seu af.mo

P.e Daniel Comboni






322
Mons. Luis Ciurcia
0
Cairo
2. 8.1869

N.o 322 (302) - A MONS. LUÍS CIURCIA

AVAE, c. 23

V. J. M. J.

Cairo, 2 de Agosto de 1869

Excelência rev.ma,

[1933]
Tardei em responder à sua venerada carta de 13 de Junho, primeiramente para amadurecer o conteúdo, seguindo o seu sábio conselho. E depois porque julguei necessário responder com obras ao ponto mais importante, o de encontrar e preparar uma casa separada, o que me exigiu uma infinidade de passos, de despesas e esforços que, graças à ajuda do Céu, foram coroados de um feliz resultado.

Penso que conseguirei dar uma resposta completa aos quatro pontos que me assinalava na sua carta, comentando algumas observações que V. E. teve a suma bondade de me comunicar que lhe tinham sido feitas pela Sag. Congr. da Propaganda Fide.


[1934]
E em primeiro lugar não me parece demasiado exacto o juízo do Em.mo card. Barnabó de que o meu instituto carece de sólidas bases. V. E. rev.ma sabe perfeitamente que as suas bases são as mesmas que têm a maior parte das instituições religiosas nos começos, menos a propriedade de imóveis, quer sejam edifícios quer terrenos; e alimenta a mais firme esperança de que tal base, assente no amplo regaço da Providência, que é dona dos acontecimentos e dos tempos, esteja para se tornar sólida. De facto, assenta primeiramente na paternal protecção de V. E. rev.ma, cujo consentimento na existência do mesmo e cuja firmeza e caridade em proteger a sua conservação são a mais segura garantia de que tem uma boa base.


[1935]
Em segundo lugar, sabe V. E. quanta e qual é a protecção de que goza do Governo de S. M. a imperatriz da França. Em terceiro lugar, a sua forma e o fim que persegue é tal que não pode nem deve provocar susceptibilidades nem sérios temores em nenhum dos outros corpos morais existentes no lugar, os quais até agora prodigalizaram uma benévola indulgência. O seu objectivo está perfeitamente definido: a evangelização da raça negra. Isto quanto ao exterior.


[1936]
No que respeita à direcção interna, o insto. feminino baseia-se na cooperação das Irmãs de S. José da Aparição, cuja regra foi aprovada pela Igreja e cujo protector é o próprio Em.mo cardeal-prefeito da Propaganda. O masculino tem agora quatro jovens sacerdotes de boa vontade e saúde, que não carecem dos dotes necessários para cumprir as obrigações do seu ministério.

E no caso de eu morrer ou de o pequeno seminário de Verona não poder fornecer em quantidade suficiente novo pessoal, se se considerasse oportuno, poder-se-ia contar com o concurso da ordem camiliana para prosseguir a obra.


[1937]
Por outro lado, o meu instituto teve sempre os seus regulamentos e horários ajustados às normas dos outros institutos, mas com as particularidades que se adequam à sua finalidade. E começou e continua o seu trabalho em favor dos pobres negros abandonados a todas as misérias.


[1938]
Quanto aos meios de subsistência, o meu insto. apoia-se nas mais sérias e intensas simpatias das pias associações aprovadas pela Igreja para ajudar o apostolado católico e de ilustres e poderosos benfeitores do meu conhecimento particular:

1.o A Sociedade de Colónia para o Resgate dos Negros obrigou-se por escrito a entregar anualmente 5000 francos, verbalmente, a dar 10 000; e, de facto, em ano e meio, contribuiu com 18 300 francos.

2.o A Propagação da Fé de Lião e Paris (graças à eficacíssima intervenção de V. E.), atribuiu 5000 francos, com a promessa de aumentar esta importância à medida do desenvolvimento da obra.

3.o Tenho esperança de ajudas das sociedades de São Ludovico, de Munique (deu duas vezes 1500 francos), da Imaculada Conceição para o Oriente, de Viena (deu 100 francos), do Santo Sepulcro, de Colónia (deu 500 fr.), das Escolas do Oriente, de Paris (deu 200 fr.), da Santa Infância, de São Francisco de Sales e da Obra Apostólica, de Roma, Lião e Paris, etc., etc.

4.o Tenho as aplicações das missas quotidianas dos sacerdotes missionários, que agora são quatro.


[1939]
5.o Consegui obter em pouco tempo, quase sem pedir, 9642 francos de benfeitores privados, de entre os quais sobressaem S. M. a imperatriz Maria Ana em Praga, S. A. o príncipe real da Saxónia e sua augusta esposa, o príncipe de Löwenstein (o que no dia 11 de Abril depositou aos pés do Santo Padre um milhão), o príncipe D. Alexandre de Torlonia, o barão de Havelt, o cardeal-pr. De Schwarzenberg, o card.-arcebispo de Viena, o príncipe-arcebispo de Salzburgo, a infanta de Portugal, etc., etc., etc.

6.o Do Governo francês, que nas minhas duas expedições de 1867 e 1869 me proporcionou a poupança de mais de 11 000 francos graças à concessão gratuita de passagens e do transporte de caixotes, espero uma forte subvenção a cargo do fundo oriental, esperança que alguns chefes do Departamento dos Estrangeiros me fazem nascer.

7.o Os institutos dispõem de mobiliário, utensílios domésticos, rouparia e objectos de culto num valor superior a 20 000 francos.


[1940]
Quanto à casa, sabe V. E. os passos que tive que dar para a conseguir gratuitamente de S. A. o vice-rei, munido como estava de válidas recomendações. Apesar de tantos obstáculos e recusas e do ambiente desfavorável que em geral predomina contra os pobres negros, tenho esperança de conseguir dentro de algum tempo duas casas ou da generosidade do Governo egípcio ou com o dinheiro que a Providência saberá depositar nas minhas mãos. Em todo o caso, hic et nunc, os institutos dispõem de duas casas pagas por um ano e de uma terceira paga por mais de seis anos. A casa masculina (que nós chamamos do Sagdo. Coração de Jesus) está a mais de oitocentos passos de distância do instituto confiado às Irmãs de S. José (a que nós chamamos Casa do Sagdo. Coração de Maria) e a cento e setenta e cinco passos da escola dirigida pela M. Catarina Valério T. F. (que nós denominamos Casa da Sagrada Família). Quando, a seu tempo, os institutos puderem estender o seu campo de acção à África Central, a que estão especificamente destinados, espero que V. E. nos fará desfrutar de uma das casas já existentes nesse vastíssimo vicariato.

A tudo isto devo acrescentar que existem em muito mais abundância e numa esfera maior fontes de subsídios com as quais posso seriamente contar para o futuro, no caso de a obra se desenvolver como é devido.


[1941]
Entretanto, dado que sempre desejei as cruzes como salutares e necessárias para a prosperidade das obras santas e dado que o bom Jesus mas deu em abundância, apesar da minha indignidade, sinto-me ditoso por adorar com total resignação as disposições da Providência, a qual permitiu que o nosso venerado Em.mo card.-prefeito, com donaire, produzisse um detrimento não pequeno nos meus recursos, porque ao ir dizendo aos ouvidos de muitos que Comboni é um m..., um t... que se deve atar com catorze cordas, etc., tal comentário estendeu-se por Roma, percorreu a Itália e França e talvez tenha chegado à Alemanha, esfriando ou deixando alguns receosos e teve o poder de me dissuadir de dar certos passos que só na minha última viagem à Europa me teriam permitido ter angariado mais de cem mil francos.


[1942]
A julgar por estes dados e expectativas, não me parece que se deva concluir que o meu instituto carece de bases sólidas. Não poucos estabelecimentos de outras missões contam com bases menos sólidas que o meu instituto, que ao fim e ao cabo tem dezoito meses de vida e, em tão curto espaço de tempo, suportou tantas e tais tormentas que, se as suas bases não fossem suficientemente sólidas, já há tempos se teria afundado.


[1943]
E nem tão-pouco me parece demasiado exacta a outra afirmação do em.mo cardeal, isto é, que por falta de uma regular organização houve os inconvenientes que em geral lhe foram referidos. A organização do meu instituto, attentis specialibus circumstantiis, foi regularíssima. Desde o princípio tive regulamentos muito adequados, adaptados ao lugar e às finalidades, assim como horários tanto quotidianos como para o tempo dos exercícios espirituais, dos retiros mensais, etc.; e estes regulamentos e horários foram observados. Possuo uma carta autografada que me escreveu o tal Zanoni, o qual foi o único autor dos deploráveis inconvenientes, na qual declara insuportável, demasiado severa e de cartuxos a organização interna e regular do meu instituto.


[1944]
Se a falta de uma regular organização tivesse sido o motivo dos problemas havidos, estes teriam surgido não num velho religioso de 49 anos, mas mais provavelmente num jovem de 28 anos e noutro de 22. Porém, destes dois bons companheiros meus, quem foi capaz de dizer uma palavra desfavorável sobre a sua conduta, à excepção do infeliz Zanoni, que se reconheceu indigno de viver com eles e há pouco menos de um ano se afastou da maneira que V. E. sabe? Não houve, pois, falta de regular organização: o que houve foi uma daquelas artes malvadas que Deus permite ao Demónio experimentar nas suas obras, para que elas ganhem solidez e o Inferno seja vencido. Judas no colégio apostólico, Fr. Elias ao lado do seráfico patriarca, as apostasias no seio da Igreja e das ordens religiosas, etc., podem considerar-se problemas surgidos por falta de organização regular?


[1945]
É-me doloroso ver que, em certo modo e em geral, se atribuem ao meu instituto as culpas de um indivíduo. Existiram os problemas, mas no acusador, não nos acusados. Por isso, desejaria que Sua Em.a visse aqui um caso totalmente diferente, como o é de facto. E, em vez de lançar repetidamente a culpa ao instituto, deveria ver a real inocência do mesmo, ao lado de uma indigna perfídia, que lança como calúnia sobre ele aquilo do que ela só é culpável. O Em.mo cardeal-prefeito nem sequer pode acusar-me de imprevidência por eu ter confiado a Zanoni a vigilância imediata do insto. feminino. Esse velho, com 49 anos às costas, tinha a barba branca e tinha desempenhado durante mais de quinze anos cargos de importância e ocupado o lugar de prefeito numa das casas da sua ordem, em Mântua. Segundo a minha opinião, isso era garantia suficiente para ter confiança em Zanoni; e, a dizer a verdade, eu teria duvidado mais de mim mesmo do que dele. Porém, bendito seja sempre o Senhor, que quis dar-me com isso uma grande lição, a qual me será muito útil para aprender a agir mais cautelosamente no futuro.


[1946]
Por fim, passando às explicações que V. E. rev.ma tem a bondade de me pedir sobre o P.e Guardi, a ordem camiliana e os meus dois caros companheiros, Carcereri e Franceschini, aos quais se referem as estimadas observações e insinuações que lhe dirigiu S. Em.a, eis aqui os factos verdadeiros.

Em Março de 1967, tal como todas as outras ordens, também a dos ministros dos doentes foi suprimida. Não querendo os padres Carcereri e Franceschini voltar, como fizeram outros, ao seio das suas famílias, juntamente com dois companheiros pediram para ir para as missões estrangeiras, desejo que alimentavam há muito tempo. O P.e Guardi, então procurador-geral, acatou a vontade do provincial, que tinha esperanças postas nestes religiosos, e negou-lhes por então a autorização, aconselhando-os a que esperassem os acontecimentos.


[1947]
Entretanto, mons. o bispo de Verona, informado das intenções dos quatro, pensou aproveitá-los para a África e apoiou o pedido que eles fizeram ao Santo Padre por meio da S. Congr. de Ob. e Rel., não sem informar explícita e exactamente Sua Santidade da recusa que os peticionários tinham obtido do seu geral. Este pedido foi atendido mediante pont. breve de 5 de Julho, que pôs os referidos padres sob a jurisdição do bispo de Verona ad quinquennium. Os seus superiores opuseram-se ainda à partida e até tentaram várias vezes reclamá-los depois da sua chegada ao Egipto. O próprio Em.mo cardeal Barnabó, induzido pelo P.e Guardi, do qual é íntimo amigo, insinuou a Carcereri e Franc. o regresso com carta de 15 de Setembro do ano passado. Em vista de tanta insistência do estimadíssimo cardeal-prefeito e do P.e Guardi, convertido no vigário-geral dos camilianos, assaltaram-me sérios temores de perder para a África não só estas duas pessoas que compreendem tão bem a importância da nossa obra como também outras da mesma ordem, que possuem iguais dotes e disposições para se encarregarem do difícil apostolado da África Central.


[1948]
Por isso pus-me a meditar e estudar seriamente, juntamente com o nosso querido P.e Estanislau, para encontrar a maneira de conciliar o bem da Nigrícia e os interesses da minha obra nascente com as insistentes declarações do em.mo card.-prefeito e com os razoáveis desejos do P.e Guardi. Pensámos, portanto, que, no caso de parecer bem a V. E. rev.ma, seria muito conveniente que, pouco a pouco, se criasse dentro do recinto do instituto masculino, ou a pouca distância dele, uma pequena casa camiliana in adiutum dos institutos de negros, que se atendesse especialmente aos doentes, com o objectivo de que, desenvolvendo-se bem esta obra, se pudesse confiar mais tarde à Ordem dos Ministros dos Doentes a evangelização de uma entre as mil tribos dos negros da África Central. Para essa finalidade seria fácil à nossa obra atribuir uma parte dos seus recursos.


[1949]
E esta, monsenhor, foi a ideia a que pensava aludir numa das cartas que lhe escrevi ultimamente. Depois de a termos submetido a cuidadosa reflexão, fomos de opinião que poderia levar-nos a uma solução muito razoável e feliz e ser fecunda em grandes benefícios para a pobre Nigrícia. Porém, é isso: uma ideia. O P.e Carcereri mencionou-a no princípio deste ano ao P.e Guardi e, depois, não se disse nem fez mais nada. Não vejo, pois, por que motivo o P.e Guardi fala de iniciativa, que nunca lhe foi pedida, e de comprometer a sua ordem, à qual nunca ninguém se dirigiu de forma oficial, nem da parte dos meus institutos nem da missão.


[1950]
Quanto aos padres Carcereri e Franceschini, em nenhum momento se consideraram separados da sua ordem, antes, apoiados na sua resposta, lutaram com o P.e Guardi, que ameaçava considerá-los como tais; nem por mim, nem pelo bispo de Verona, nem por ninguém que eu saiba, foram ou são olhados como separados da sua ordem. Por isso, encontro-me em idêntica situação que Sua Eminência: a de não saber sobre que base nem por quem Carcereri e Franceschini são considerados como desligados da sua ordem.

Além disso estou em condições de assegurar a V. E. que nem o bispo de Verona nem eu fizemos diligência alguma sobre isso com essa ínclita ordem.


[1951]
Nós vivemos da graça de Deus e da paternal protecção de V. E. rev.ma Por difícil que seja a empresa em que estamos embarcados e que procuramos levar a bom porto, por mais furibundas que sejam as tempestades que nos possam surpreender; apoiados no Senhor e em V. E. não temeremos nada. Entretanto, insistimos na oração. As palavras de Cristo são mais sólidas e seguras que todos os tratados das potências do mundo; por isso o petite et accipietis é mais sólido e seguro que o Tratado de Viena de 1815, que o de Paris de 1856, que o de Nikolsburgo e Praga de 1867 e até que a Convenção de 15 de Setembro de 1864, etc. Atque roga-se pela nossa obra em toda a parte, ergo alcançaremos um resultado feliz no nosso desígnio, non obstantibus mundo et diabolo.

Digne-se V. E. rev.ma acolher benignamente as minhas mais sentidas expressões de agradecimento, também por sua gratíssima carta de 19 do mês passado. Todos nós lhe pedimos a sua bênção pastoral, enquanto com sentimentos da mais profunda veneração e gratidão passo a subscrever-me



De V. E. Rev.ma

Hum., devot.mo e indig. filho

P.e Daniel Comboni






323
Mgr. Joseph De Girardin
0
Cairo
7. 8.1869

N.o 323 (303) - A MGR. DE GIRARDIN

AOSIP. Afrique Centrale

V. J. M. J.

Cairo, 7 de Agosto de 1869

Monsenhor,

[1952]
No passado mês de Dezembro, encontrando-me em Paris, tive a sorte de lhe dar a conhecer num pequeno relatório a importância dos meus institutos do Egipto, no tocante à preparação de pessoal para a conversão da Nigrícia interior. Também lhe apresentei a carta de recomendação de mons. Ciurcia, arcebispo de Irenópolis, vigário apostólico do Egipto e superior do vasto vicariato da África Central, a fim de solicitar à Obra da Santa Infância que venha em ajuda de uma obra da qual depende por certo a conversão de tantos povos da Nigrícia Central.


[1953]
O senhor teve a bondade de me fazer esperar boas ajudas na próxima partilha geral das esmolas da obra; porém, embora nós continuemos a resgatar da morte eterna muitos meninos infiéis, sobretudo de raça negra, que foram rejeitados e abandonados e ficaram doentes, até agora, monsenhor, não recebi nada. É meu desejo, pois, renovar a minha humilde petição, rogando-lhe que rapidamente acorra em ajuda das três casas que fundei no curto espaço de tempo de dezoito meses com enormes sacrifícios. Como compreenderá, é sobretudo nas fundações que se precisa de maiores recursos, a fim de que o mais rápido possível nos possamos lançar, com os elementos formados no Egipto, no centro da África para ir em ajuda das populações mais infelizes e mais abandonadas da Terra.


[1954]
Tive ocasião de lhe explicar duas vezes o alcance, a importância e a história da missão da África Central, erigida por Gregório XVI. Limito-me agora a dizer-lhe umas breves palavras sobre os meus institutos do Egipto, que se destinam a formar missionários negros dos dois sexos para se tornarem depois apóstolos nos seus países do centro.

O primeiro instituto é de missionários e chama-se Casa do Sagrado Coração de Jesus. Compõem-no quatro missionários, um leigo e três negros. Os primeiros ocupam-se de tudo o que diz respeito ao ministério sacerdotal e sobretudo da instrução dos alunos negros e das catecúmenas. Também se ocupam da direcção espiritual dos outros dois institutos.


[1955]
O segundo instituto, o das professoras negras, chama-se Casa do Sagrado Coração de Maria e para ele chamei as Irmãs de S. José da Aparição. É formado por três irmãs e dezassete professoras negras. A sua finalidade é formar boas professoras negras para a educação e o apostolado das nativas da África Central. Anexa a esta casa está a enfermaria, um pequeno hospital para as negras doentes e para os meninos abandonados.


[1956]
O terceiro é chamado Casa da Sagrada Família, porque se encontra a vinte e cinco passos da santa gruta, onde a Sagrada Família, exilada no Egipto, viveu durante sete anos. O seu pessoal é constituído por duas irmãs da Ordem Terceira, claustrais, que trouxe de Verona depois da supressão das ordens religiosas na Itália, e por cinco professoras negras, que ensinam em árabe, italiano, francês e dinca. Esta escola é frequentada por hereges e infiéis e goza de renome por serem negras as que ensinam.


[1957]
Compreende, sr. director, que, para edificar três casas, dotá-las de tudo o que precisam e manter nelas mais de cinquenta pessoas, é preciso muito dinheiro. Pense que estas três casas são o centro de propagação do apostolado da África Central. E esta constitui a missão mais difícil e importante do catolicismo, dado que o Evangelho nunca penetrou nestas populações, que ultrapassam o número de cem milhões de infiéis. Falo-lhe com todo o conhecimento de causa, porque fui um dos missionários que atingiram, depois de seis meses de contínua viagem, até aos quatro graus de latitude. De trinta e nove missionários, só ficámos seis – dos quais eu sou o único que trabalha; os outros trinta e três morreram naqueles países abrasadores.

Depois de doze anos do mais difícil apostolado, peço-lhe uma ajuda muito forte, porque tenho uma extrema necessidade dela. Sei que ajuda não só a China mas também a pobre África. Peço-lhe com lágrimas nos olhos que me favoreça. Deus recompensará o seu zelo e as pias associações serão abençoadas por uma multidão de almas salvas.

Receba, monsenhor, a afirmação da minha mais alta estima e a expressão do meu agradecimento para com a sua pessoa, da qual serei sempre



Seu devot. servidor

P.e Daniel Comboni

Miss. ap. da África Central

Superior dos instos. de negros do Egipto



Original francês

Tradução do italiano






324
Autógrafo em foto
1
Cairo
7. 8.1869
N.o 324 (304) - AUTÓGRAFO NUMA FOTO

AFV, Versailles



Cairo, 7 de Agosto de 1869





325
Contrato arrendamento
1
Cairo
9. 8.1869
N.o 325 (306) - CONTRATO DE ARRENDAMENTO

ACR, A, c. 18/34



Cairo Velho, 9 de Agosto de 1869





326
Claude Girard
0
Cairo
27. 8.1869

N.o 326 (307) - A CLAUDE GIRARD

AGB

V. J. M. J.

Cairo, 27 de Agosto de 1869

Meu caríssimo amigo,

[1958]
Rogo-lhe que fale no Terra Santa sobre a distribuição dos prémios das escolas cristãs: foi verdadeiramente magnífica. Faça um belo artigo, mas não diga que fui eu quem lhe escreveu; eu estou ainda nos inícios e convém-me andar com um certo cuidado aqui no Egipto. Eis um resumo:

«O dia 23 de Agosto foi um dos dias mais belos para a capital do Egipto e para os católicos. Quem de tarde tivesse percorrido as ruas do Cairo ter-se-ia deparado com uma afluência extraordinária de toda a sorte de pessoas, provenientes não só dos muito extensos bairros da cidade mas também da periferia: Bulai, Cairo Velho, Scubra, etc.

A meta desta extraordinária afluência era a grandiosa instituição dos Irmãos das Escolas Cristãs, onde a juventude mais distinta do Egipto e da colónia europeia dava a prova anual do seu aproveitamento nos estudos.


[1959]
Aqui onde em tempos antigos os sábios da Grécia vinham aprender a sua ciência, aperfeiçoar as suas leis; aqui onde os restos de tantos monumentos seculares revelam ainda o imenso desenvolvimento do génio artístico dos antepassados, porém, onde agora reina desde há tantos séculos a mais deplorável ignorância consumada sobre as leis do Alcorão; aqui, dizia, ouvir as mais graciosas récitas efectuadas de uma maneira muito distinta e com uma espontaneidade admirável e, ainda por cima, simultaneamente em três ou quatro línguas, como o árabe, o francês, o turco, o italiano, o inglês, o grego e o hebraico; presenciar uma dramaturgia autêntica, engenhosa, livre, nobre e original; escutar concertos de coros musicais, acompanhados a piano e a instrumentos de corda e de sopro, em que eram executantes alguns dos maiores mestres da arte, com uma segurança, uma espontaneidade e uma precisão muito acuradas; recrear-se com as exposições ao público de pinturas e desenhos encantadores, de mapas, de belíssimas e raras caligrafias de todo o tipo, de cópias e originais, de colecções de geologia, botânica e mineralogia, de belas formas de arquitectura e de mil produções mais do talento que não são fáceis de descrever e tudo realizado por uns rapazes geniais, pertencentes às cinco classes e onze subdivisões do colégio e por meninos da escola gratuita, dividida em duas classes e cinco subdivisões, todos eles com idades entre os seis e quinze anos, foi um espectáculo que surpreendeu e arrebatou tanto os orientais como os europeus.


[1960]
Saudamos com muita alegria esta época em que se desperta no Egipto o amor à ciência, de que é mostra o acto a que assistimos com profunda emoção. O admirável zelo dos Irmãos das Escolas Cristãs, à frente das quais está o incomparável Ir. Ildefonso, merecia em absoluto esta aprovação solene que lhe deram toda a classe de cidadãos, os chefes de todos os institutos da capital, os bispos, bem como personalidades ilustres da vida civil e militar e europeus.

Esta maravilhosa distribuição de prémios foi presidida pelo digno representante da França no Cairo, Mr. Franco, acto a que assistiram, além disso, os cônsules de Inglaterra, Bélgica, Pérsia, Grécia, Espanha, Prússia, etc., assim como muitos dignitários do Governo egípcio, como SS. EE. o paxá Haffiche, o Paxá Arekf, Hussein Bey, prefeito da polícia e muitas outras personalidades da casa do vice-rei e do Governo.


[1961]
O instituto dos Irmãos das Escolas Cristãs é um dos elementos mais importantes do apostolado católico e da civilização cristã e europeia no Egipto. Aqui se admiram e se aprendem todos os progressos dos estudos europeus. O bem que fazem estes generosos filhos do venerável De La Salle, cuja influência atinge já o universo inteiro, pelo qual propagam a civilização com as suas 1300 casas, é algo que se comprovará no futuro. Todavia, o instituto dos irmãos deu já grandes frutos no Egipto. Muitos dos que nele terminaram com louvor os seus estudos ocupam já importantes cargos no regime e estão presentes com a sua acção em diversos gabinetes do Governo.


[1962]
É um prazer para nós dirigir os nossos elogios mais justos e sinceros a estes verdadeiros iniciadores da civilização moral e intelectual do Egipto e congratularmo-nos com eles. A França, essa generosa protectora e propagadora da civilização europeia, encontra uma boa recompensa nos irmãos, porque, por meio deles, estende a sua influência no Oriente. Ela merece-o, pois onde houver uma causa católica e humanitária, lá está sempre a França. Porém, os irmãos servem sobretudo a causa da Igreja, mediante o admirável exemplo que dão aos povos com a sua santa e ordenada vida e com as sublimes máximas de moral e do espírito que imprimem nos corações dos seus alunos, etc.»


[1963]
Meu caro amigo, com estas sugestões, faça o senhor mesmo um esplêndido artigo para o Terra Santa. Asseguro-lhe que raramente se vê na Europa, nem sequer em Paris, tão estupenda e solene cerimónia da distribuição de prémios como a do Cairo.

Apresente os meus respeitos a sua esposa e filhos e aos padres de La Salette, etc.



Seu amigo para sempre

P.e Daniel Comboni



Original francês

Tradução do italiano






327
Mons. Luis de Canossa
0
Cairo
2. 9.1869

N.o 327 (308) - A MONS. LUÍS DE CANOSSA

ACR, A, c. 14/68

Louvados J. e M. eternamente, ámen.

Cairo, 2 de Setembro de 1869

Excelência rev.ma,

[1964]
Estamos impacientes por receber umas estimadíssimas linhas, porque há já mais de dois meses estamos em jejum delas. Monsenhor o delegado está há um mês em Damasco a retemperar a saúde. Durante todo o Verão tivemos um calor sufocante: em casa estavam uns 40 a 45 graus e à nossa porta, ao sol, uns 60 a 66. E isto desde o meio-dia até às três da tarde. O nosso querido P.e Bártolo passou um mau bocado por causa disso, mas já está melhor. Se eu tivesse cinquenta missionários como ele, converteria meia África. Contra o que eu esperava e contra o seu aspecto externo, tem qualidades eminentes e próprias de um missionário. Que Deus no-lo conserve muito tempo, para nossa edificação e para o bem da Nigrícia!


[1965]
O P.e Zanoni escreveu-me oferecendo-se para regressar. Disse-me que tinha o projecto de fundar noutra localidade, segundo o nosso Plano, um novo instituto e ofereceu-se-me de corpo e alma. Nós sabemos positivamente que não exporia a sua ideia a ninguém, nem ao bispo de Verona. Só abriu o seu coração à sra. Margarida Tommasi, a qual, por outro lado, esquecendo o ocorrido entre ela e mim, quer, de acordo com Zanoni, trabalhar para a obra. Eu adoptei o processo da abstenção, aprovado por V. E. e nunca escreverei a Zanoni. E junto com os meus companheiros, seria de opinião de não nos comprometermos nem pouco nem muito com a sra. Tommasi, que, com a sua imprudência e loquacidade, só traria descrédito à obra, poria em perigo a dignidade da mesma e quereria ficar com o dobro do que recolhesse e viver da obra, abusando do cargo de cobradora para prover às suas necessidades. Se por acaso se apresentasse a V. E. por este motivo, peça-lhe a relação específica das pessoas e dos países de onde recolheu os donativos do ano passado, uma vez que é dever de uma boa administração prestar contas de tudo. Verá como não há nada que fazer.


[1966]
As nossas três casas vão bem. Monsenhor o delegado escreveu-me a dizer que tinha feito um novo relatório para o cardeal, em tudo favorável a nós; e como eu lhe tinha preparado um relatório sobre as nossas casas antes da sua ida para a Síria, voltou a escrever ordenando-me que lhe fizesse uma cópia do mesmo para a mandar à Propaganda. Monsenhor, confiemos nesse Deus que quer que a nossa obra nasça ao pé da cruz. No dia de S. Caetano, o duque de Módena mandou-me uma bonita carta escrita por seu punho, na qual incluía gentilmente uma letra cambial da Banca Austríaca no valor de quinhentos francos. Confiemos em Deus.


[1967]
Nós rogamos e suplicamos ao seu coração paterno para que nos envie com o P.e Ângelo de Pirano a professora Ângela Degani, que a madre Valéria formará como missionária da África. Não tenho mais papel para explicar a V. E. quão útil e necessária nos pode ser. O P.e Carcereri, a M. Catarina e eu suplicamos-lhe in visceribus Christi que nos escute e nos mande a professora Degani.

Temos muitos assuntos para tratar na época do concílio. Nós preparamo-nos para ele com oração e com as cruzes, duas coisas que nos são muito queridas.

As minhas considerações mais distintas ao marquês Octávio, a P.e Vicente e a mons. o vigário



De seu hum. e devot.mo filho

P.e Daniel Comboni



Receba os respeitosos cumprimentos de todos nós, que pedimos a sua santa bênção.

O outro dia baptizei in articulo mortis uma menina infiel; há duas horas Carcereri baptizou outra.






328
Mons. Luis de Canossa
0
Cairo
8. 9.1869

N.o 328 (309) - A MONS. LUÍS CANOSSA

ACR, A, c. 14/69

Louvados J. e M. eternamente, ámen.

Grande Cairo, 8 de Setembro de 1869

Excelência rev.ma,

[1968]
Talvez V. E. se encontre no sagrado retiro dos santos exercícios e não duvido que rezará pelos seus filhos de África. Quão generoso é o Senhor nas suas bênçãos e quão abundante é igualmente nas suas cruzes, que se revelam como meio absolutamente necessário para levar a cabo as suas obras. Estou a escrever-lhe usando só um olho, porque o outro está com dores, afectado de conjuntivite egípcia.


[1969]
Lembre-se de recomendar ao piedoso clero veronês que eleve fervorosas orações por nós quando estiver recolhido nos santos exercícios no seminário. Nós faremos outro tanto. A omnipotência da oração é a nossa força.

Embora no espaço de quarenta dias as Sociedades de Colónia me tenham mandado cinco mil francos, no dia de S. Caetano (em que S. A. o duque de Módena me enviou uma bela carta, juntando uma pequena letra cambial sobre o Rotschild de Paris) escrevi a esse presidente pedindo-lhe que me mandasse outros cinco mil, porque, com outro dinheiro que tenho, quero comprar, por bom preço, uma pequena casa. Eis aqui a resposta, assinada pelo presidente e por todos os demais membros da ínclita sociedade:



(Original francês, traduzido do italiano)



«Colónia, 19 de Agosto de 1869



Muito rev.do padre,


[1970]
Recebemos a sua carta, que contém relatórios muito interessantes sobre a sua obra e por bondade da Divina Providência reunimo-nos hoje todos os membros do nosso comité em sessão extraordinária, para submeter a deliberação e discussão as propostas que nos mandou. Compreendemos bem que seria de grande importância possuir uma casa para os seus institutos, em vez de pagar tão elevadas somas pelo aluguer. Até agora confiámos tudo ao seu admirável zelo e à sua grande sagacidade; depositamos igualmente em si a responsabilidade dos gastos extraordinários que vai realizar.


[1971]
Estamos convencidos de que o senhor age conscienciosamente no interesse da nossa obra e, por isso, decidimos conceder-lhe a soma de dez mil francos (quinhentos napoleões de ouro), que pomos inteiramente à sua disposição e que receberá do nosso banqueiro A. Schaffhausen, de Colónia.

Mons. Meurin, da Companhia de Jesus, bispo de Bombaim, na Índia, que o viu no Cairo, deu-nos muito boas notícias dos seus institutos no discurso muito eloquente pronunciado na Burgergesellschaft, no domingo passado. Estas boas notícias não podem senão aumentar o nosso interesse pela sua santa obra e animar-nos a ajudá-lo no que for possível.

Avisamo-lo de que a imperatriz de França se dispõe a partir para o Egipto, etc., etc.

Aceite a manifestação do nosso profundo respeito e creia na sincera devoção que lhe dedicam todos os membros do comité da Sociedade de Colónia para a Conversão dos Pobres Negros.



(seguem-se as assinaturas do presidente e de todos os membros)


[1972]
Monsenhor, dez mil francos com as declarações de uma tão bonita carta destes senhores que, tendo-se obrigado a passar-me só cinco mil francos por ano, me deram, ao invés, 28 300 francos em vinte e um meses, é tudo menos uma bofetada. Outro membro da mesma sociedade escreveu-me uma carta em inglês com o resumo do discurso do mencionado bispo sobre o Plano e a obra e o pobre P.e Daniel. Pois bem, eu fico vermelho com os elogios formulados por esse bispo jesuíta, porque estou profundamente convencido de não os merecer e de ser o servo mais inútil da terra. Porém, aceito-os por interesse pecuniário. O dinheiro é uma grande tentação de Nosso Senhor Jesus Cristo!


[1973]
O mesmo bispo, junto com um outro, falou no mesmo sentido na reunião do conselho da Propagação da Fé, em Lião; noutra carta transcrever-lhe-ei a carta desse presidente. O ab. Negrelli comunicou-me de Reichstadt que mons. Bragato tem as minhas petições preparadas para, no momento oportuno, as apresentar a SS. MM.


[1974]
Os nossos bons missionários estão muito bem de saúde. O P.e Carcereri nunca esteve mal, nem sequer uma hora, por efeito do sol africano. A Casa do Sagdo. Coração de Maria vai bem, porém, tive lá duas irmãs muito doentes. Um bom médico do Cairo, por lhe ter dado só uma moeda de 20 francos pela visita, não voltou mais. É um italiano de Pisa. Pelo contrário, o meu médico turco, bastante capaz, que desde há ano e meio vem quase todos os dias, nunca quer um centavo: apenas a minha amizade. Reza diariamente a Maomé por nós e diz que não há sobre a Terra homens semelhantes. Porém, são raros estes muçulmanos bons.

Apresente os meus respeitos ao marquês Octávio e a toda a nobre família, e a mons. o vigário, a Perbellini e P.e Vicente. Encomende-nos às orações do sr. reitor do seminário o M. R. P. Dorigotti, etc., etc. Foi-nos muito grato ler a carta da superiora das canossianas na China; temos que formar uma liga de orações.

Beijo-lhe o sagrado anel, declarando-me nos sagdos. Corações de J. e Maria



De V. E. Rev.ma

Hum. e obed.mo filho

P.e Daniel Comboni



A madre Catarina e a Casa da Sagrada Família vão muito bem.






329
Mensagem a Pio IX
0
Cairo
19. 9.1869

N.o 329 (310) - MENSAGEM A PIO IX

«L’Unità Cattolica» n.232 (1869), p. 1076

Cairo, 19 de Setembro de 1869

Beatíssimo Padre,

[1975]
Neste dia, consagrado a honrar as dores maternais da Virgem Imaculada, recordando-nos das que sofreis diariamente pela mais santa das causas, é uma grande alegria para nós unirmo-nos a toda a ordem de pessoas que, de todas as partes do mundo católico, se dispõem a dar-vos testemunho do seu afecto de filhos também na faustíssima circunstância do concílio ecuménico, no último dos esplêndidos acontecimentos do vosso glorioso Pontificado.

Destas inóspitas areias reiteramos o conforto dessa homenagem de amor filial e de fé ilimitada, que, há poucos meses, nos levou aos vossos pés para nos congratularmos com a nobre e católica juventude italiana do solene quinquagésimo aniversário do vosso santo sacerdócio e consolar-vos das muitas amarguras que vos causam tantos irmãos nossos irreflectidos, enquanto manifestamos a mais terna e decidida adesão à causa que vós representais e sustentais tão valorosamente.


[1976]
Lançados pela vontade divina e pela vossa santa palavra para estas lonjuras, não só não diminuiu em nós o afecto e a veneração que na pátria sempre nos gloriámos de vos professar mas até podemos afirmar que vós vos tornais cada dia para nós algo mais sagrado, uma maravilha mais surpreendente, uma alegria mais forte. Na triste solidão que nos cerca, o vosso nome é a mais doce das nossas recordações; a vossa imagem, a mais grata das nossas companhias; a vossa história, o objecto mais frequente das nossas conversações. Cada dia rezamos por vós, falamos de vós, pensamos em vós, sofremos convosco e jamais nos surpreende a noite sem ter obtido dos nossos alunos um suspiro e uma oração por vós.


[1977]
Adorado Pontífice e Rei, que o Céu vos guarde por largos anos para glória da Igreja, para defesa da justiça, para conforto da sociedade, para apoio dos bons e para prosperidade das missões católicas, já que em Vós se compendiam todos os interesses espirituais e sociais da pobre humanidade: todo o mundo, mesmo sem querer, vos olha a vós e hoje, perante vós, todos ou tremem ou esperam. Nunca o pontificado católico foi tão importante para o mundo inteiro como convosco, nem nunca nenhum romano pontífice exerceu a representação de Deus sobre a Terra tão amplamente como vós.

Desejamos que possais ver coroada de êxito essa grande obra do solene concílio ecuménico, que, sem dúvida por supremo conselho, empreendeste e gozar dos salutares efeitos, que convosco nos é grato esperar dele, na emenda de tantos transviados e na reforma da transtornada sociedade. Apresentando-vos como homenagem e ajuda para o concílio a pequena mas cordial oferta de vinte e cinco liras italianas, prometemo-vos desde agora da nossa parte uma absoluta obediência de vontade e intelecto às decisões que nele se tomarem, dispostos a ensiná-las e defendê-las até com o sangue e com a morte como expressas revelações de Deus.


[1978]
Ao mesmo tempo permitimo-nos suplicar-vos humildemente que nessa circunstância solene façais que se tenham especialmente em conta, além dos interesses e necessidades de todas as outras missões, os das missões da nossa tão infeliz Nigrícia, necessidades que são nela, sem comparação, as maiores que houve até agora e além disso infelizmente as mais desesperadas. E também entre os negros, Santo Padre, há ovelhas que pertencem ao vosso rebanho; também entre os negros há corações capazes de Vos amarem; também entre os negros – e regozijamo-nos de podê-lo afirmar por nossa experiência – Deus tem preparadas grandes alegrias para a Igreja e para vós, Seu Vigário. A hora da salvação parece ter soado também para esta nação duplamente feliz. O grito comovedor das suas seculares desventuras já encontrou resposta no vosso paternal coração. E é nosso desejo que os pastores do mundo católico participem numa centelha da vossa caridade para com a Nigrícia, prometendo-nos com isso umas boas fileiras de diligentes apóstolos, uma cooperação eficaz e unânime e o cumprimento da profética palavra do que, movido pelo Espírito Santo, prenunciou a salvação dos negros dizendo: «Coram illo procedent aetiopes».


[1979]
Este é o voto dos missionários, das irmãs e das professoras, que são os que dirigem a educação dos negros e das negras dos nossos institutos e a escola feminina do Cairo Velho, enquanto vos oferecem quatro novos neófitos adultos, hoje mesmo arrebatados às trevas da infidelidade e regenerados na água baptismal. E tal é o desejo e a oração destes neófitos que, juntos com outros que os precederam na graça do baptismo, fizeram hoje a sua primeira comunhão por vós. E é também a esperança que a vossos pés depositam os nossos catecúmenos, que suspiram pelo momento de vos poder chamar pai.

A vossa santa bênção para estes ardentes anelos dos nossos corações fará com que a redimida Nigrícia não seja a última entre as gloriosas pedras preciosas da vossa preciosa coroa.



P.e Daniel Comboni



[Seguem-se as assinaturas dos membros do instituto]






330
Mons. Luis de Canossa
0
Cairo
9.1869

N.o 330 (311) - A MONS. LUÍS DE CANOSSA

ACR, A, c. 14/70

Louvados J. e M. eternamente, ámen.

Cairo, Setembro de 1869

Excelência rev.ma,

[1980]
Graças ao Senhor o calor passou; estamos já no Outono e agora nas nossas casas não temos mais que 27 ou quando muito 28 graus Réaumur e isto apenas do meio-dia às três da tarde. Contudo, sentimos o peso do prolongado silêncio do nosso veneradíssimo pai e superior, bispo e pastor, que durante três meses não nos comunica nada, nem sequer por interposta pessoa.

Aproveitei a ocasião de quatro solenes baptismos, que administrei na nossa capela do Sagdo. Coração de Maria a duas idólatras de mais de vinte anos, a uma muçulmana de vinte e cinco anos e a um jovem negro de quinze, no domingo passado, festa das Sete Dores e dia de indulgência plenária do B. Pastor (contra o que o nosso amat.mo card. Barnabó escreveu em Lião, isto é, que a nossa obra só tinha 40 dias de indulgência em Verona), aproveitei, dizia, a ocasião desta terna cerimónia e de algumas primeiras comunhões de outros convertidos anteriormente, para apresentar a Sua Santidade Pio ix, em homenagem e ajuda do concílio ecuménico, uma mensagem e uma pequena mas sentida oferta dos nossos três institutos para a regeneração da África; mandei tudo ao nosso venerado P.e Margotti para que, se lhe parecer, o publique na L’Unità Cattolica. A cerimónia do baptismo durou três horas. Todos chorámos. Não lhe posso expressar a ânsia e a sede que, sobretudo as três convertidas, tinham do baptismo.


[1981]
Ao Evangelho fiz a homilia em árabe e também fiz em árabe as práticas antes e depois da comunhão. Entre as presentes havia uma muçulmana, que, a seguir, quis converter-se à nossa fé, mas os pais impediram-na. Ela frequenta a nossa escola. Na segunda-feira seguinte, admiti no instituto uma negra idólatra de 27 anos, que havia mais de dois meses andava atrás de nós, por causa da impressão que lhe tinha feito o ano passado uma das nossas convertidas que agora está no Alto Egipto.


[1982]
Vê, monsenhor e nosso caríssimo pai, vai-se bicando, como se diz em Verona. Porém, a bicada será maior quando agarrarmos os trezentos mil francos que vamos recolher na América.

A imperatriz Carolina, de Salzburgo, enviou-me 150 florins por meio da Sociedade de Colónia. Mas o malandreco do Mr. Girard manda coisas e objectos de culto a todos menos a mim. Manda-os a quem não os precisa, como os arménios e, não há muito, enviou uma caixa de casulas e ornamentos brancos a um padre secularizado de Alexandria, o qual os vende no mercado a preço reduzido para pagar os gastos do envio. Mas eu dei-lho a saber numa carta que lhe escrevi recentemente. Envie-nos a sua bênção, apresente os nossos respeitos ao marquês Octávio e receba as reverências de todos junto com as do



Seu devot.mo

P.e Daniel