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N° Escrito
Destinatário
Sinal (*)
Remetente
Data
831
Mgr. Joseph De Girardin
1
Cartum
02.1879

N.o 831; (792) - A MGR. JOSEPH GIRARDIN

ACR, A, c. 14/137 n. 3

Cartum, Fevereiro de 1879

Carta sobre a carestia.

832
Nota de gastos
1
Cartum
02.1879

N.o 832; (793) - NOTA DE GASTOS

ACR, A, c. 20/32 n. 3


Fevereiro de 1879

833
Card. João Simeoni
0
Cartum
03.03.1879

N.o 833; (794) - AO CARD. JOÃO SIMEONI

AP SC Afr. C., v. 8 ff. 905-908

N.o 5

Cartum, 3 de Março de 1879


Em.o e Rev.mo Príncipe,

[5668]

Graças às repetidas diligências e insistência de Sua Excelência Gordon Paxá para se assegurar a amizade do rei da Abissínia e a tranquilidade nas províncias do Nilo Azul com ela confinantes, Sua Alteza o quedive consentiu em nomear o novo bispo copta herético para os abissínios, o qual, passando pela Núbia e Cadaref, entrará em Adua.
 


[5669]

Recebi a sua venerada carta, a n.o 1, do passado 13 de Janeiro, em que me comunica que a superiora geral das Irmãs de S. José, após a decisão do seu conselho geral, determinou não enviar mais Irmãs para o meu Vicariato e, ainda por cima, fazer regressar as que nele se encontram.
 


[5670]

Embora tal decisão me cause profunda dor, estou longe de me entregar ao desânimo e ao abatimento, porque tenho a certeza de que o dulcíssimo Coração de Jesus, que palpitou pela infeliz Nigrícia, me ajudará a arranjar as coisas de outro modo. O apostolado da África Central é muito difícil e trabalhoso e exige grandes sacrifícios, mas é possível e Deus ajudar-nos-á.
 


[5671]

Depois de tudo, pelo longo silêncio que no último ano a madre geral manteve, a qual foi desanimando dia a dia, e com razão, por causa da morte das duas últimas excelentes Irmãs e, pelo panorama que eu via, apercebi-me perfeitamente que isto ia acabar assim: ultimamente já não se oferecia nenhuma Irmã para a África Central e, desde o princípio, sabiamente, a madre geral só me mandava as que pediam para vir para a missão.
 


[5672]

É certo que as Irmãs de S. José ganharam grandes méritos na África Central, porque aqui realizaram enormes sacrifícios e trabalharam com muito zelo e dévouement, e também com muito fruto, especialmente as Irmãs orientais, convertendo numerosas pessoas à fé e à vida cristã e colaborando com os missionários para eliminar os amancebamentos e regularizar cristãmente muitos casamentos. Por isso, os sete anos de apostolado das Irmãs de S. José na minha missão constituem uma página de ouro na história da África Central, que permanecerá eternamente indelével. Por outro lado, todas as irmãs, tanto as que morreram, como as que regressaram, como as que actualmente se encontram nas casas de Cartum e do Cairo, manifestaram-me sempre, pessoalmente e por escrito, que estiveram e estão contentes do modo como eu sempre as tratei e que em mim encontraram um verdadeiro pai e superior.
 


[5673]

Mas é necessário que V. Em.a saiba, para honra da verdade, que nenhuma das Irmãs de S. José falecidas, ou talvez apenas uma, morreu pela inclemência do clima africano e que se tivessem sido enviadas a tempo da Europa e todas se tivessem aclimatado no Cairo... talvez nenhuma tivesse morrido pelo clima, como aconteceu com os missionários. De facto, desde 1871 até agora, ainda não morreu na África Central nenhum sacerdote europeu que se tenha aclimatado no Cairo; e dos três que morreram, dois foram vítimas da epidemia (na Europa morre-se de cólera) e, quanto ao terceiro, fui eu o causador da sua morte, porque, pelas necessidades urgentes da missão, fi-lo vir para o Vicariato antes de se ter aclimatado no Cairo. Mas das Irmãs:
 


[5674]

1.o Duas, Ir. Teresa e Ir. Arsénia, morreram como resultado duma violenta queda do camelo.

2.o Duas já tinham sido declaradas tísicas pelo médico do hospital do Cairo. Trata-se da Ir. Josefina e da Ir. Madalena, que no Sudão prolongaram a sua vida.

3.o Duas, a Ir. Emilienne e Ir. Genoveva, morreram quase sexagenárias: a primeira foi durante trinta e seis anos superiora em Chipre e em Saida; a segunda esteve dezasseis anos na Índia e outros nove como superiora no hospital do Cairo.
 


[5675]

4.o Duas, a Ir. Henriqueta e a companheira morreram da epidemia.

5.o Enquanto, em contrapartida, por exemplo, as quatro da expedição de 1873, que passaram a estação estival no Cairo e fizeram a viagem para o Sudão no Inverno, estão todas vivas e saudáveis; e assim tão-pouco as outras teriam morrido.
 


[5676]

Ainda que esta seja a realidade, eu encontro-me agora neste aperto, pelo que preciso absolutamente de encher o vazio que deixaram as Irmãs de S. José. E tenho que procurar uma solução, quer convencendo a madre geral – se o intento resultar – de que me deixe as que tenho e me mande outras, quer tentando por outro lado.
 


[5677]

E como há um sábio provérbio que diz: «Quem quer vai; quem não quer manda», é preciso que eu vá a Marselha e a Roma para dar remédio e solução a este importantíssimo assunto. Por isso, depois de ter pensado muito no mais conveniente para o bem do meu importantíssimo vicariato, decidi rogar da exímia bondade de V. Em.a que me permita ir por uns meses à Europa e especialmente a Roma, por causa das necessidades do meu Vicariato. Porque, para além do importantíssimo assunto das Irmãs acima assinalado, levam-me a solicitar tal autorização os seguintes sólidos motivos:
 


[5678]

1. Tenho muita necessidade de me avistar com V. Em.a e abrir-lhe o meu coração sobre muitos aspectos que dizem respeito ao bem desta importante missão.

2. Após a morte do meu incomparável administrador-geral, P.e António Squaranti, que era o braço direito da minha Obra tanto no Vicariato como em Verona, surgiram-me muitos assuntos importantes para concertar e tratar para toda a obra.

3. A minha saúde ressentiu-se por causa das extraordinárias fadigas e angústias, pelo que o excelente médico inglês de Gordon Paxá me ordena insistentemente que para a minha recuperação tome um período de descanso e faça uma cura de águas termais na Europa ou, pelo menos, nas de Elouan, no Cairo. E a verdade é que há cinco meses que não durmo quase nada, para além da permanente falta de apetite e frequentes acessos de febre.
 


[5679]

Consequentemente, seria meu desejo deixar aqui, como meu representante no Vicariato, o superior de Gebel Nuba, P.e Luís Bonomi, a quem fiz vir provisoriamente para Cartum para substituir na administração geral o falecido P.e Squaranti (homem capaz e bem conhecido do Em.o card. de Canossa, que tanto o apreciava) e assim tomar eu o necessário descanso que a minha enfraquecida saúde requer, deslocando-me por uns meses à Europa para tratar e solucionar esses assuntos que afectam o bem do meu Vicariato.
 


[5680]

E como, esperando em Cartum o venerado beneplácito de V. Em.a já não poderia cruzar o deserto devido à iminente estação dos calores tropicais, eu aproveitaria agora as facilidades que me concede Gordon Paxá, para me dirigir, pela rota de Suakin e do mar Vermelho, para o meu estabelecimento do Cairo, para onde pediria a V. Em.a me mandasse a solicitada autorização para ir a Roma e beijar os pés ao novo Pontífice Leão XIII.
 


[5681]

Quanto ao demais, os frutos recolhidos e as almas salvas este último ano, de tantas calamidades, foram mais do dobro que nos outros anos, especialmente em Cartum, no Cordofão e Gebel Nuba.

No reino do Cordofão instalaram-se já as Pias Madres da Nigrícia, a quem toda a cidade dispensou uma entusiástica recepção.
 


[5682]

Em Cartum ficam as quatro Irmãs de S. José e, para além da missão, está o hospital do Governo que Gordon Paxá queria confiar às Irmãs.

Mas disporá da melhor forma para sua glória e para o bem da Nigrícia, que certamente quer salvar.

Prostrando-me a beijar a sagrada púrpura e esperando receber no Cairo (Egipto) a sua venerada licença, com todo o respeito me declaro de V. Em.a Rev.ma

Obed.mo, devot.mo, af.mo filho

† Daniel, bispo e vig. ap.


834
Card. Luis de Canossa
0
Cartum
03.03.1879

N.o 834; (795) - AO CARD. LUÍS DE CANOSSA

ACVV, XVII, 5, b

Louvados sejam J. e M.

Cartum, 3 de Março de 1879


Eminência rev.ma

[5683]

Agradeço-lhe infinitamente a sua apreciada carta de 16 de Janeiro último. As cruzes e as grandes tribulações são a marca das obras de Deus. Muitos dizem-no com a boca e pregam-no do púlpito, mas, chegadas as cruzes, perdem o ânimo, ficam desolados e fraquejam. O missionário e a Irmã da África Central devem ser carne de canhão, gente destinada a padecer grandemente por Jesus Cristo; e têm que ser assim, porque, de contrário, não seriam apóstolos, mas tornar-se-iam uns fracos e ineptos. Queria que se inculcasse isto nos nossos institutos africanos de Verona e não ficarei contente enquanto não conseguirem sair daí com tal espírito. E há-de conseguir-se, com a graça de Deus.
 


[5684]

Entretanto, alegro-me de ver que, quanto a isso, [...] os que educamos no instituto de Verona são muito melhores que os elementos napolitanos e romanos. Creio que os napolitanos acabarão todos por fugir: este com um pretexto, aquele com outro; mas sempre, no fundo, por medo e falta de espírito. Não importa. Deus escolhe os seus eleitos. Em troca, a nossa gente, como P.e Losi, P.e Bonomi, P.e Fraccario, e sobretudo as nossas Irmãs veronesas têm mais ânimo que antes. Igualmente as Irmãs de S. José que estão aqui. Porém, como a madre geral não tem outras para me mandar (porque para a África Central e para a Austrália só se dá a obediência a quem a pede), também estas acabarão por ser chamadas de volta.
 


[5685]

Por isso, o com objectivo de solucionar este problema do Vicariato, bem como uma enorme quantidade de assuntos mais, e dado que para bem da minha alquebrada saúde o médico inglês me recomendou peremptoriamente uma viagem às águas termais, etc., é provável que eu vá ao Cairo, onde, para além doutras práticas, espero combinar com P.e Rolleri que venha a Cartum, o que seria muito benéfico para a obra.
 


[5686]

Além disso, tenho absolutamente de ir à Síria procurar o apoio do patriarca maronita (com quem já mantenho correspondência, mas num ano não houve senão boas palavras e o provérbio diz que quem quer vai, quem não quer manda); vou lá, pois, no intuito de conseguir mestres e mestras para o Vicariato (e também para Verona – árabes, entenda-se), porque em partindo as Irmãs de S. José, árabes em grande parte, fico sem poder dar aulas.
 


[5687]

Em suma, estou num aperto. Mas, deixando o mundo bisbilhotar à sua maneira, eu confio no Coração de Jesus e no cumprimento do meu dever. Este ano tivemos o dobro de conversões em relação aos anteriores, porque assim são as coisas de Deus. Em Gebel Nuba houve mais de trinta; mas quando se dominar a língua, coisa em que tanto trabalhou P.e Bonomi, toda a tribo, excepto alguns velhos, se tornará católica.

Beija-lhe a sagrada púrpura seu filho

† Daniel Comboni

A Ir. Grigolini e as nossas de Verona instalaram-se bem em Cordofão.


835
M. Eufrasia Maraval
0
Cartum
03.03.l879

N.o 835; (796) - À MADRE EUFRÁSIA MARAVAL

ASSGM, Afrique Centrale Dossier

Cartum, 3 de Março de 1879
 

Minha muito reverenda madre,

[5688]

Quando esperava algumas Irmãs não só para esta casa mas também para o hospital do Governo de Cartum, que Gordon Paxá me ofereceu para as nossas Irmãs, como outros lhe escreveram depois do meu pedido, porque eu estou sempre doente, eis que uma carta de Sua Em.a o cardeal-prefeito, nosso pai, me comunica que, em função das decisões do seu conselho geral, a madre determinou não só não mandar mais Irmãs, mas também retirar as que actualmente trabalham na minha obra.

Era o que eu previa e temia grandemente desde que Deus, em seus imperscrutáveis desígnios, quis chamar para a glória do Céu as três últimas Irmãs, que gozavam de uma saúde perfeita e possuíam o verdadeiro espírito religioso e uma abnegação admirável.
 


[5689]

Enfim, sinto isso profundamente, porque a congregação de S. José tem grandes méritos em relação a mim e à África Central. As novas vítimas da caridade que cobre a terra do Centro da África serão gloriosa semente de cristãos e de conversões, e eu jamais esquecerei a sua congregação nem a si, que tão generosa e aberta sempre foi comigo, nem tão-pouco aquela madre incomparável que Deus chamou à sua presença e que foi uma glória de mulher católica, uma força da Igreja e uma grande benfeitora da África Central: a nossa falecida madre geral.
 


[5690]

Sua Eminência diz-me que me ponha de acordo consigo, quanto ao regresso das Irmãs. A Ir. Severina repetiu-me que não se mexerá de Cartum até depois do kharif, porque agora se está a aproximar o calor e não quer atravessar o deserto para se esturricar com o sol. Por outro lado, preciso de um pouco de tempo para atender às necessidades de Cartum e não posso, de repente, deixar sem Irmãs um grande instituto de raparigas. É preciso fazer as coisas bem.
 


[5691]

Porém, como a esperança é a vida do homem e portanto a última coisa que se perde, embora esteja muito fraco pelas febres e os sofrimentos passados (porque o ano que agora se cumpre desde a minha última chegada a estas terras foi o mais terrível de todas as épocas da história da África central), afrontarei eu mesmo o deserto e, com a autorização de sua eminência, farei uma rápida viagem à Europa, seja para chegar a um acordo consigo, se for possível (embora não confie muito nisso, porque a primeira assistente geral e sobretudo a superiora do hospital do Cairo, que certamente terá falado, não consideram conveniente fazer mais sacrifícios pela África Central), seja para procurar outro meio de atender às necessidades da missão de Cartum.
 


[5692]

Portanto, irei pessoalmente tratar consigo o que Deus dispuser. Pela minha parte, estou certo de que a cruz é o caminho real do triunfo para todas as obras de Deus. A Igreja católica foi fundada sobre o sangue dos mártires e é por meio do martírio que as missões prosperam. Quase todas as suas Irmãs converteram e salvaram certo número de almas. Dificilmente terão noutras missões essa satisfação, que o seu apostolado na África Central lhes proporcionou.
 


[5693]

Pelo que a mim respeita, sempre foram tratadas como verdadeiras filhas, do que elas me deram testemunho. Espero que nunca me esqueçam, bem como à África Central.

Na esperança de voltar a vê-la em breve, rogo-lhe que me escreva para o Cairo, onde esperarei a autorização de sua eminência para me deslocar à Cidade Eterna.

Rogue por

Seu devot.mo † Daniel Comboni

Bispo e vig. apost.

As quatro Irmãs estão perfeitamente bem.

Original francês

Tradução do italiano


836
Mgr. Joseph De Girardin
0
Cartum
03.03.1879

N.o 836; (797) - A MGR. DE GIRARDIN

AOSIP. Afrique Centrale

Cartum, 3 de Março de 1879


Monsenhor,

[5694]

Eis aqui o resto do meu pequeno relatório sobre a carestia e a mortandade na África Central. Fornecer-lhe-ia de muito boa vontade outros dados muito sérios e interessantes, mas tenho a saúde destroçada e encontro-me demasiado fraco.
 


[5695]

Espero que tenha recebido a minha carta n.o 4, datada de 17 de Fevereiro, com o quadro estatístico e o princípio do pequeno relatório.

Rogo-lhe que desde agora em diante entregue todos os anos a importância dos contributos ao sr. Brown e Filho, de Roma, a via mais segura para os receber na África Central.
 


[5696]

Quanto ao demais, é norma fundamental do meu Plano para a Regeneração da África Central, que temos seguido até ao presente e que sempre considerámos justa, razoável e necessária (agindo de outro modo prejudicar-se-iam os indígenas e a própria missão), quanto à alimentação, alojamento, roupa, etc.:

1.o Educar os meninos do orfanato em condições que não mudem em nada a sua maneira de viver e ser, em tudo o que diz respeito à vida material.
 


[5697]

2.o Dirigir a sua instrução ajustando os graus da mesma ao estado a que são chamados. Assim a educação que se lhes ministra põe-nos em condições de exercer mais adiante, com bem poucos gastos para o Vicariato, a maior influência entre os seus compatriotas. Por que razão criar a estes povos novas necessidades e fazê-los abandonar os seus costumes a estes países? Eu tive sobre isto uma boa experiência.

Os meninos que encontrei em Cartum, quando em 1872 fui posto à frente do Vicariato da África Central, estavam habituados aos costumes europeus e precisei de muita paciência para mudar a disposição dos antigos alunos.
 


[5698]

Mas os novos orfanatos que fundei no Cordofão funcionam de outra maneira: deixei seguir tudo o que havia de bom nos costumes, melhorando-os, mas sempre sem os tirar daquilo que é natural do país. Isto torna-se muito mais vantajoso para estas crianças, que crescem sem pretensões, humildes, submissos e muito contentes no seu estado ordinário, enquanto os negros e negras educados no Cairo e na Europa que trouxe para a África Central, até os que tinham estado nos mosteiros da Europa mais perfeitos e observantes, tinham aqui mais exigências e pretensões que os próprios missionários e as Irmãs europeus.
 


[5699]

Por isso, desde há anos que já não admito negros e negras educados na Europa ou nos conventos do Oriente, mas educamo-los aqui nós na sua condição humilde e na simplicidade do espírito de Jesus Cristo e da nossa santa religião, sem os deitar a perder com as comodidades e a civilização europeias; e assim temos obtido resultados mais encorajadores.

Enfim, o senhor compreende bem as minhas intenções e o que quero dizer. Espero que isso corresponda ao seu pensamento e que o considere oportuno e necessário para o ensino e educação que há que dar nas missões às crianças indígenas.

Digne-se, monsenhor, aceitar os sentimentos de devoção e de reconhecimento com que sou sempre

Seu devot.mo servidor

† Daniel Comboni

Bispo de Claudiópolis i.p.i.

Vigário Ap. da África Central

Original francês

Tradução do italiano


837
Marcquesa d'Erceville
0
Cartum
03.03.1879

N.o 837; (798) - À MARQUESA D’ERCEVILLE

«Annales de l’Oeuvre Apostolique» (1879), pp. 484-487.

Cartum, 3 de Março de 1879

Senhora presidenta,

[5700]

Peço-lhe perdão pelo meu longo silêncio e pelo meu atraso em lhe dar notícias do Vicariato da África Central, a quem a senhora ajudou com o admirável zelo das generosas e caritativas damas da Obra Apostólica. Quantas raparigas jovens vestiu e ajudou a senhora! Quantos meninos escravos resgatou e introduziu no redil de Jesus Cristo! Quantos méritos ganhou adornando admiravelmente a casa de Deus e conseguindo assim que os infiéis dirigissem os seus olhares para contemplar o espectáculo das magníficas cerimónias da Igreja Católica, eles que jamais tinham visto maravilhas semelhantes e que se encontravam sentados à sombra da morte!
 


[5701]

Mas, como se tudo o que fez pelos negros não fosse nada, a sua imensa caridade estendeu-se ainda aos obreiros do Evangelho, a quem a senhora vestiu de paramentos eclesiásticos e fortaleceu com o envio de vinho – que não se encontra nestes países – para saciar a sua sede, porque aqui a merissa e a água suja e salobre temos que pagá-las mais caras que o vinho na Europa.
 


[5702]

Que Deus lhe dê, senhora, cem por um nesta vida e na outra, por todo o bem que faz pela Sua glória, adornando os seus templos e tornando mais fáceis aos seus missionários as tarefas evangélicas.
 


[5703]

Após pedir-lhe perdão pelo meu silêncio, devo dizer-lhe, senhora presidenta, que, a seguir à horrível carestia e sede que assolaram a África Central sobreveio uma mortandade sem igual:

1.o Numa parte do meu Vicariato, com uma extensão maior que três vezes a França, morreu metade da população com mais da metade do gado; noutras vastas zonas morreram as três quartas partes da população e todos os animais.

2.o Em grandes aldeias e povos situados a pouca distância de Cartum morreu não só toda a gente que os habitava, mas também todo o gado e animais em geral, até os cães, que são a única providencial guarda de segurança pública nestes países.
 


[5704]

Os meus missionários, as minhas Irmãs e todos os membros da missão estiveram mais ou menos gravemente doentes e próximos da morte. Três missionários, entre eles o meu grande vigário e administrador-geral, P.e António Squaranti (braço direito da minha obra), morreram por causa da epidemia e também duas religiosas de S. José, quatro irmãos coadjutores europeus de grande valia e treze mestres e mestras negros. Houve um tempo, em Setembro, em que eu era o único sacerdote em pé para administrar dia e noite os sacramentos aos moribundos. Tive que fazer não só de bispo, mas também de superior, pároco, vigário, administrador, médico, cirurgião, enfermeiro, etc., etc. Finalmente, eu mesmo caí doente pelas fadigas inauditas, a ansiedade, os desgostos, as febres... Encontro-me assim desde há dois meses e já não tenho forças.
 


[5705]

Queria fazer-lhe um pequeno relatório sobre a carestia, a sede e a mortandade na África Central (que são mais horríveis que as da China e da Índia e que todas as das outras missões do mundo), e uma pequena relação sobre vinte e cinco negros e negras que recolhemos com os fundos da Obra Apostólica e aos quais pusemos os nomes que me mandou mons. Gaume; mas para isso precisaria de um pouco de força, porque tenho a saúde minada pela falta completa de sono e de apetite. Espero restabelecer-me com meio copo de vinho de Bordéus que tomo todos os dias, graças ao envio caritativo de cem garrafas por parte da Obra Apostólica.
 


[5706]

Os nomes que demos às crianças recolhidas por nós foram até agora os seguintes: José, João Baptista, Alexandre, Pedro, André, Carlos, Agostinho, Estêvão, Aleixo, etc. aos rapazes, e Vitorina, Maria, Inês, Clemência, Cecília, Rosa, Antónia, Carolina, Eleonora, Marta, etc., às raparigas. Sobre estes pequenos tenho dados interessantes, sobretudo quanto ao modo violento como foram arrebatados aos seus pais e à sua terra.
 


[5707]

Por amor de Deus, envie-me vinho todos os anos. Temos tanta falta dele que o ano passado, durante uns meses, só aos domingos se pôde celebrar missa no Cordofão, aonde eu mandava, pelo correio, uns frasquitos. Aqui, os missionários que sobreviveram à carestia encontram-se fracos, esgotados: caldo Liebig e tapioca para a sopa far-lhes-ão muito bem.
 


[5708]

Quanto aos paramentos litúrgicos, falta-nos no Vicariato uma casula e paramentos bonitos para a missa pontifical. Tenho um magnífico báculo pastoral que me enviou, mas falta o cálice, a casula e a capa pluvial correspondentes. Mas sobretudo ficaria muito contente se a obra pudesse mandar também algum tecido forte para confeccionar roupa para os missionários e também tela para fazer vestidos para as escravas que comprámos, pois elas vêm vestidas como a nossa avó Eva antes do pecado original. Assim andam em Gebel Nuba todas as mulheres, casadas e não casadas: precisariam de um vestido ou camisa. E o mesmo acontece com os negros, a quem assentariam bem as blusas que trazem os trabalhadores franceses, sobretudo fazendo-as longas e de uma peça de algodão.

Vejo-me obrigado a terminar aqui esta carta, por me encontrar ainda muito fraco. Rogue pelo seu agradecido servidor


† Daniel Comboni

Vig. Ap. da África Central

Original francês

Tradução do italiano


838
Pellegrino Matteucci
0
Cartum
10.03.1879

N.o 838; (799) - A PELLEGRINO MATTEUCCI

G. GIBELLI, «Epistolario Africano» Roma 1887, pp. 58-60

Cartum, 10 de Março de 1879


Meu caro amigo,

[5709]

O seu telegrama, mandado de Massaua, no qual me fazia perguntas sobre Gessi, encontrou-me gravemente doente com a febre; e como o que sobre ele se sabia era vago e incerto, preferi não responder, sendo absurdo gastar dinheiro inutilmente para dizer algo talvez errado.
 


[5710]

Agora posso dar-lhe notícias certas, porque comprovaram-nas bem Gordon Paxá e alguém que o próprio Gessi me enviou do lugar onde ele se encontra. Neste tempo foi nomeado bei (o diploma de quedive chegou a Cartum esta manhã) e também bei o governador do equador, o meu bom amigo Emin Efendi (Schnitzler). Essas nomeações foram aqui muito elogiadas pela opinião pública, porque ambos o mereciam. Porém, a designação de Giegler, chefe dos telégrafos, para paxá e para wakil do hokomdar fez o mesmo efeito que produziu em Cartum a nomeação de Rosset para cavaleiro da coroa da Itália, no que vós perdestes um pouco, porque em Cartum conhecia-se a fundo Rosset, muito melhor que a si, e certamente ele não merecia uma condecoração, porque nada fez por isso.
 


[5711]

Mas agora a coisa tornou-se mais grave. Falecido Rosset, liquidaram-se todos os seus bens e, depois de tudo, não ficou nada para cobrir o dote da sua esposa, que era de 500 libras esterlinas. E, entretanto, além de outros credores seus, ficaram sem soldo dois verdadeiros cavalheiros: o mencionado Emin Efendi, governador do equador, que perdeu todos os seus haveres de 360 guinéus egípcios, que havia entregue em depósito a Rosset e que este tinha gasto, e Jorge Stambulieh, vice-cônsul inglês, que, para o ajudar e obter os seus favores lhe tinha emprestado 300 libras esterlinas. Este e Emin Efendi ficaram sem um cêntimo. E a mesma sorte teria corrido um excelente católico, engenheiro no Nyanza Alberto, Ibrahim Khalifa, de Trípoli, a quem, tendo ele vindo a Cartum com vontade de entregar em depósito a Bosset 350 guinéus e 460 napoleões em ouro, eu dissuadi-o disso; e dissuadi-o em consciência, porque eu conhecia Bosset (a quem, contudo, eu tinha favorecido doutro modo) e a sua situação.
 


[5712]

Pelo que parece, Bosset foi envenenado no Darfur.

Voltando a Gessi, ele fez quatro batalhas contra as tropas de Ziber, nas quais houve mais de 2000 mortos e se fizeram 800 prisioneiros, com os quatro zaribe, mas sem que Ziber ficasse dominado. Então Gessi pediu reforços e Gordon Paxá ordenou ao mudir de Dará, em Darfur, um certo engenheiro Messedaglia, de Verona, que fosse a Shakka com 700 homens. E anteontem disse-me Gordon que Ziber está submetido e que Gessi saiu vitorioso; porém, dentro de uns dias o próprio Gordon partirá para o Cordofão e Shakka e voltará com Gessi, que realmente se saiu com honra.
 


[5713]

Ânimo, meu caro doutor e amigo. Creio que para alcançar o seu objectivo o senhor escolheu o melhor caminho: eu prefiro-o a todos os demais. E se conseguir, como espero, a amizade e a protecção do rei João, também poderá desenvolver na Abissínia actividades comerciais e com mais frutos que noutras partes. Porém, deve tratar de aprender a língua, que unida à sua ciência médica, o fará ter 80% mais de probabilidades de êxito que Antinori e outros.
 


[5714]

Ora bem, já conhece a história desde Nunes e Pedro Paes até hoje: nunca se pode estar seguro da estabilidade abissínia.

Mas, ao lado dos Gallas e entre eles, encontrará gente excelente. Mil saudações a mons. Massaia quando o vir. Piaggia partiu para as montanhas de Sennar e talvez continue até Fadassi.
 


[5715]

Talvez dê, com P.e Gennaro, uma saltada a Roma e à Síria para procurar mestres maronitas, porque quero erguer escolas em toda a parte. Tenho grande esperança na missão de Gebel Nuba.
 


[5716]

Receba a minha cordial saudação, saúde Calisto da minha parte e telegrafe-me, ou melhor, faça com que Filippini me telegrafe de Massaua para Cartum, que eu o transmitirei para o Cairo e Europa, etc. Correnti já não é presidente da Sociedade Geográfica.

Seu afectuosíssimo

† Daniel Comboni

Bispo e vig. ap.

Rogo-lhe que apresente os meus respeitos a mons. Touvier, bispo e vigário apostólico da Abissínia.


839
Card. João Simeoni
0
Cairo
25.04.1879

N.o 839; (800) - AO CARD. JOÃO SIMEONI

AP SC Afr. C., v. 8, ff. 919-920

N.o 6

Cairo, insto. de negros, 25 de Abril de 1879
 

Em.o e Rev.mo Príncipe,

[5717]

Em apenas 40 dias, pela rota do deserto de Suakin, cheguei de Cartum ao Cairo.

A febre desapareceu-me pouco depois de entrar no deserto; mas subsiste a inflamação geral – que espero eliminar com as águas de Recoaro –, e ainda não consigo dormir uma única hora em cada vinte e quatro, pelo que sinto-me sempre cansado. Contudo, as preocupações e a direcção geral de toda a obra tornam-me cada vez mais firme na inamovível confiança de que com a ajuda de Deus conseguiremos acabar com o reino de Satanás para converter a África Central a Cristo.
 


[5718]

Mas, para saber a que ater-me, preciso de submeter muitos assuntos importantes à sábia direcção e conselho de Vossa Eminência. Espero que em pouco tempo se tratará tudo e poderei realizar nuns meses quanto me é necessário fazer na Europa para o bem da Nigrícia, pois quereria que, apenas terminadas as chuvas e o kharif pudesse voltar ao Vicariato para visitar sobretudo Gebel Nuba, que apresenta as mais lisonjeiras esperanças.
 


[5719]

Como o tempo aperta e é necessário não perdê-lo, dada a minha extrema fraqueza e o martírio de não poder pregar olho, desejo consultar o veneradíssimo mons. Ciurcia, que está aqui no Cairo (um pouco mal de saúde), com o qual espero acertar em poucos dias um pequeno problema que temos que solucionar juntos e do qual só tive conhecimento anteontem, porque desde 1874 não me falou nem me escreveu sobre ele nem o excelentíssimo monsenhor (a quem guardarei eterna gratidão pelo bem que realmente fez à minha obra e a quem considero e considerarei sempre como o insigne benfeitor e experimentado e sapientíssimo conselheiro que foi para mim até 1867), nem nenhum outro; desejo, dizia, consultá-lo e ver se posso sair a seguir do Egipto para ir a Roma, a fim de ganhar tempo, sem esperar aqui a autorização oficial, escrita, de Vossa Eminência para me deslocar ad limina. Estou certo de que Vossa Eminência concederá tal graça. E eu talvez vá deixar o Cairo antes de me chegar a sua carta de obediência, no caso de me ser favorável o venerado conselho deste vigário apostólico, mons. Ciurcia.
 


[5720]

Quanto aos meios pecuniários, graças à infalível protecção do meu querido ecónomo S. José, está acertada a situação financeira do Vicariato. Muitas almas se preparam para entrar no seio da Igreja, sobretudo no Cordofão e em Gebel Nuba, mas faltam-me boas e piedosas Irmãs. Deus as mandará.

Beijo-lhe a sagrada púrpura e subscrevo-me com a veneração mais profunda

De V. Em.a Rev.ma hum.mo, devot.mo, ob.mo filho

† Daniel Comboni, Vigário apostólico


840
Mons. Luis Ciurcia
1
Cairo
02.05.1879

N.o 840; (801) - A MONS. LUÍS CIURCIA

AVAE

Cairo, 2 de Maio de 1879


Petição de faculdade.