Terça-feira, 29 de Novembro de 2022
O Ir. Francisco Amarante, missionário comboniano português [à esquerda, na foto], desenvolve a sua missão na Zâmbia, coordenando um centro (Chikowa Youth Development Centre) que promove o desenvolvimento e a formação profissional dos jovens.
O irmão Francisco Amarante é natural da Gafanha da Encarnação (Aveiro) e conta-nos que nasceu num ambiente rural e cresceu num contexto cristão, «onde era normal as crianças aprenderem os fundamentos da fé nas suas famílias». Na sua casa «rezavam o terço todos os dias» e ao domingo participavam na eucaristia na paróquia. Por volta dos 16 ou 17 anos, começou a frequentar o grupo de jovens e foi então que a sua fé «evoluiu de uma fé de tradição para uma fé assumida de forma mais consciente». Nesses anos surgiram, pela primeira vez, as suas inquietudes vocacionais.
Lembra que, nessa altura, os Missionários Combonianos tinham uma casa de formação para irmãos missionários em Aradas, na cidade de Aveiro. «Os combonianos vinham frequentemente à minha paróquia da Gafanha da Encarnação, não só para fazer animação missionária, mas também para participar em encontros com os jovens. Recordo bem os padres Valdemar e Silvano Bergamini e o irmão Pietro Martin. Foi este último que, a certo momento, começou a ter um contacto mais directo comigo, não só por correspondência, mas também convidando-me para os encontros de aprofundamento vocacional», diz o Ir. Francisco.
Ao responder ao apelo de Deus para ser missionário, optou por ser irmão missionário. Para essa decisão terá sido importante «o facto de o promotor vocacional na altura, o Ir. Pietro Martin, ser ele mesmo irmão e um exemplo vivo do que isso significa, o facto também de Aradas ser a casa de formação para os irmãos e, talvez em maior grau, o não gostar de Filosofia, sempre me senti mais atraído por resolver questões práticas e não lidar com conceitos teóricos. Nunca me arrependi desta escolha e hoje voltaria a escolher a mesma vocação».
Durante a formação, o Ir. Francisco estudou Agronomia, uma área de que gosta muito, pois desde pequeno habituou-se «a ajudar os pais no cultivo dos campos» e por «achar que poderia ajudar as pessoas em terras para onde fosse enviado a resolver um dos problemas mais graves enfrentados por tantos milhões de pessoas que é o problema da fome». Expectativas que se concretizaram na missão da Zâmbia, onde se encontra.
Formação profissional
O Ir. Francisco sublinha que na missão onde trabalha actualmente, e onde já esteve anteriormente, «a fome e a desnutrição são um dos problemas mais graves». Nesse sentido, ao longo destes anos, tem podido «exercer a profissão ajudando tantas centenas de estudantes que têm passado pela escola». No centro, os jovens podem aprender a melhor maneira de cultivar os campos, bem como outras profissões. Assim, «temos ajudado a matar a fome a tanta gente, dando trabalho às pessoas no cultivo das terras da escola e formando profissionais que saibam trabalhar os campos e produzir alimentos».
O Chikowa Youth Development Centre (Centro de Desenvolvimento da Juventude de Chikowa), explica o missionário, é uma escola de desenvolvimento e formação profissional para rapazes e raparigas. Foi fundado de forma muito rudimentar por um missionário comboniano italiano, o padre Giovanni Girardi, no final dos anos oitenta. Foi criado na missão de Chikowa, que, nesse tempo, estava abandonada, na diocese de Chipata. «No início era um pequeno centro para rapazes da zona da paróquia de Chikowa e recebia somente os filhos de católicos», comenta o Ir. Francisco. «Oferecia uma boa oportunidade aos jovens, pois aprendiam o fundamental nas áreas da mecânica ou da agricultura e, ao mesmo tempo, tinham alguma prática profissional orientada. No final do curso, os rapazes recebiam um caixa de ferramentas para levarem para casa e poderem começar a trabalhar e tornarem-se, assim, motores de desenvolvimento para as suas comunidades».
Os jovens faziam o curso em regime de internato, pois provinham de aldeias muito afastadas do centro da paróquia. O centro foi construído num extenso terreno que é propriedade da diocese de Chipata e, por isso, «não falta terra para cultivar e, desde o seu início, esta actividade tem ajudado na sustentabilidade da escola».
O Ir. Francisco trabalha neste centro há vinte e dois anos, somando dois períodos (1991-2004 e de 2012 até ao presente). Actualmente, é o responsável pela coordenação das diversas actividades, em particular as relacionadas com a auto-sustentabilidade. Também dá apoio no ensino de algumas matérias no curso de Agricultura.
O objectivo principal do centro, explica o Ir. Francisco, é ser um agente de desenvolvimento integral para os jovens desta zona da Zâmbia, mas também factor de desenvolvimento para as populações locais tão carenciadas.
Nas últimas décadas, o centro tem crescido e evoluído. Foram-se construindo novos edifícios (salas de aula, oficinas, dormitórios, casas de banho, casas para professores, cozinha e refeitório, sala de computadores, estábulos para os animais, etc.). Paulatinamente, o número de alunos também foi aumentando. No início, acolhia cerca de 20 estudantes, agora a escola tem, em média, uns 100 a 120 distribuídos por cinco cursos. Cresceu o número de professores e o pessoal que presta outros serviços. «Os estudantes provêm de muitas zonas da Zâmbia e a maioria nem sequer são católicos. E já não se recebem só rapazes, mas também raparigas.»
O centro está agora registado no organismo do Ministério da Educação da Zâmbia (TEVETA, sigla em inglês) que gere o ensino técnico no país. Os cursos seguem o programa e o calendário estabelecido pelo sistema público e os exames finais são também supervisionados por este organismo.
O Ir. Francisco frisa que com o crescimento do centro novos desafios apareceram e o projecto é mais difícil de gerir. Um dos principais desafios é encontrar e manter bons professores locais: «Nós não podemos pagar aos professores o mesmo que paga o Governo, pois dependemos apenas das nossas actividades de produção para pagar essas despesas. Frequentemente, os bons professores mudam para outras escolas, onde recebem melhores salários, o que é compreensível.»
O papel dos voluntários
Para o desenvolvimento das múltiplas actividades do centro, os Combonianos contam com a colaboração de voluntários. O Centro de Chikowa, refere o Ir. Francisco, «já tem alguma história dessa colaboração que tem sido essencial para todo o trabalho realizado ao longo destes anos».
Recorda o missionário português que, nos anos de 1997 a 2003, trabalhou em Chikowa um casal de voluntários italianos que vieram para a missão a título pessoal. Trata-se do Enrico e da Simonetta Carreta.
O Enrico dedicou-se à formação humana e cristã dos estudantes e, ao mesmo tempo, era responsável pela carpintaria. No local fabricavam-se móveis para venda e, assim, ajudava na sustentação da escola. A Simonetta, enfermeira de profissão, dedicou-se à assistência sanitária às pessoas das aldeias vizinhas e, em particular, à questão da desnutrição das crianças. Desenvolveu um projecto de distribuição de leite materno e de papas enriquecidas para as crianças. Durante este período, eles tiverem três filhos que foram crescendo na missão até à altura de irem para a escola.
Em 2004, chegou o Lorenzo Dalla Valle, outro voluntário italiano, que trabalhou no centro durante quinze anos. Foi o responsável pela administração e pela orientação e coordenação do trabalho na carpintaria.
«Em 2012, quando regressei pela segunda vez a Chikowa, encontrei outro tipo de voluntários, desta vez enviados por uma organização católica francesa, a Fidesco. Esta organização tem-nos enviado todos os anos um, dois ou até três voluntários, de acordo com as necessidades existentes. Normalmente, permanecem por dois anos e assumem diversas responsabilidades no centro», assinala o missionário comboniano. «Sem estes voluntários, certamente, já teríamos encerrado o centro, pois eu sozinho não conseguiria levar para a frente todo o trabalho. Eles têm sido providenciais no trabalho de promoção humana e evangelização em Chikowa.» E realça o Ir. Francisco que os voluntários não vão para a missão como meros agentes de desenvolvimento, mas sim com um espírito verdadeiramente missionário, de testemunhar e dar a conhecer Jesus e o seu Evangelho através do seu trabalho e exemplo de vida. «Eles são o exemplo de que a missão é tarefa de todos os baptizados e não apenas de padres e religiosos.»
Um futuro melhor para os jovens
Desde o início do funcionamento do Centro Juvenil de Chikowa, a preocupação dos Combonianos tem sido não formar apenas técnicos, que se tornem agentes de desenvolvimento do país, mas também bons cidadãos e cristãos preparados, convictos e empenhados. «Os jovens têm, a par da formação técnica, outros momentos formativos a que chamamos formação humana, em que são tratadas várias áreas respeitantes ao desenvolvimento integral da pessoa, e também vários momentos de formação espiritual e de oração.»
O Ir. Francisco esclarece que os jovens católicos «são ainda convidados a integrar grupos de oração e espiritualidade especificamente católicas». Muitos jovens fazem parte do coro da paróquia durante o tempo de aulas. «Como um grande número de estudantes não são católicos, damos plena liberdade para que ao sábado e ao domingo possam tomar parte nas actividades das respectivas igrejas», diz o missionário.
E o mais importante, afirma o Ir. Francisco, «procuramos ajudar estes jovens através do nosso exemplo de vida cristã, seja a nossa comunidade comboniana, seja mediante o exemplo de vida e oração dos voluntários que colaboram connosco».
Ir. Bernardino Frutuoso, jornalista comboniano