D. Christian Carlassare, desde Nairobi: “Ofereço a minha dor para a purificação da Igreja de Rumbek”

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Quarta-feira, 5 de Maio de 2021
O Dom Christian Carlassare, nomeado bispo de Rumbek pelo Papa Francisco, no passado dia 8 de Março, foi vítima de um ataque armado à sua residência em Rumbek, no Sudão do Sul, na noite de 26 de Abril. Os dois assaltantes, já a braços com a justiça, dispararam vários tiros às pernas de D. Carlassare, antes de se porem em fuga. O missionário foi transportado de urgência para o hospital de Nairobi, no Quénia, de onde envia uma mensagem vídeo, cujo texto a seguir publicamos, no qual agradece a solidariedade e apela à paz e à unidade. Entretanto, hoje, o Santo Padre nomeou provisoriamente o comboniano D. Matthew Remijio, bispo de Wau, Administrador Apostólico de Rumbek, até à recuperação dos ferimentos e à ordenação episcopal de D. Christian Carlassare, que se espera seja em breve. (Credit das fotos:
ACI Africa) [Mensagem vídeo]

Olá a todos e obrigado à ACI-África por me dar a oportunidade de transmitir esta mensagem. Dirijo-me a vós ainda da cama de um hospital, mas cheio de esperança. 

Primeiramente, quero agradecer a todos os cristãos do mundo inteiro que têm rezado por mim e me estão a dar tanta coragem e confiança no Senhor. Depois, reconheço também a solidariedade, numa tomada de posição cheia de força dos meus irmãos mais velhos, os bispos do Sudão e do Sudão do Sul que vêem que este ataque a um membro é o ataque a toda a Igreja.

Estou grato pelo compromisso sincero do Governo [do Sudão do Sul], desde a presidência até às autoridades locais para defender a verdade e tomar acções legais para corrigir o mal que aconteceu em Rumbek para que não volte a acontecer.

Os meios de comunicação social também deram uma cobertura alargada ao incidente. Que não seja para envergonhar ou confundir, mas para informar sobre os factos. Li títulos como «Rumbek alvejou o bispo» ou «Sudão do Sul internacionalista alvejou o bispo». Que vergonha! Muitos sul-sudaneses inocentes escreveram-me a dizer «Pedimos desculpa pelo que o Sudão do Sul lhe fez». E eu respondi: «Por favor, estai em paz. Não é o povo do Sudão do Sul que me alvejou. Não são os Dinkas que me alvejaram nem os Agar. São um pequeno grupo de pessoas que não têm valores humanos e são a desgraça da sua comunidade».

Rumbek não atingiu o seu bispo, Rumbek não espanca e mata padres como aconteceu há alguns anos. Rumbek não trata mal irmãs ou irmãos religiosos. Rumbek não abusa de nenhuma pessoa. Isto é o que nós queremos de Rumbek. O contrário não devia voltar a acontecer. E convido os líderes das comunidades e os chefes locais para identificarem os membros violentos da sua comunidade e aplicarem a lei tradicional que não tolera violência, especialmente quando pode ser evitada.

Não permitais que membros violentos mantenham toda a comunidade refém. A cultura Dinka não tem espaço para a violência. A violência não é parte de nenhuma cultura do mundo. O ensinamento da Igreja é claro: fala a partir do Evangelho. Esta é a mensagem que temos de pregar com as nossas palavras e também com o exemplo da nossa vida.

O Evangelho que li no último domingo antes do ataque era sobre o Bom Pastor e vimos a diferença entre o pastor que ama o seu rebanho e o pastor que, por sua vez, cuida das ovelhas para o seu interesse pessoal.

Lamento ter de admitir que esta mentalidade do mundo, que é a mentalidade do diabo, por vezes, afecta também a nós pessoas da Igreja. Pensamos em trazer o desenvolvimento para nós próprios e para os nossos clãs. E, para isso, cometemos todas as espécies de iniquidade. Mas, por favor, convertamo-nos, mudemos a nossa mente. Este é o caminho.

E assim, agora, desde esta cama do hospital, curvo-me perante Deus e intercedo pela Igreja de Rumbek. Rezo pela conversão dos pecadores. Ofereço a dor que estou a sofrer para que o Senhor nosso Deus possa purificar a Igreja de Rumbek de todos os erros. E que coisas como estas não voltem a acontecer. Que não haja lugar para a violência, a divisão, os desejos egoístas que vêm do diabo.

Mas trabalhemos para formar uma Igreja de acordo com o ensinamento de Jesus. Uma Igreja que é una, isto é: unida. Que é santa, isto é: ser como o Evangelho que faz as pessoas ser santas. Católica, isto é: que abraça cada um, sem distinção de clã, tribo ou cor da pele. E apostólica, isto é: que vem de Jesus até nós, através do papa e dos bispos. E o Papa Francisco e o Colégio dos Bispos enviaram-me a vós, povo de Rumbek, para esta missão: fazer a Igreja una, santa, católica e apostólica.

Eu quero cumprir esta missão com todo o meu coração, por amor a vós e por amor ao Sudão do Sul. Que eu seja um sinal para todos vós ao levantar-me desta cama e voltar a caminhar. Que Rumbek também se levante e ande os caminhos da paz e da unidade.