Combonianos defendendo a vida, no Brasil: Esperança durante a pandemia

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Quarta-feira, 25 de agosto de 2021
O carisma de São Daniel Comboni ecoa no ensinamento de Papa Francisco: evangelizar é tornar presente o Reino de Deus no mundo. Um Reino de amor, fraternidade, solidariedade e paz, em estado permanente de missão. Por isso, nós missionários combonianos atuamos em várias ações pastorais e trabalhos sociais, com o objetivo de defender e promover a vida de todos, especialmente dos mais pobres e abandonados. [Na foto: ação solidária, durante a pandemia em Curitiba, no Brasil]

Com o surto da pandemia de Covid 19, nossas prioridades tiveram rapidamente que mudar: não tinha como ser indiferentes à realidade devastadora do vírus, que deixou tantas famílias desamparadas e uma ferida profunda no rosto da humanidade. O impacto do vírus afetou sobretudo os mais frágeis, as pessoas em situações precárias de desemprego, desigualdade, violência, fome, exploração, miséria, depressão, doença e morte. Na verdade, estas estão se revelando cada vez mais como as “pandemias” permanentes que afetam a humanidade.

As perguntas que mais nos provocaram

O que fazer para sermos uma igreja que anuncia e vive a fraternidade e a solidariedade? Essa pandemia nos fez questionar tudo o que achávamos fosse “normal” e nos obrigou a reorganizar a cotidianidade de nossas atividades sociais e eclesiais. Entre as situações-limite, tem aumentado o número de nossos irmãos moradores de rua. Em Porto Velho (RO), por exemplo, a paróquia disponibiliza o espaço do pátio da Igreja para acolhida, descanso, um banho, água fresca e potável, um café…

Um missionário, um destes dias, perguntou a um irmão morador de rua porque costumasse dormir no pátio da igreja, durante o dia. Ele respondeu-lhe que na rua onde mora, a noite toda há muita bagunça: som alto, gritarias, às vezes tiroteios, etc. O pátio da igreja se tornou para ele um “ponto de apoio” onde se sentia acolhido, conseguindo descansar depois de uma noite violenta.

Mãos à obra!

Em Santa Rita (PB), o Projeto Legal precisou se reorganizar. Atendia presencialmente 160 crianças e adolescentes, mas em tempos de pandemia foi necessário reinventar-se. Nasceu o programa “Longe dos olhos, perto do coração”. Através das redes sociais, são acompanhadas as 107 famílias das crianças e adolescentes do projeto. Através do canal YouTube e de cartilhas mensais impressas, fornecem-se atividades pedagógicas, lúdicas e de formação humana. A equipe técnica oferece atendimento sócio psicológico, que duas vezes por semana pode ser presencial. A cada 30 dias, são distribuídos uma cesta básica e um kit de higiene às famílias.

Além disso, os Missionários Combonianos em Santa Rita continuaram garantindo visitas constantes aos encarcerados, em particular aos adolescentes privados de liberdade. A paróquia tem sido solidária e fraterna para com as famílias carentes das comunidades, apoiando também aquelas da cooperativa de materiais recicláveis.

Em Roraima, o primeiro gesto de solidariedade foi uma campanha urgente de doações de cestas básicas às famílias mais necessitadas da paróquia; houve também gestos solidários como a doação de móveis e utensílios domésticos às famílias dos migrantes venezuelanos. Em outros contextos, a disponibilidade de voluntárias e voluntários permitiu ações solidárias, como a distribuição de máscaras costuradas nas paróquias para milhares de pessoas mais vulneráveis, sem distinção de orientação religiosa. 

Está tendo também um trabalho intenso entre os ribeirinhos do baixo Rio Madeira, nos distritos de Calama e São Carlos em Porto Velho. Existem ainda muitas famílias necessitadas, mas foram arrecadados vários alimentos e materiais de limpeza, distribuídos em cestas básicas para as famílias mais carentes.

Da solidariedade ao apoio espiritual

As ações de caridade emergencial são só um primeiro passo de uma mudança de atitudes bem mais profunda, uma conversão necessária e urgente de nossas relações entre homens e mulheres, bem como com a criação, a Mãe Terra. A partir de nossas comunidades religiosas: intensificaram-se as relações interpessoais em nossas casas; se antes a correria das atividades pastorais não nos deixava tempo para cuidar das relações dentro de casa, agora a realidade nos força a partilhar a vida, os sentimentos, as reflexões, angustias e preocupações, tanto na oração como no diálogo cotidiano. Os momentos de oração são ocasião para partilha profunda. É como beber das riquezas de pensamento e de experiência do outro.

A pandemia do Covid 19 modificou também a evangelização e seus meios. As redes sociais, que alguns de nós consideravam tão distantes da realidade, foram o único instrumento para nos mantermos atentos à realidade. Utilizá-las com sabedoria e habilidade é responder ao legado do Concílio Vaticano II, que nos convidava a aproveitar dos modernos meios de comunicação.

Mais recentemente, as regras do distanciamento social estão gradualmente abrindo a possibilidade de retorno às celebrações litúrgicas presenciais. Isso não exclui a possibilidade de contar ainda, e muito, com a comunicação online como instrumento para alcançar bem mais gente, na diversidade de atividades de oração e formação que a Igreja propõe. A rede web pode ser um espaço precioso de promoção da vida e da dignidade; uma palavra missionária pode oferecer encorajamento, orientações para novas formas de organização e solidariedade, proximidade aos excluídos.

Também pelo telefone continuou se mantendo viva a “pastoral da escuta”, com particular atenção para os idosos e os doentes das nossas paróquias. O isolamento nas casas ressaltou ainda mais o valor da Igreja doméstica e da espiritualidade familiar. Tentamos revigorar isso promovendo a Celebração da Palavra nas famílias. Com a terapia de Bio-Magnetismo, alguns missionários aproximaram-se ao povo sofrido através do ministério da cura e dos cuidados para com a saúde: mais uma forma de Igreja em saída e missionária!

Reinventar-se para uma nova missão de justiça e direitos

As condições da pandemia obrigaram-nos a reformular a ação e atuação pastoral missionária: “reinventar-se para uma nova missão”, desenhando um novo rosto da Igreja local, sempre próxima a seu povo. Junto à solidariedade e ao acompanhamento espiritual, houve passos importantes na garantia dos direitos básicos da população. Em Piquiá (MA) foi fundado o Observatório Popular do Covid, um serviço organizado para alertar a população sobre a prevenção, desmontar as fake news que confundem, denunciar as escolhas e decisões políticas que sacrificaram o povo neste tempo já muito precário, reivindicar direitos.

Houve cobrança frente às Secretarias Municipais para o atendimento urgente das famílias venezuelanas migrantes, em situação de invisibilidade e vulnerabilidade social; foi oferecida assessoria jurídica para facilitar acesso ou recuperação do recurso do Auxílio Emergencial.

Em São Luís, a Paróquia São Daniel Comboni escolheu oferecer um curso pré-vestibular de educação popular em preparação para o ENEM (Exame Nacional do Ensino Médio), como forma de oferecer apoio educacional a estudantes de baixa renda afetados pela crise do Covid-19. Além de investir em novas lideranças, o curso oferece uma educação voltada para a emancipação humana, respeitando os saberes da classe popular e os princípios básicos da ética, da solidariedade, da transformação social e da cultura de paz.

Sem dúvida, essa pandemia nos transformou. Descobrimos mais fragilidades, fomos provocados a inventar novas estratégias de proximidade e serviço; buscamos a Palavra de Deus com ainda mais sede de respostas e sentido, mesmo se muitas vezes continuamos sem palavras. Renovamos humildemente nossa confiança em Deus, repartindo do cotidiano das relações, da acolhida, da compaixão.

Deus abençoe e ilumine os caminhos de nossas comunidades cristãs e proteja e inspire o povo do Brasil!

[Cosmas e Dario, Missionários Combonianos - Brasil]